Movimento negro não conseguiu emplacar embargo à África do Sul na Constituinte

20/11/2008 - 17h58

Isabela Vieira
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - Vinte anos depois das articulações que deram origem à Constituição Federal, ex-parlamentares negros avaliam que a luta contra o racismo no Brasil perdeu pontos ao não conseguir impor, à época, um embargo econômico à África do Sul. O país africano vivia um regime de segregação racial, conhecido como apartheid.O ex-constituinte Carlos Alberto Caó (PDT-RJ) afirma que a luta contra o racismo no Brasil tinha como referência o regime de segregação da África do Sul, que por mais de 40 anos separou brancos e negros. Para ele, a sessão na qual foi votado o requerimento não avançou por causa de discursos econômicos.“O argumento era de que o rompimento de relações comerciais e diplomáticas prejudicaria a África e a própria África do Sul”, disse. “Foi um grande derrota porque, naquele momento, falar contra o racismo no Brasil era também falar contra o apartheid.”O jornalista Carlos Caó foi autor do inciso 42 do Artigo 5º, que tipifica o racismo como crime inafiançável e imprescritível. O item foi aprovado em separado e contou com mais votos que toda a Constituição. Até então, o racismo era uma contravenção, com constava da Lei Afonso Arinos, de 1951.Considerada um importante instrumento de  igualdade racial, a Lei Caó não foi elaborada no principal grupo de articulação dos negros na Constituinte, a Subcomissão de Negros, Indígenas, Pessoas com Deficiência e Minorias, da qual fez parte, a ex-deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ), autora do requerimento do embargo.“Perdemos por 11 votos o rompimento das relações do Brasil com a África do Sul”, lembra Benedita, que foi a única mulher negra na Constituinte. “Defendíamos o rompimento com a África do Sul por conta do apartheid e da prisão do Mandela [Nelson Mandela, ex-presidente da África do Sul], detido pelo seu próprio povo, sem liberdade para defender suas idéias.”Atualmente, à frente da secretaria estadual de Assistência Social no Rio, Benedita lembra que ao final da década de 80 houve intensa movimentação para trazer Nelson Mandela ao Brasil, o que aconteceu em 1991, um ano após ele ser libertado da prisão. O líder foi preso por se opor ao regime político da África do Sul – onde chegou à presidência.A doutora em filosofia Helena Theodoro, uma das representantes do movimento negro na Constituinte, também se recorda das manifestações populares pedindo o embargo contra a África do Sul, mas destaca “que o clamor social não impactou nas decisões de governo”. Para ela, “o Brasil colocou interesses econômicos acima de certos interesses sociais”.