Polêmicas e divergências adiam pela terceira vez votação do Marco Civil da Internet

07/11/2012 - 21h42

Karine Melo
Repórter da Agência Brasil

Brasília - Depois de muita polêmica e de uma tarde inteira de conversas e negociações, a votação do Marco Civil da Internet foi adiada pela terceira vez na Câmara dos Deputados. Agora, a previsão é que a matéria seja votada na próxima terça-feira (13). Até lá, o relator da proposta, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), governo e parlamentares de oposição precisam entrar em consenso sobre os pontos principais do texto.

As divergências em torno da neutralidade da rede são consideradas o ponto crítico para o avanço do marco, elaborado para nortear os direitos e obrigações do uso da rede mundial de computadores no Brasil. Pelo texto do relator, “provedores de conexão, empresas de telecomunicação e demais agentes que atuam na operacionalização da internet não poderão efetuar discriminações quanto ao conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicativo utilizado na comunicação.” Na prática, a intenção é impedir que provedores de internet priorizem o acesso de clientes que pagam pacotes mais caros de banda larga e favoreçam conteúdos de determinados sites em detrimento de outros.

Segundo Molon, se a neutralidade for aprovada, há como fiscalizar as telefônicas. Por isso, ele diz que, neste ponto, existe resistência por parte dos provedores e das companhias de telefonia. “Eles sabem que, no fundo, isso vai inviabilizar ganhos maiores. O problema é que esses ganhos maiores significam uma violação à liberdade de escolha do usuário. Isso viola a livre concorrência porque a empresa que pudesse pagar teria seu conteúdo chegando mais rápido que quem não pudesse”, explicou.

O deputado Ricardo Izar (PSD-SP) discorda. Para ele, o princípio da neutralidade afasta investimentos. “Se alguém paga R$ 9,90 para ter só acesso a e-mails e outra pessoa paga R$ 200 para baixar filmes e fotos, ela tem que ter prioridade na hora do congestionamento. Se a gente impedir isso, como 90% [dos usuários] têm o barato e 10% o caro, as operadoras de rede vão ter que aumentar o preço do barato. Ninguém vai querer investir para ter prejuízo”, argumentou.

Declarações do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, sobre a regulamentação do Marco Civil da Internet também foram alvo de polêmica hoje. Na contramão do que quer o relator e de acordo firmado em uma reunião ontem à noite, o ministro defendeu hoje que a regulamentação seja feita pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), depois que a lei for aprovada.

"É a Anatel que tem competência para definir as regras", disse Bernardo. Na avaliação do ministro, tudo deve ser feito depois de uma ampla consulta pública. “Aqueles que defendem a total neutralidade de rede, dizem que estão defendendo a democracia, mas também estão defendendo os seus negócios. Vamos nos engalfinhar democraticamente e tirar uma posição que atenda de maneira equilibrada todos os setores."

O texto do relator não cita a Anatel - diz apenas que a regulamentação será uma atribuição do Poder Executivo. “Eu me surpreendi hoje com as declarações do ministro Paulo Bernardo. “Eu vou mudar mais uma vez o texto para que ninguém tenha dúvida de que não cabe à Anatel essa regulamentação, nem o ministro, nem nenhum parlamentar e nem nenhum cidadão”, disse Molon.

Na versão original da proposta, o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI) seria o responsável pela regulamentação, mas como se trata de um órgão criado por decreto e não por uma lei, o governo achou melhor não dar ao CGI essa tarefa.

Regras para proteger a privacidade do usuário e de dados pessoais foram incluídas na proposta, que está em discussão, e também provocaram debate. O texto do relator permite, por exemplo, que sites de conteúdo e serviços mantenham os dados cadastrais dos usuários por até um ano. Já os provedores de conexão ficam proibidos de ter acesso aos dados de clientes. Essas informações são usadas pelas operadoras para oferecer publicidade dirigida a partir do que é colhido pelos provedores.

O deputado Eli Correa (DEM-SP) defende que as empresas que atuam na conexão também tenham direito a esses dados. “Por que que só os sites vão ficar com os dados dos usuários? Defendemos a isonomia”, questionou Correa. Segundo Molon, não há como voltar atrás nessa questão. “A diferença deve existir porque os sites de serviço e conteúdo têm acesso apenas as informações que os clientes colocam nas páginas deles. No caso das operadoras de conexão, se elas pudessem guardar dados dos clientes, teriam acesso a tudo que o internauta acessa, todos os tipos de conteúdo” , alertou Molon, ressaltando que seria muito perigoso.

Sobre sigilo, a proposta prevê que os dados cadastrais de usuários só poderão ser repassados a terceiros, desde que com autorização dos clientes.
 

Edição: Carolina Pimentel