No Rio, bloco vai protestar contra tratamento de pacientes em manicômios

Publicado em 26/01/2016 - 19:30 Por Alana Gandra - Repórter da Agência Brasil - Rio de Janeiro

Bloco Tá Pirando, Pirado, Pirou

Camiseta do Bloco Tá Pirando, Pirado, PirouDivulgação/Bloco Tá Pirando

Criado há 12 anos, o bloco de rua Tá Pirando, Pirado, Pirou!  vai aproveitar o carnaval deste ano para defender o tratamento de pessoas com transtornos mentais fora dos manicômios e em comunidade. O bloco é formado por pacientes e profissionais da rede de saúde mental. Os integrantes também irão protestar contra a nomeação do psiquiatra Valencius Wurch Duarte Filho para a Coordenação Nacional de Saúde Mental do Ministério da Saúde.

A camiseta do bloco trará estampada a frase “Nem um passo daremos atrás: manicômio nunca mais” e  foi criada pelo ilustrador Samy das Chagas, paciente do hospital psiquiátrico Instituto Philippe Pinel há pelo menos 15 anos e o principal artista da oficina de reciclagem de papel do centro. 

A ideia, segundo os organizadores, é mostrar a capacidade criativa dos pacientes. “São capazes de produzir sambas lindos e arte. Mostrar para a sociedade que existem outras formas de se tratar a loucura e mais do que isso, que essas pessoas não podem ter a sua existência resumida a um diagnóstico ou a um certo olhar que, muitas vezes, diz que loucura é sinônimo de incapacidade de conviver em sociedade, de trabalhar, e é sempre associada a uma ideia de periculosidade”, disse o psicanalista e coordenador do bloco, Alexandre Ribeiro Wanderley.

O enredo vencedor deste ano é “Faxina nas ideias. Mais arte, mais solidariedade. O samba é um santo remédio”, de autoria de Hamilton de Jesus. Vencedor também do enredo do ano passado, Hamilton é paciente do Centro Psiquiátrico do Rio de Janeiro e participa de um grupo de rock chamado Harmonia Enlouquece, em referência à Praça da Harmonia, na zona portuária, onde a unidade está situada.

Os integrantes do bloco defendem a reforma psiquiátrica, aprovada em 2001, que deu início a adoção do tratamento em residências terapêuticas com serviços abertos e comunitários.

Segundo o coordenador do bloco, atualmente, são mais de 2 mil centros de atenção psicossocial no Brasil. No centro de atenção, o paciente é acompanhado por uma equipe multidisciplinar.

Protesto carnavalesco

Durante o desfile no próximo dia 31 na Avenida Pasteur, na Urca, zona sul do Rio de Janeiro, o bloco irá protestar contra a nomeação do psiquiatra Valencius Wurch Duarte Filho para a Coordenação Nacional de Saúde Mental do Ministério da Saúde. 
Valencius Wurch foi diretor-técnico da Casa de Saúde Dr. Eiras, então maior manicômio privado do país, localizado em Paracambi, na Baixada Fluminense, e que foi fechado em 2012 após denúncias de violações de direitos.

De acordo com Wanderley, entidades ligados ao movimento antimanicomial “lamentam” não terem sido consultadas sobre a nomeação do psiquiatra e o protesto é contra “o que ele representa”, por ter dirigido por mais de dez anos um manicômio.
“Existe uma mobilização no Brasil inteiro”, disse.

No desfile, o poeta Chacal cantará samba de sua autoria, feito para o bloco Suvaco do Cristo, em homenagem ao Bispo do Rosário, antigo paciente da médica Nise da Silveira, Contrária à aplicação de eletrochoques em pacientes com caráter punitivo.

No final do evento, o bloco Céu da Terra, em apoio à causa da reforma psiquiátrica, tocará músicas tradicionais de Moçambique, chamadas marrabentas. Os integrantes do bloco Tá Pirando, Pirado, Pirou! soltarão balões para representar a morte de pacientes psiquiátricos em manicômio de Paracambi. “Vai ser um protesto carnavalesco”, disse Wanderley.

Em nota, o Ministério da Saúde disse que a escolha do psiquiatra Valencius Wurch para a Coordenação Nacional de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas reforça a Política Nacional de Saúde Mental visando “modelo de atenção à saúde aberto e de base comunitária, promovendo a liberdade e os direitos das pessoas com transtornos mentais”.

De acordo com o ministério, Wurch participou das discussões que resultaram na reforma psiquiátrica. “O Ministério da Saúde considera a reforma psiquiátrica uma conquista do setor e não admite retrocessos na política em desenvolvimento”.

“O governo federal tem impulsionado a construção de um modelo humanizado, mudando o foco da hospitalização/segregação e promovendo tratamento às pessoas com transtornos mentais e decorrentes do uso de álcool e drogas com base em um modelo de cuidados voltado para a reinserção social, a reabilitação e a promoção de direitos humanos”.

A nota informa que Valencius Wurch foi diretor da Santa Casa de Saúde Dr. Eiras, em Paracambi, entre 1993 e 1998, “onde trabalhou em prol da humanização do atendimento na unidade”. O coordenador atua há 33 anos na saúde pública e ingressou no ministério depois da extinção do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps).

Edição: Graça Adjuto e Carolina Pimentel

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