Carnaval de rua paulistano está se tornando festa turística, avalia professor

Blocos de rua de São Paulo deixaram de ser parte alternativa da festa

Publicado em 26/02/2017 - 16:37 Por Daniel Mello – Repórter da Agência Brasil - São Paulo

São Paulo - Bloco Minhoqueens, no Largo do Arouche, região central (Rovena Rosa/Agência Brasil)

Bloco Minhoqueens, no Largo do Arouche, região centralRovena Rosa/Agência Brasil

O carnaval de rua de São Paulo deixou de ser parte alternativa da festa para ganhar o foco da folia nos últimos anos. Para o professor de etnomusicologia da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), Alberto Ikeda, os blocos estão fazendo com que a capital paulista se torne um destino turístico para a data.

“Muitos jovens de cidades próximas de São Paulo vêm para cá. Eles [blocos] se tornam turísticos nesse sentido. O cara não tem grana para ir a Salvador: hotel custa caríssimo, os preços sobem demais. Vem aqui para São Paulo, saí em dois ou três blocos e vai embora na mesma noite”, diz o especialista.

Apesar do crescimento dos grupos que levam bandas e trios elétricos para as ruas e as avenidas paulistanas, Ikeda acredita que o movimento ainda não atingiu o ápice na cidade. “Ainda tem muita coisa, não só do ponto de vista de organização, de aprendizado da administração pública e dos blocos também”, ressalta. Neste ano, 495 blocos desfilam na cidade, contra 385 em 2016 e 300 em 2015.

Crescimento

Em 2001, havia apenas 15 blocos de rua em São Paulo, segundo levantamento feito pelo próprio professor. Naquele momento, diz, a festa descentralizada começava a se expandir: “Havia poucas alternativas de carnaval. Pessoas de classe média que não queriam aderir aos desfiles das escolas de samba. Os bailes de salão já estavam sendo desativados.”

Entre os grupos que o pesquisador considera representativos desse momento, Ikeda cita os Maracaduros, nome que misturava o ritmo musical do bloco com a situação financeira dos integrantes. “Chamava Maracaduros porque eles tocavam ritmo de maracatu. Gente de classe média, artista, que não tinha grana para viajar para o litoral ou para a Bahia, para brincar o carnaval de rua. Ou seja, 'quem tá duro fica por aqui'”, recorda.

De acordo com o professor, a organização empresarial do carnaval de rua de Salvador, por meio da venda de abadás a preços altos, abriu espaço para que a folia voltasse às ruas. “O cara não precisa ter grana: rasga um short, põe uma camiseta. Pega qualquer suplemento, inventa um óculos diferente. Compra a sua própria cerveja e vai atrás do bloco. O sujeito se torna mais agente do brincar e da diversão carnavalesca”, destaca Ikeda.

Pressão e organização

Um dos fundadores do Bloco Bastardo, que atrai em média 10 mil foliões, Pedro Gonçalves participa da festa de rua desde 2001. De 2008 a 2013, fez parte da gestão de outro bloco conhecido na cena paulistana, o Vai Quem Quer. “Na época em que a gente começou a fazer o Vai Quem Quer, não havia quase nada de carnaval de rua em São Paulo”, lembra.

Para Gonçalves, a persistência fez com que a festa crescesse. “As pessoas começaram a ver que tinha gente interessada nisso, outros blocos começaram a surgir”, diz. Avaliação parecida com a de Eduardo Piagge, fundador da Confraria do Pasmado, criado em 2006. “O carnaval cresceu por uma pressão de muitos blocos, uns 30 que já existiam, que criaram condições para a prefeitura agir e começar a dar estrutura para o carnaval”, destaca.

Com o fortalecimento da organização, a prefeitura teve, segundo Piagge, de mudar a posição. “Não tinha banheiro químico nenhum. Era bizarro. As pessoas faziam as necessidades no meio da rua, lixo para caramba. Não tinha uma equipe da CET [Companhia de Engenharia de Tráfego] avisando que ia ter um bloco de carnaval, tinha ônibus passando [no meio do bloco]. A gente passou uns oito anos dessa maneira”, conta.

Edição: Wellton Máximo

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