Gabrielli destaca ''folga'' para administrar oscilações no preço do petróleo

21/04/2006 - 10h21

Nielmar de Oliveira e Thaís Leitão
Repórteres da Agência Brasil

Rio - O presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, garantiu, em entrevista exclusiva à Agência Brasil, que a auto-suficiência na produção de petróleo dará à estatal brasileira maior folga para administrar as oscilações dos preços do barril do petróleo no mercado internacional.

Para ele, no entanto, por conviver com um mercado em que os preços dos derivados do produto são livres, a empresa não terá como manter estes preços indefinidamente deslocados dos praticados no mercado internacional.

Gabrielli falou também dos planos da empresa para o futuro. Entre eles, a exportação do excedente de petróleo produzido no país e o aumento da capacidade de refino do óleo extraído no Brasil. A seguir, a íntegra da entrevista:

Agência Brasil – Qual a importância estratégica e econômica para o país, da conquista da auto-suficiência na produção de petróleo?

José Sérgio Gabrielli – O petróleo é um produto fundamental para um conjunto de atividades do mundo moderno. Com ele se faz desde o batom ao combustível. Evidentemente que a parte mais visível deste processo é a produção dos derivados para utilização dos automóveis - ônibus e caminhões. Mas, além disto: o petróleo é uma matéria prima fundamental para a produção de fertilizantes, de produtos petroquímicos e até de cosméticos. Portanto, é um produto que afeta diretamente um conjunto de atividades fundamentais para os países. Todos os países dependem do petróleo, mas poucos países têm, no entanto, a situação de auto-suficiência que o Brasil está agora conseguindo. Isto significa produzir o petróleo necessário para atingir as necessidades do refino brasileiro.

O desafio hoje, no mundo, é enfrentar esta questão da segurança energética. Garantir a produção e o fornecimento para viabilizar a continuidade do crescimento econômico e do bem estar sem grandes choques.

O Brasil, portanto, ao atingir esta auto-suficiência, se torna um dos poucos países do mundo em que as flutuações no preço do barril do petróleo no mercado externo podem ser amortecidas no plano interno. Enfim, o grande orgulho é que nós teremos a garantia do fornecimento do produto. Um orgulho que poucos países do mundo tem. As flutuações e a intensa variação diária não pressionará os preços no país.

ABr - Qual é o próximo desafio a ser superado pela companhia?

Gabrielli – Evidentemente que a atividade de exploração e produção de petróleo está continuamente a exigir que você cresça e inove para manter a produção. Desde o poço do petróleo ao desenvolvimento da produção. É mais ou menos como os seres humanos: atingem uma idade de maturidade e rapidamente definham. Evidentemente, para viabilizar a continuidade do crescimento da produção, você tem que descobrir e fazer produzir em novas áreas. Manter o crescimento da produção e a auto-suficiência por algum tempo já é, evidentemente, um desafio para a Petrobras. Além disto, a companhia tem hoje uma expansão internacional crescente e a entrada em novos mercados vai ser um desafio bastante importante para a companhia.

ABr - A empresa possui uma política própria de reajuste de preços onde procura, a princípio, não repassar para o mercado interno as oscilações dos preços. De que forma esta auto-suficiência vai influir no bolso do consumidor quando ele for às bombas para abastecer o seu veículo? Muda a política de preços?

Gabrielli - Eu gostaria de discutir um pouco este conceito de política de preços. Qual é a política de preços do suco de laranja, do café ou dos produtos que são internacionalizados? Não há uma política de preços específica.

Há contratos entre fornecedores e produtores que se estabelecem ao longo do tempo e isto se ajusta a situações internacionais de oferta e demanda. No caso dos derivados do petróleo no Brasil é mais ou menos a mesma coisa: a partir de janeiro de 2002 os preços dos derivados no Brasil passaram a ser livres. Objetivamente a Petrobrás, como uma grande produtora no Brasil, não acha que é conveniente, e nós não fazemos isto deste 2003, repassar para os consumidores brasileiros toda a flutuação, toda a volatilidade, dos preços internacionais. Até porque o mercado brasileiro reflete situações que são distintas das situações internacionais. Esta auto-suficiência vai permitir uma administração mais tranqüila das flutuações no mercado externo nos preços domésticos. Poderemos adequar melhor ao mercado brasileiro estas altas do mercado internacional. Agora, é preciso que uma coisa fique clara: não poderemos, enquanto tivermos um mercado aberto no Brasil, manter os preços indefinidamente descolados dos preços internacionais.

