Observatório da Imprensa lembra os 80 anos da Intentona Comunista no Brasil

Publicado em 03/12/2015 - 21:20 Por Akemi Nitahara - Repórter da Agência Brasil - Rio de Janeiro


A rebelião militar que ficou conhecida no país como Intentona Comunista, em 1935, liderada pelo ex-capitão do Exército e engenheiro militar Luís Carlos Prestes, na verdade foi uma ação mais tenentista (político-militar) do que comunista. O ponto de vista é compartilhado pelos convidados de hoje (3) do programa Observatório da Imprensa, da TV Brasil, apresentado pelo jornalista Alberto Dines, que vai ao ar às 23h.

Segundo Dines, a chamada Revolta Vermelha foi um dos movimentos que levaram o país ao autoritarismo. “O desastrado levante ocorrido há 80 anos, a pretexto de acabar com os latifúndios e promover a distribuição de terras, desviou-se das suas motivações sociais e ficou restrito ao ambiente castrense [nos quartéis],  gerando um paradigma de confronto armado e golpe militar só encerrado em 1985. Suas herdeiras diretas, as ditaduras do Estado Novo em 1937 e a de 1964, somadas, perfazem 29 anos, acostumando algumas gerações de brasileiros a resignar-se aos desmandos dos regimes autoritários e a desacostumar-se do estado democrático de direito”, afirmou o jornalista.

Segundo a historiadora Marli Vianna, professora da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), não houve, de fato, nem um levante e muito menos com motivação comunista, nos eventos que ocorreram em Natal, entre 23 e 25 de novembro de 1935, no Recife, no dia 24 de novembro, e no Rio de Janeiro em 27 de novembro.

“Minha tese é que foi o último movimento tenentista do país. Porque levanta os quartéis e depois o resto da população vai aderir. Mas o Prestes dá essa ordem e a população não se mexe. Esse movimento vai ter resposta na escola militar, mas o Partido [Comunista] estava contra; mas o Prestes diz “nós temos a marinha na nossa mão, nós vamos levantar”, diz Marli.

A historiadora Dulce Pandolfi, do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC), da Fundação Getulio Vargas (FGV), lembra que, no contexto político da época, era comum “pegar em armas”, e cita a chegada de Vargas ao poder e a Revolução Constitucionalista de 1932, em São Paulo. Para ela, o golpe do Estado Novo foi construído ao longo da década, não apenas a partir da Intentona Comunista.

“Ele [Getúlio Vargas] vai conseguindo apoio e propondo a revisão da Constituição, e vai tentando minar a Constituição [de 1934]. Com o levante de 35, ele consegue apoio para várias medidas de cerceamento do estado de direito, inclusive estado de sítio e estado de guerra, mas não consegue apoio do parlamento para a reeleição, proibida pela Constituição. O golpe de 37 vem porque ele pretende continuar com o seu projeto de formação do estado nacional, mas não consegue o apoio do parlamento. Então, ele precisou fechar o parlamento para continuar presidente. Mas o levante foi um argumento muito bem feito, muito bem utilizado por quem estava no poder, e gerou um anticomunismo no país”, afirma Dulce Pandolfi.

Professor de história da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ricardo Castro, relaciona a perseguição aos partidos de esquerda na época e a construção do sentimento anticomunista no Brasil ao mito da conspiração judaica, uma teoria da conspiração antissemita que prega a ideia de que os judeus têm a intenção de dominar o mundo.

“O mito da conspiração judaica chega ao Brasil nos anos 20, por meio do livro Protocolo do Sábio Sião. Em meados da década de 30, recebe uma nova tradução do Gustavo Barroso, um dos intelectuais e dirigentes da Ação Integralista. Nos anos 20, esse mito da conspiração judaica passa a ser trabalhada por ideólogos conservadores, relacionando-o com a conspiração comunista. Tanto é assim que o texto usado para justificar [o golpe de 1937] é o Plano Cohen [forjado pelos integralistas para simular uma tentativa de golpe por parte dos comunistas], que é um sobrenome judaico muito corrente no Brasil nesse período”.

Marli Vianna explica que a ideia difundida de que a Internacional Socialista soviética financiou o levante no Brasil também é facilmente desmontada. “Houve uma reunião em Moscou, em 1934, eu tenho essas atas. Moscou diz o seguinte: “Não se metam em nenhuma precipitação, vocês são muito fracos, vocês não têm nada no campo”. Eles lavaram um pouco as mãos. A América Latina não tinha importância para eles, o importante eram os Estados Unidos: 'Faz a revolução nos Estados Unidos e o resto da América Latina vai'. Eu chamei de expectativa conivente, 'fazem a revolução aí e vamos ver no que vai dar'. Vieram [da União Soviética, para ajudar a revolução no Brasil] quatro casais, ninguém faz revolução com quatro casais”.

Dulce pondera que a Internacional Socialista pretendia fazer uma revolução popular no mundo inteiro e que todos os partidos comunistas estavam ligados a ela na época. Porém, destaca que, no Brasil, a tentativa de levante não ocorreu a mando de Moscou, que tinha consciência de que o país ainda não tinha passado pelas etapas necessárias para o processo de transição para o socialismo.

Edição: Jorge Wamburg

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