Ações do governo e setor privado comemoram Dia Nacional dos Surdos

Publicado em 26/09/2019 - 19:30 Por Alana Gandra - Repórter da Agência Brasil - Rio de Janeiro

O Dia Nacional do Deficiente Auditivo, comemorado hoje (26), foi lembrado pelo setor privado e pelo governo. O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), por meio da Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SNDPD), promoveu o Fórum de Políticas Públicas para Pessoas Surdas e com Deficiência Auditiva em Brasília

De acordo com a secretaria, o objetivo do fórum é ouvir a sociedade, entidades, os surdos e suas famílias sobre as necessidades e problemas enfrentados, contribuindo com ideias para formular políticas públicas para inclusão ou para promover ajustes nas políticas já existentes.

Amanhã (27), a SNDPD promove o 1º Seminário de Acessibilidade e Tecnologia Assistiva para Pessoas Surdas e com Deficiência Auditiva. De acordo com o ministério, o evento integra a campanha Setembro Azul, que visa a conscientizar a sociedade sobre os direitos das pessoas surdas e com deficiência auditiva.

Na iniciativa privada, o Dia D foi comemorado pela empresa brasileira de tecnologia de transporte 99, que conecta passageiros e motoristas e conta com 20% de motoristas surdos parceiros no Rio de Janeiro. A capital fluminense detém o segundo maior percentual de deficientes auditivos atuando na área da mobilidade nessa plataforma, depois de Belo Horizonte, com 23%.

O gerente regional da 99 para o Rio de Janeiro e as regiões Norte e Nordeste, Pedro Gomes, disse à Agência Brasil que a empresa tem como valores a diversidade e a inclusão, que começam internamente para poderem chegar ao mercado externo. “A gente sabe que o aplicativo é um facilitador de geração de renda para qualquer pessoa”. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2017 apontavam que 9,7 milhões de brasileiros possuem deficiência auditiva, o que representa 5,1% da população do país.

Identificação personalizada

Gomes identificou que alguns passageiros faziam uma avaliação negativa da corrida, alegando que alguns motoristas tinham dificuldade de comunicação ou de ouvir, no caso dos surdos. Por isso, a 99 começou a pensar em uma solução e acabou criando a identificação personalizada. Adesivos com as frases “Motorista Deficiente Auditivo. Sinalize para conversar comigo” e “Converse comigo por mensagem” foram colocados nos veículos interna e externamente, onde os passageiros pudessem vê-los, de modo a facilitar a comunicação com os condutores.

A 99 tem ainda um centro de atendimento, conhecido como Casa 99, onde os condutores surdos são atendidos por pessoas que se comunicam em Libras. Por uma questão estratégica da marca, Pedro Gomes disse que dados referentes ao quantitativo de motoristas parceiros com deficiência auditiva não são revelados. O foco da empresa de transporte é gerar renda e oportunidade de trabalho para essas pessoas, sustentou.

Questionado se a 99 pretendia expandir a parceria e incluir motoristas cadeirantes, Pedro Gomes respondeu que “a inclusão é um dos valores importantes para a gente aqui dentro. Toda oportunidade que temos de dar mais acesso a pessoas com dificuldade é aproveitada. Estamos sempre olhando para novas oportunidades e pensando em como melhorar o serviço e dar mais acesso”. Se um deficiente físico, por exemplo, tiver o carro adaptado e a carteira de habilitação correspondente, ele pode se cadastrar na plataforma e ser motorista parceiro.

Experiência

Isnoel Correia é deficiente auditivo e começou a trabalhar como motorista parceiro da 99 em janeiro de 2017. Ele contou à Agência Brasil, pelo aplicativo de mensagens instantâneas whatsapp, que no início a adaptação foi difícil, mas, quatro dias depois, já estava familiarizado com a plataforma.

Indagado sobre sua relação com os passageiros, Isnoel respondeu que “precisava ter paciência, postura, oferecia bala, era prudente e procurava manter o carro limpo para receber passageiro que ficava feliz. Como eu não ouço, sempre avisava o passageiro que sou deficiente auditivo. Alguns passageiros se comportavam bem e outros ficavam assustados porque eu sou deficiente”.

Isnoel considerou positiva a iniciativa da 99 de colocar adesivos personalizados, porque eles facilitam para o passageiro ver quem é o seu condutor.

Aumento de parceiros

Também a Uber registrou aumento de 221% na procura pelo aplicativo por condutores com deficiência auditiva entre 2018 e 2019. As cidades com maior crescimento no número de parceiros cadastrados que informam ter deficiência auditiva são Belo Horizonte, Belém, São Paulo, Fortaleza, Rio de Janeiro e Porto Alegre.

De acordo com informação do gerente de Operações da Uber para São Paulo, José Luis Lobato, o aumento da demanda de motoristas que procuram dirigir com a Uber com objetivo de geração de renda resulta do acesso descomplicado que a tecnologia da plataforma oferece. Para o aplicativo, essa alta demanda contribui para a inclusão de mais pessoas com deficiência auditiva no mercado.

