Para pesquisadores Brasil continua superexposto à biopirataria

11/02/2004 - 18h27

Brasília, 11/2/2004 (Agência Brasil - ABr) - Dados comparativos do valor da biodiversidade no mercado assustam e explicam por que as pessoas dedicadas a atividade ilícita da biopirataria têm tanto empenho em realizar sua função: um grama de veneno de surucucu, por exemplo, custa US$ 20 mil, enquanto um litro de petróleo vale US$ 1,00. Com preços tão altos pagos por valores extraídos da natureza, torna-se um problema para os países megadiversos (o caso brasileiro) impedir, ou, ao menos, controlar os processos de biopirataria. A situação nacional foi apresentada hoje na mesa-redonda A Biopirataria no Brasil, na Universidade de Brasília (UnB), no XXV Congresso Brasileiro de Zoologia.

Segundo o pesquisador da Fundação Ezequiel Dias (MG), Marcelo Diniz, o Brasil é um grande alvo por deter a maior biodiversidade do mundo. Além dos já consagrados biomas da Amazônia e da Mata Atlântica, o país ainda tem o Cerrado, o Pantanal e a Caatinga. Ele aponta que as patentes cerceiam o uso das descobertas e das pesquisas científicas e que as pressões de indústrias farmacêuticas, por exemplo, dificultam ainda mais a ação dos pesquisadores. "Uma das facetas mais cruéis desse processo é o aproveitamento de conhecimento das comunidades nativas sem benefício para elas", argumenta.

O professor do Departamento de Fitopatologia da UnB, José Carmine Dianese, explica que, como signatário do Tratado Internacional da Biodiversidade, o Brasil precisa assegurar o acesso à biodiversidade, mas alerta que esse controle só pode ser exercido com base no conhecimento científico. Especialista em fungos, Dianese lamenta a facilidade que os biopiratas têm em roubar microorganismos: "Eles são suscetíveis à biopirataria por serem portáteis, de fácil transporte".

Para exemplificar essa facilidade, Dianese conta o caso da Ciclosporina, medicamento utilizado depois dos transplantes de órgãos para evitar rejeição. Um cientista de um laboratório internacional, em férias na Finlândia, coletou um fungo e o levou de volta ao trabalho para cultivo. Resultado: um rendimento de mais de US$ 1 bilhão por ano ao laboratório.

Casos assim são comuns na ciência, conta o pesquisador da UnB. Ele mesmo foi sondado mais de uma vez por laboratórios que queriam "colaborar" com seus estudos. "Eles queriam ter acesso aos nossos fungos, dispuseram-se até a pagar royalties por futuros produtos, mas não aceitaram minha exigência de instalarem o laboratório aqui na universidade. Sem transferência de tecnologia, não veríamos benefício algum desse intercâmbio", alerta.

Representante da Ministra Marina Silva, do Ministério do Meio Ambiente (MMA), João Paulo Ribeiro Capobianco, afirma que a biodiversidade nacional é um tesouro que o país não consegue quantificar e, por isso, também não se sabe especificamente o que é extraído ilegalmente do país. Capobianco acrescenta uma história de biopirataria ao enredo da discussão.

O químico britânico Conrad Gorinski conviveu com índios Wapixanis, em Roraima, por 17 anos. Aprendeu os princípios ativos de plantas e voltou à Europa. Patenteou esses princípios e os índios que o ensinaram nada viram da produção desses medicamentos.

"O que ocorre no Brasil é absolutamente lamentável. Corremos o risco de perder o direito ao uso da nossa biodiversidade", diz. Ele afirma que o MMA tem trabalhado em políticas e ações para reduzir a ação dos biopiratas e é respaldado pelo ex-ministro do Meio Ambiente, deputado e presidente do Partido Verde, José Sarney Filho.

O parlamentar falou sobre a Comissão Parlamentar de Inquérito sobre Tráfico de Animais e Biopirataria e defendeu o aumento de recursos para pesquisas: "As instituições públicas, principalmente, precisam desse incentivo para garantir a produção de conhecimento qualificado. Além disso, devemos formar e fixar pesquisadores na Amazônia". (UnB Agência)

Casos recentes de biopirataria

Quebra-pedra - Hepatite B - Fox-Chase Câncer Center - EUA
Guaraná - Anticoagulante - Cinncinati University - EUA
Espinheira Santa - Antiinflamatório - Mektron Lab - Japão
Muirapuama - Afrodisíaco - Taisho Pharmac Company - Japão