Agência mantêm expressão “gripe suína” e leitores reclamam

26/06/2009 - 6h44

Paulo Machado
Ouvidor Adjunto da EBC
Brasília - A Agência Brasil segue utilizando em suas matérias aexpressão “gripe suína”. Em 12 de maio a leitora Aline Serra,produtora da TV RBA, protestou: “Vocês ainda estão usandogripe suína, quando o termo correto, agora, é Gripe A.” Em 18de maio, foi a vez do leitor Marcelo Guazzelli perguntar: “Repareique vocês continuam chamando de 'gripe suína'. O termo recomendadopela OMS não passou a ser 'gripe A, (H1N1), nova gripe' ou coisaparecida?”Paraambas as demandas a resposta da AgênciaBrasil foi a mesma:“Continuaremos a usar a terminologia 'gripe suína' adotadainicialmente pela OMS para facilitar a comunicação, em função doalerta feito pelas autoridades mundiais sobre a gravidade da doença:uma mudança de nome poderia levar a muitos leitores a entender quese trata de uma nova doença, e para outros, a impressão de que a'gripe suína' desapareceu.”Noentanto, se a Agência considerou válida a terminologiaadotada inicialmente pela OMS para “facilitar a comunicação”,ela preferiu ignorar o fato de que, desde de 30 de abril, aOrganização Mundial de Saúde havia decidido mudar o nome da gripedevido ao temor manifestado pelas indústrias do setor alimentícioem face de uma queda nas vendas de carne suína e de defensores dosanimais, preocupados com eventuais sacrifícios de porcos: “Estamosabandonando a denominação de gripe suína por gripe A (H1N1) porqueo vírus está cada vez mais humano e cada vez menos tem a ver com oanimal”, disse Dick Thomson, porta-voz da OMS. Outrasagências noticiosas informaram na mesma data que a Federação dosVeterinários da Europa (FVE) havia comunicado que o vírus "nuncafoi detectado nos porcos" e que, por isso, a doença deve ter onome alterado para "nova gripe". Repercutindoa decisão da OMS, o ministro da Agricultura Reinhold Stephanesdeclarou: "Não há nenhum problema em se comer carne suína.A grande preocupação nossa é que se crie a ideia de que comercarne de porco faz mal, e não faz. Transmite a ideia de que é osuíno que transmite o vírus aos humanos, o que também não éverdade. Com certeza vou convidar o presidente da República, napróxima semana, para irmos a um restaurante ou fazermos um porco norolete. Com certeza nós vamos fazer, ou então vamos consumi-lo naEmbrapa", informou a Folha Online em30 de abril. Nomesmo dia, 30 de abril, a ABr se restringiu a informar namatéria OMS dá nome do vírus H1N1 à gripe suína,que: “A Organização Mundial da Saúde (OMS) informou hoje (30)que vai deixar de se referir à doença provocada pelo vírus H1N1como gripe suína e passará a chamá-la de gripe A (H1N1).”Outramatéria, publicada logo em seguida: Começa campanha emaeroportos para prevenção contra gripe AH1N1 , dava contade que: “A Organização Mundial da Saúde (OMS), o Ministérioda Saúde e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)começarão nesta sexta-feira uma campanha conjunta em portos eaeroportos para incentivar as pessoas a lavarem as mãos comfrequência. A parceria pretende minimizar as chances de contaminaçãopelo vírus causador da gripe suína, rebatizada de gripe A (H1N1) pelaOMS.”Na matéria FAO defende consumo da carne deporco, publicada no mesmo dia 30, a Agência informava sobreuma das preocupações que levaram à mudança no nome da gripe:“Mesmo diante da elevação do nível de alerta, o representanteno Brasil da Organização das Nações Unidas para Agricultura eAlimentação (FAO), José Tubino, faz coro com as autoridades queafirmam que o consumo da carne suína não representa ameaça àsaúde da população. 'É preciso evitar o pânico e efeitoseconômicos desastrosos', destacou Tubino.”. Tudo indicava quea ABr adotaria a nova nomenclatura, inclusive no título dasmatérias. Mas daí em diante, nas centenas de notícias sobre oassunto, a única exceção que encontramos, que respeitava aorientação da OMS, foi a matéria OMS mantém nível 5 dealerta de pandemia, mas adverte para risco de mutação do vírusH1N1, publicada em 18 de maio, que não falou em gripe suínae também não usou a expressão em seu título. Todasas demais notícias indicam que a AgênciaBrasil não se convenceu dos argumentosdas autoridades e dos produtores de carne suína, pois continuouusando indiscriminadamente o termo.Em19 de maio ela respondeu aos leitores que protestaram : “Pordeterminação da chefia, passaremos a usar, a partir de hoje (19),influenza A (H1N1) - gripe suína -... Nos títulos, usaremos gripesuína.” Ou seja, mesmo que as autoridades não maisutilizassem o termo, a Agência se encarregaria de fazê-lo,pelo menos ao colocar o título nas matérias. Essaprática de interpretar o que as fontes declaram foi adotada desde ocomeço da cobertura. Por exemplo: sob o título Vacina contragripe suína não será solução a curto ou médio prazo, diz OMS,publicada em 16 maio, a matéria faz uma interpretação da fala desuas fontes no título pois nenhuma das pessoas ouvidas citaram otermo gripe suína: “O mundo não deve se descuidar das medidasde alerta já empregadas para conter o avanço da gripe A, naesperança de que a aguardada vacina contra o vírus causador dadoença vá resolver o problema a curto ou médio prazo”,disse uma autoridade da OMS no corpo da notícia.Em19 de junho, o leitor Moisés de Freitas, jornalista que cobre aárea de saúde, também escreveu para a Ouvidoria protestando:“Estou incomodado com a insistência da Radiobrás [EBC] e daAgência Brasil em usar o termo gripe suína, que já foi descartadohá meses pelas autoridades. O nome correto é gripe A, ou gripe A(H1N1). Apesar de ter parecido estranho inicialmente, o nome é maissuave, mais adequado e correto.” Eleainda perguntou: “Que tal se voltássemos a dar aquelesvelhos nomes aos grupos de risco da AIDS [aidético], lembra-se ? Ouse voltássemos a chamar as crianças com Síndrome de Down demongolóides?”.AAgência Brasil respondeu ao leitor: “Na verdade estamosusando gripe suína, H1N1”, ou seja, ignorou suasconsiderações e não respondeu a suas perguntas.Levarem conta as opiniões dos leitores é uma escolha que podeinfluenciar na qualidade da informação e uma obrigação previstana legislação que criou a EBC. Pelo menos no que se refere àdoença, a Agência tem cometido imprecisões e interpretaçõesque não fazem parte dos princípios e objetivos da comunicaçãopública. Atéa próxima semana.