ABr - Há especialistas do setor que se posicionam de forma crítica à decisão da empresa de exportar o excedente de sua produção. Alegam tratar-se de um produto escasso, finito. A Petrobras pode vendê-lo hoje a um preço e ter que comprá-lo amanhã por outro bem superior. Isto não pode ser ruim para a empresa?

Gabrielli - A produção de petróleo cresce por saltos. Na medida em que a P-50 esta entrando em operação, nós vamos ter também aumentada a produção, que quando no pico será de 180 mil barris (11% do volume atual); quando a P-34 entrar em operação serão mais 60 mil barris/dia. Golfinho agregará mais 100 mil; Piranema mais 20 mil. Estes saltos só acontecem porque você instala uma unidade de produção que funciona em sua capacidade plena. Então você produz mais e não há como, assim como em outras diferentes indústrias, você ajustar a produção ao consumo interno. Ao garantir, este ano, a auto-suficiência, nós teremos excedente de produção que não teremos como refinar no Brasil. Por isto estamos, inclusive, partindo para a construção de mais uma refinaria em Pernambuco e que vai processar 200 mil barris por dia de petróleo pesado; estamos construindo um complexo petroquímico no Rio de janeiro que vai processar mais 150 mil barris também de petróleo pesado. Mas estas instalações só começarão a operar em 2011. Até lá nós teremos excedentes exportáveis bastante grandes. Não há alternativa.

ABr - A empresa pretende a auto-suficiência também na área do refino?

Gabrielli - Na verdade, o problema na área de refino do país, particularmente na área de derivados utilizados pelos meios de transportes, decorre do fato de que nós produzimos muito petróleo pesado. Mas, por outro lado, o derivado cuja demanda é forte no Brasil é o Diesel – um produto leve. Isto faz com que - a não ser que nós aumentemos fortemente os investimentos na capacidade de conversão do petróleo pesado em derivados leve - nós não consigamos produzir diesel em quantidade suficiente para a demanda do mercado brasileiro. Ainda assim nós vamos aumentar o percentual do nosso petróleo processado em nossas refinarias: nós sairemos hoje de uma situação em que refinamos 80% do nosso petróleo internamente para chegar a 2010 processando 90%. Portanto, aumentaremos em 10% nossa capacidade de processar petróleo nacional. Ainda assim não seremos capazes de processar diesel suficiente para o Brasil, mas estaremos processando outros derivados além da nossa capacidade de consumo. Portanto, estaremos exportando este excedente e importando o diesel necessário ao atendimento á demanda interna. Por outro lado, como nós produziremos mais petróleo pesado, nós precisamos aumentar a nossa capacidade de refino em outros países para processar o petróleo pesado que exportamos. Daí porque a empresa também está investindo na capacidade de refino fora do país.

ABr – E no caso da auto-suficiência em gás? Será possível?

Gabrielli – Nós estamos investindo pesadamente na descoberta de novas áreas de gás natural e também na viabilização da entrega deste gás para o mercado brasileiro. Estamos alocando enormes recursos para os desenvolvimentos dos campos já descobertos. Agora, dificilmente, em um horizonte de médio prazo, nós chegaremos à auto-suficiência na produção de gás no Brasil. É uma demanda que cresce de forma bastante intensa no país e nós, até 2010, não temos nenhuma perspectiva de tentar a auto-suficiência na produção de gás, no Brasil.

ABr – Falar em gás nos remete invariavelmente ao problema da Bolívia. Parece que as negociações estão mais difíceis do que o previsto inicialmente. Há acordo a vista?

Gabrielli - Hoje nós temos um contrato de fornecimento de gás com a Bolívia que prevê a importação para o Brasil de 30 milhões de metros cúbicos diários. Este contrato vai até 2019. As negociações com a Bolívia retomaram, portanto, nós estamos em processo de negociação. Mas há também um acordo de confidencialidade entre nós e não podemos comentar os detalhes desta negociação pela imprensa.