Solução para o Timor "está longe", avalia professor Boaventura de Sousa Santos

20/05/2007 - 11h37

Julio Cruz Neto
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O presidente eleito doTimor Leste, José Ramos Horta, toma posse hoje (20), apósuma eleição pacífica que foi precedida por umaviolenta crise política. Passado o processo eleitoral, que foiaprovado por observadores internacionais e registrou apenasincidentes isolados, o clima de instabilidade vai voltar ao país,na opinião do sociólogo Boaventura de Sousa Santos.“A soluçãoestá longe”, disse numa breve entrevista à AgênciaBrasil, por telefone, enquanto caminhava para a Universidade deCoimbra – onde é professor da Faculdade de Economia. Eleavalia que os timorenses têm uma percepção erradasobre o significado da eleição. “Pensam queresolveram a crise, mas não é isso. A região vaicontinuar a ser desestabilizada”.Entre os fatores dedesestabilização, Boaventura destaca a Austráliae a Igreja Católica.País vizinho epotência regional, a Austrália provocou a crise“artificialmente”, segundo ele, com o objetivo de desestabilizarum governo hostil: o do ex-premiê Mari Alkatiri, que deixou ocargo em junho do ano passado, durante a crise, para dar lugar aopróprio Ramos Horta.Um dos fundadores daFrente Revolucionária do Timor Leste Independente (Fretilin),movimento de resistência contra a ocupaçãoindonésia – encerrada em 2002 –, Alkatiri ganhou ainimizade dos australianos por sinalizar uma aproximaçãocom a China, avalia o sociólogo, especialmente no que serefere à exploração dos principais recursosnaturais do país: petróleo e gás natural.Em artigo escritorecentemente, Boaventura dá os detalhes. O primeiro-ministrosubiu de 20% para 50% a parte que caberia ao Timor dos rendimentosdos recursos naturais, procurando transformar e comercializar o gásnatural a partir do país, e não da Austrália, econcedendo direitos de exploração a uma empresachinesa. Uma postura “nacionalista” semelhante à de paísescomo Bolívia e Venezuela, embora “menos radical”, comparoudurante a entrevista.Além da questãoeconômica, o professor de Coimbra aponta um aspecto geopolíticono interesse da Austrália: controlar as rotas marítimasde águas profundas e travar a emergência do rivalregional, a China. Dada a proximidade entre os governos de Washingtone Canberra, ele vê esta disputa como sinal de uma “novaguerra fria, apenas emergente, entre os EUA e China”, da qual “oTimor é a primeira vítima”. E acha que a Austráliaadota postura semelhante à dos Estados Unidos em relaçãoà América Latina e, mais recentemente, ao OrienteMédio.Quanto à Igreja,Boaventura explica que teve papel forte na independência, gozade grande influência na região e não vêmuita graça no fato de Alkatiri ser um líder muçulmano– embora “secular”. Ele conta que, no dia da eleição,Ramos Horta apareceu para votar vestindo uma camiseta do SagradoCoração de Jesus.