Para frear trabalho infantil, Natal cria espaços de convivência para crianças
A capital do Rio Grande do Norte se prepara para a chegada da Copa do Mundo. A competição vai aquecer ainda mais o turismo e aumentar o movimento em praias, lojas e feiras, locais em que mais se vê crianças trabalhando. É o caso de Natan, de 12 anos. Toda segunda-feira o menino falta à escola para trabalhar como carregador na Feira do bairro Rocas e ganha R$ 5 por entrega.
“Cinco horas eu chego para ganhar dinheiro e depois de ganhar dinheiro ir pra casa. Aqui termina às seis horas da tarde”.
O trabalho infantil é uma realidade em Natal. De acordo com o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 43 mil pessoas entre 10 e 17 anos trabalham na cidade. Assim como Natan, muitas crianças trabalham em feiras, na orla, no turismo e pelas ruas.
Segundo a secretária municipal de Trabalho e Assistência Social, Ilzamar Pereira, há a preocupação de que, durante o Mundial, a quantidade de crianças trabalhando aumente. Durante a Copa das Confederações, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República detectou o trabalho infantil, principalmente no comércio informal, como uma das violações mais recorrentes nas cidades-sede.
Para evitar que isso volte a ocorrer, a prefeitura vai montar dois espaços de convivência para que os pais deixem os pequenos enquanto estiverem trabalhando. Também haverá equipes para fiscalizar zonas específicas da cidade. Segundo a secretária, a maior dificuldade para combater o problema é a cultura do trabalho infantil.
“A gente sabe que isso [trabalho infantil] é uma violação de direito, por isso a necessidade da ação integrada e do trabalho com a família. Não adianta você trabalhar a criança, tentar retirá-la do trabalho infantil isoladamente porque existe todo um contexto socioeconômico, político e cultural em torno dessas famílias. Existe esse ranço cultural de dizer: é melhor que ele esteja aqui trabalhando do que roubando”, diz Ilzamar.
Em vez de trabalho, a prática do esporte. Esse é um dos objetivos da Associação de Juventudes Construindo Sonhos, que desenvolve projetos de capoeira, futebol e dança com cerca de 200 crianças e adolescentes. A organização atua em parceria com as escolas das comunidades da periferia de Natal, no combate ao trabalho infantil, destaca o diretor-presidente da Associação, Francinaldo Dantas.
“A gente tenta minimizar a evasão escolar, a situação dos meninos saírem para ficarem na rua trabalhando, agindo em harmonia com a escola. Então a gente vai para dentro da escola trabalhar lá”, diz Dantas.
Suelen da Costa, 9 anos, entrou no projeto há dois meses e sonha em ser mestre de capoeira. A menina, que ainda aprende os movimentos básicos, fala da alegria de estar no esporte.
“É um esporte muito legal e é muito melhor do que estar nas drogas, esse mundo, sabe. É muito legal, a capoeira”, diz a menina.
A prática esportiva é o que anima os meninos do loteamento Alvorada 2, no bairro Pajuçara. Depois da escola, a diversão é jogar futebol na quadra. Mas o espaço está longe do ideal. O piso de cimento tem rachaduras, o alambrado está danificado e a quadra não é coberta. Mesmo assim, para muitas crianças, é melhor estar na quadra jogando futebol do que ficar na rua.
“Melhor do que ficar na rua porque é na rua que as pessoas aprendem a fazer as coisas erradas, né?”, diz Wilson Moreira, 10 anos.
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Em uma dessas quadras, Gilvan Oliveira desenvolve o Grupo de Ação Social Aprendendo a Crescer, no qual crianças e adolescentes jogam futebol. O projeto surgiu há mais de dez anos para combater o tráfico de drogas no bairro Nossa Senhora da Apresentação. Apesar da infraestrutura precária da quadra, os meninos se destacam com a bola no pé. Em uma sala improvisada estão os troféus dos jogadores e o que mais chama a atenção é o de disciplina que os meninos ganharam em uma competição regional. Apesar das alegrias, o coordenador destaca muitas dificuldades.
“Eu tenho aqui dentro uns cinco rodos que é para limpar essa quadra, não era para acontecer isso, era para ter uma cobertura. De dia, essa quadra não funciona depois das 9h porque é muito quente. As bolas passam e batem nos portões das casas dos outros porque não tem o alambrado”, diz.
O secretário municipal do Esporte e do Lazer, Eduardo Machado, diz que a prefeitura está revitalizando as praças poliesportivas. Das 125 quadras, 44 estão em reforma. O secretário reconhece que a quantidade de espaços de lazer está longe do ideal, mas afirma que a prioridade é recuperar o que já está construído.
“Nós não temos planejamento de fazer, com recursos próprios, novos espaços de lazer porque a nossa prioridade é recuperar o que nós já temos.”
A prometida reforma ainda não chegou na quadra do projeto Aprendendo a Crescer, onde o menino Alexandre Martins, 12 anos, joga. O garoto, que sonha em ser jogador de futebol, diz que há muita coisa melhorar. “Botar o teto, cobrir, reformar a quadra melhor, pintar o piso, mudar as grades... Eu ia ficar muito feliz.”
O projeto que deu origem a esta reportagem foi vencedor da Categoria Rádio do 7º Concurso Tim Lopes de Jornalismo Investigativo, realizado pela Andi, Childhood Brasil e pelo Fundo das Nações Unidos para a Infância (Unicef).
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