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Dinamarca reduziu consumo per capita de água em 35% nos últimos 20 anos

Giselle Garcia – Correspondente da Agência Brasil/EBC
Publicado em 20/03/2015 - 15:41
Copenhague
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© ArteDJOR

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A falta d'água já foi um problema para a Dinamarca, que hoje, com a Alemanha, encabeça a lista das nações consideradas referência na Europa no que diz respeito ao sistema de abastecimento. Depois de enfrentar um período de escassez na década de 70, o país nórdico vivenciou uma ampla reforma no setor, que gerou melhorias na qualidade da água e na eficiência do sistema, queda no percentual de perda por vazamentos e redução de 35% no consumo per capita de água por ano.

Até a década de 80, cada cidadão dinamarquês consumia, em média, 60 mil litros de água por ano, cerca de 164 litros por dia. Atualmente, o consumo médio é 39 mil litros por ano, 107 litros por pessoa/dia. No Brasil, o consumo médio atual chega a 166,3 litros per capita/dia.

Para o especialista em políticas ambientais da Universidade de Aarhus, Mikael Skou Andersen, o ponto central da reforma conduzida pelo governo foi o repasse do custo real da água para os consumidores, o que, na Europa, é chamado de “preço cheio da água”. Além de pagar pelo que consome, o cidadão na Dinamarca paga taxas ambientais e de serviços. “Com a elevação no preço, pudemos observar uma redução considerável no consumo”, enfatiza o pesquisador que acompanhou o processo de mudança no país.

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A diretiva-quadro sobre água da União Europeia (principal instrumento do bloco em relação à gestão dos recursos hídricos), lançada em 2000, estipula a introdução do chamado “preço cheio da água” em todos os países-membros, como forma de estimular o uso racional do recurso. Entretanto, muitos deles ainda não conseguiram cumprir o estabelecido. Na Irlanda, por exemplo, onde a água era fornecida gratuitamente aos cidadãos até outubro do ano passado, a escassez de água levou à implementação de um sistema de cobrança, o que tem gerado amplos protestos populares.

“A água é um recurso limitado e a implementação gradual do preço cheio é um incentivo ao uso consciente e à melhoria das instalações. Países com sistema de preço adequado, como a Dinamarca, conseguiram reduzir o consumo para algo em torno de 100 litros por pessoa, por dia, sem perda de conforto para o consumidor”, afirmou Skou. Para um consumo de 50 mil litros por ano, um cidadão dinamarquês que vive sozinho paga hoje mais de dez vezes o que pagaria em 1980: em torno de 3,5 mil coroas por ano (R$ 1,5 mil por ano, ou R$ 125 por mês).

De acordo com o pesquisador, o modelo aplicado na Dinamarca poderia ser seguido por países maiores, como o Brasil. “Para balancear, o governo poderia optar pela redução de outras taxas, ou mesmo oferecer um subsídio, o que chamamos de cheque verde, para famílias de baixa renda.”

Para ampliar a eficiência do sistema, a legislação prevê que as companhias de abastecimento mantenham o percentual de perda de água por vazamentos abaixo de 10%, do contrário, não são autorizadas a repassar a taxa ambiental aos consumidores, tendo, assim, que pagá-la ao Estado. A perda, que era de 15% na década de 80, hoje é de 6%, uma das menores do mundo. No Brasil, essa taxa varia de 30% a 40%, dependendo do município.

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A reportagem da Agência Brasil visitou a Companhia de Água de Aarhus, segunda maior cidade da Dinamarca, com cerca de 330 mil habitantes. A diretora de produção do Departamento de Água Potável, Pia Jacobsen, informa que o percentual de perda de água por causa de vazamentos em Aarhus, hoje, chega a 6%, e que a meta é reduzir para 5% até 2030. “O aumento desse percentual para acima de 10% é inadmissível, pois representaria um custo muito alto para a companhia”, observa ela, em referência ao que prevê a legislação.

A companhia de Aarhus conta com 1,5 mil quilômetros de rede, a maior da Dinamarca. Todos os anos, em média, 15 quilômetros de redes velhas ou com defeito são trocadas ou renovadas. O chefe de Operações do Departamento de Água, Michael Rosenberg Pedersen, diz que o segredo da eficiência é investimento em manutenção e monitoramento 24 horas. “Dividimos a cidade em zonas e fazemos um monitoramento especial, com equipamentos modernos. Quando um problema é detectado, enviamos uma equipe imediatamente ao local para checagem”, explica. Ele enfatizou que, para a empresa, “perder água é perder dinheiro”. “É o nosso produto que estamos jogando fora.”

Desde a seca enfrentada na década de 70, a Dinamarca passou a retirar toda a água que consome dos lençóis freáticos, e não da superfície. Nas estações de tratamento, ela passa por processos de filtragem e aeração (adição de oxigênio) e, de lá, vai direto para as torneiras. No país nórdico, é proibido fazer o tratamento da água potável com cloro ou outros aditivos, como se faz no Brasil. O governo prefere trabalhar para combater a contaminação, por meio de um monitoramento rigoroso da qualidade e da pureza de sua água subterrânea.

O resultado é uma água de alta qualidade, que sai da torneira direto para o copo dos dinamarqueses. A estudante mineira Fernanda Bartels, que mora em Aarhus há seis meses, conta que levou um tempo para tomar, com naturalidade, água da torneira. “Eu desconfiava, achava que não era pura de verdade e que iria me fazer algum mal.”

A água de torneira é servida em restaurantes e hotéis dinamarqueses. O país tem ainda um concurso anual, o Danish Water Grand Prix, em que provadores de vinho, os sommeliers, provam a água de 30 companhias de abastecimento localizadas em diferentes regiões do país e indicam qual é a mais saborosa. Os organizadores do concurso garantem que o sabor da água varia bastante de região para região, de acordo com os minerais presentes em sua composição.

Para o especialista em políticas ambientais da Universidade de Aarhus, apesar do sucesso das reformas na Dinamarca, ainda há desafios a serem enfrentados. “Os mais significativos são o controle dos níveis dos lençóis freáticos, o combate à poluição e à contaminação por pesticidas e o controle das consequências das mudanças climáticas.”

Ele destaca, entretanto, que a população dinamarquesa aprendeu a valorizar a água e avalia que esse é o caminho para os demais países. “A água é um recurso escasso e não dá mais para adotar medidas paliativas. As nações precisam encontrar um melhor balanço entre a oferta e a demanda.”