Segundo Lobato, essa tendência pode ser comprovada pelo crescimento de 36% registrado em São Paulo, nos últimos cinco anos, da emissão de Carteiras Nacionais de Habilitação (CNHs) para condutores com surdez ou deficiência auditiva no Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo (Detran SP). De 2013 até agosto de 2019, foram emitidas mais de 71 mil carteiras para motoristas surdos ou que usam prótese auditiva. A maior parte desse total, equivalente a 88%, se refere a motoristas que usam prótese, informou a Uber.

Para se comunicar com o condutor parceiro surdo, a plataforma utiliza uma notificação luminosa que pisca para avisar que ele tem nova solicitação. Do mesmo modo, avisa ao usuário que o motorista é deficiente auditivo, oferece a opção de conversa por mensagem e pede que o destino seja inserido antes que a viagem se inicie. “É uma forma de dar a essas pessoas um acesso que elas não imaginavam anteriormente", afirmou José Luis Lobato.

Libras

A linguagem brasileira de sinais (Libras) é utilizada pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) para a formação de profissionais. O serviço, porém, encontrava dificuldades. "No momento de fazer a tradução para Libras, a gente queria ganhar mais tempo e maior agilidade nessa formação e melhorar a comunicação entre o docente, ou seja, o instrutor, e o aluno”, disse o gerente de Educação e Tecnologia do Senai Nacional, Felipe Morgado.

Para solucionar o problema, foi criado um glossário de Libras para os termos técnicos da educação profissional. Esse glossário foi incluído em um aplicativo onde as pessoas com e sem deficiência têm acesso, para poder melhorar a comunicação, sem que fosse preciso soletrar as palavras em Libras. O mesmo se aplica a alertas de segurança. “Nós elencamos 600 termos da educação profissional que estão sendo embarcados nesse aplicativo”, informou Morgado.

Hoje, já estão disponíveis mais de 100 termos, que ajudam a melhorar a comunicação das pessoas na educação profissional. Até o final do ano, a meta é inserir todos os demais termos nos principais sistemas operacionais de smartphones. Felipe Morgado adiantou que a proposta é fazer com que esse glossário em Libras sirva para todas as instituições de ensino profissional para  ajudar pessoas com deficiência auditiva.

Capacidade

A inclusão de pessoas com deficiência é uma das vertentes do Programa Senai de Ações Inclusivas. “Nós buscamos a inclusão elaborando currículos adaptados e adequados, capacitando docentes, elaborando recursos didáticos em tecnologias inclusivas para ajudar esses jovens a serem incluídos no mercado de trabalho”, disse o gerente de Educação e Tecnologia do Senai Nacional.

Muitas empresas industriais estão contratando esses jovens que são formados no Senai. Em visita à montadora GM (General Motors) este ano, Morgado verificou que na linha de produção do Chevrolet Ônix, os funcionários surdos é que faziam a configuração do tipo de veículo, se era movido a álcool, gasolina ou ‘flex’, porque tinham “melhor habilidade e maior concentração para evitar erros”. 

O gerente destacou que a preocupação do Senai é fazer uma formação completa, identificando as deficiências e adaptando os cursos e currículos, para que essas pessoas consigam de fato trabalhar na indústria, na profissão que escolheram. “O resultado está sendo muito positivo”.

Legislação

A Lei 8.213/1991, que estabeleceu a política de cotas para inclusão de pessoas com deficiência e reabilitados no mercado de trabalho, completou este ano 28 anos. De acordo com a lei, toda empresa com 100 ou mais empregados deve destinar de 2% a 5% dos postos de trabalho a pessoas com deficiência. Já as empresas que têm entre 100 e 200 empregados devem reservar 2% de suas vagas; entre 201 e 500 empregados, 3%; entre 501 e 1000 empregados, 4%; e empresas com mais de 1001 empregados, 5% das vagas.

Dados da Secretaria de Trabalho do Ministério da Economia mostram que o Brasil possui, atualmente, cerca de 35 mil empregadores, que são obrigados a cumprir a Lei 8.213. Isso equivale a 750 mil postos de trabalho, dos quais 48% das vagas estão preenchidas, totalizando em torno de 360 mil pessoas com deficiência e reabilitados beneficiados, contra 28%, em 2009.

Segundo a secretaria, a inclusão de pessoas com deficiência vem crescendo no mercado de trabalho. “Enquanto o número de vínculos formais cresceu 12,3% no período de 2009 a 2017, o número de vínculos preenchidos por pessoas com deficiência no mesmo período aumentou 52,9%”. Hoje, o Brasil tem 93% das pessoas com deficiência trabalhando com carteira assinada, que foram contratadas por empresas obrigadas a cumprir a cota estipulada pela legislação.

Fiscalização

A Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia fiscaliza o cumprimento da Lei de Cotas. São realizadas a cada ano em torno de 10 mil fiscalizações, em média, nas quais os auditores-fiscais do trabalho orientam as empresas quanto ao cumprimento da lei e cobram pela sua efetivação. Os auditores-fiscais estabelecem prazo para a regularização da situação. “Dependendo da irregularidade constatada, a empresa pode firmar um termo de compromisso com prazo para cumprimento da cota ou adaptação do ambiente de trabalho. Após esgotadas as tentativas de regularização, a empresa é autuada”. 

Edição: Bruna Saniele

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