Papiloscopistas se mobilizam para se tornar peritos oficiais

Publicado em 22/09/2014 - 18:23 Por Pedro Peduzzi - Repórter da Agência Brasil - Brasília
Atualizado em 22/09/2014 - 22:13

Preocupados com a possibilidade de a presidenta Dilma Rousseff vetar projeto de lei complementar que reconhece os papiloscopistas como peritos oficiais – o PLC 78/2014, aprovado no último dia 3 pelo Congresso Nacional –, aproximadamente 120 papiloscopistas da Polícia Federal e de polícias civis de vários estados estão em Brasília, onde têm se reunido com autoridades, em busca de apoio. O reconhecimento deles como peritos oficiais, no entanto, tem sido questionado por entidades representativas dos peritos.

“Nós estamos bastante otimistas de que o projeto seja sancionado. Fomos muito bem recebidos em todos os órgãos ligados à questão. Nas conversas, pudemos esclarecer que a preocupação maior do governo, que é o impacto de um aumento salarial nas contas do governo, não procede”, disse hoje (22) à Agência Brasil o presidente da Federação Nacional dos Profissionais em Papiloscopia e Identificação (Fenappi), Antônio Maciel.

Apesar de o projeto não prever aumentos salariais para a categoria, Maciel confirmou que a estratégia dos papiloscopistas é, em um segundo momento, pedir equiparação salarial com os peritos. “A luta da categoria é por aprimorar a legislação. E, já que se faz a mesma coisa [laudos], equiparar os salários onde for possível. Claro que respeitando a legislação de cada estado”, ressaltou ele, referindo-se à dificuldade que alguns estados poderão ter para cumprir com essa equiparação.

Segundo ele, em Brasília um papiloscopista ganha, inicialmente, cerca de R$ 7,5 mil, enquanto um perito criminal recebe R$ 11 mil”. No caso da Polícia Federal, o salário praticamente dobraria, passando de cerca de R$ 8 mil para R$ 16 mil, informou o presidente da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF), Carlos Antônio Almeida de Oliveira.

Para o presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais, Jones Borges Leal, “o PLC 78/2014 tem uma redação que foi projetada para não invadir a competência dos entes federados e utiliza a expressão 'peritos em papiloscopia', justamente para não não promover a ilegal transposição ou alteração de salários, pois cumpre o termo de acordo que o Governo Federal e os policiais federais fizeram após a greve de 2002, que prevê explicitamente o reconhecimento dos laudos de papiloscopia”.

Leal diz que conforme dados obtidos pela lei de acesso à informação, entre 2009 e 2013 foram produzidos por papiloscopistas policiais federais 12.694 laudos oficiais de perícia papiloscópica, muitos deles relacionados às forças tarefas da previdência social, que nos últimos dez anos detectaram R$ 4,5 bilhões de prejuízo para a União. “O PLC 78/2014 não cria ou altera os cargos e foi criado para garantir a prova produzida com a papiloscopia, pois existem estados em que o perito criminal é o perito em impressões digitais, e em outros é o papiloscopista”, explica Leal.

Os papiloscopistas são profissionais responsáveis por identificações civil (para carteiras de identidade e passaportes, por exemplo) e criminal. Por meio de seu trabalho, identificam criminosos a partir da análise dos desenhos papilares, como os encontrados nas digitais da mão. Outras partes do corpo também contém digitais que podem servir como prova material da presença de um suspeito em um local de crime, ou como prova de que ele tenha manuseado armas ou objetos para praticar um crime.

Dilma Rousseff tem até o dia 24 (prazo de 15 dias úteis, contados a partir da aprovação da proposta pelo Legislativo) para sancionar ou vetar o projeto, que inclui na lista de peritos oficiais definidos pela Lei 12.030/09 a papiloscopia – a exemplo do que já ocorre com as perícias feitas por médicos legistas, odonto legistas e peritos criminais.

“De hoje até quarta-feira (24), estamos mobilizados. Na quinta-feira (25), faremos assembleia para decidir o que fazer. Nossa confiança é grande, porque não temos encontrado resistência do governo”, disse o representante dos papiloscopistas. Conforme Maciel, o veto ao projeto resultaria em insegurança jurídica para o país, uma vez que abriria brechas para invalidar laudos papiloscópicos. “A lei, como está, já possibilitou questionamentos e suspensão de laudos”, argumentou.

A inclusão da atividade papiloscópica entre as perícias consideradas oficiais foi vetada anteriormente, em um outro projeto de lei, sob a justificativa de que entraria em conflito com a lei que regulamenta a perícia oficial brasileira.“O argumento apresentado na época pelo governo [para vetar o então PLS 244/08, que tentava classificar papiloscopistas como peritos] era que havia um vício de origem. Mas, ao alterarmos a lei original, sanamos a questão. Portanto, não há mais qualquer desculpa para um veto”, disse Maciel, momentos antes de participar de reuniões com na Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça  e na Secretaria-Geral da Presidência da República.

A mudança na legislação tem encontrado resistência da APCF, entidade que representa os peritos da Polícia Federal, e da Associação Brasileira de Criminalística (ABC), entidade nacional de classe dos peritos criminais oficiais.“A APCF é a favor do veto, porque esse projeto tem o mesmo teor do anterior [PLS 244/08]. O que ele propõe é uma transposição de cargo. Só que a Constituição prevê que a perícia oficial só pode ser exercida por quem passou em concurso público. E cabe ao Executivo fazer isso. Não ao Legislativo”, disse o presidente da APCF, Carlos Antônio.

Segundo ele, a proposta apresentada pelo Congresso Nacional cria um outro tipo de perito, “que causará celeuma” na cena de crime, ambiente que, conforme explicou, contém “centenas, senão milhares” de vestígios diferentes, além de digitais. “Isso dividiria a gestão de local de crime entre dois tipos de profissionais. Inclusive aumenta o risco de violar o local, até porque o [mau] uso de pó químico e pincel para coleta de digitais pode inviabilizar, por exemplo, o exame de DNA”, ressaltou.

Em nota, a ABC informa que “se opõe a qualquer forma de burlar o concurso público e de ascensão funcional sem o devido respeito à legislação vigente e à Carta Maior”. Segundo o presidente da entidade, Bruno Telles, a diferença entre peritos e papiloscopistas “se faz na complexidade das atribuições dos cargos, em que os papiloscopistas desempenham atividades de nível médio, enquanto os peritos oficiais exercem atividades de nível superior”.

Na avaliação da ABC, a mudança na legislação apresenta “inconstitucionalidades, como a transposição funcional e o desrespeito ao pacto federativo, além do impacto orçamentário", observou Telles, que classifica o caso como uma “manobra para se conseguir ganhos salariais, como já foi tentado no DF e no Piauí”.

* Texto atualizado às 22h13 para inclusão do posicionamento da Federação Nacional dos Policiais Federais

Edição: Armando Cardoso

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