logo Agência Brasil
Geral

Especialistas pedem inclusão de anemia de Fanconi em política de doenças raras

Aline Leal - Repórter da Agência Brasil
Publicado em 24/04/2016 - 10:35
Brasília

Doença rara, grave e congênita, a anemia de Fanconi pode se manter anônima por anos, até que um médico possa suspeitar do diagnóstico. Para que as informações sobre esta síndrome tenham mais espaço entre os profissionais, especialistas defendem que a síndrome deve ser incluída na Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras.

“A anemia de Fanconi, como a maioria das doenças raras, é de difícil diagnóstico porque os médicos não têm muita consciência da identificação da doença. Se ela estiver inserida no rol de doenças raras, o próprio Ministério [da Saúde] vai ter um protocolo e fazer o trabalho de divulgar para os profissionais de todo o país”, defendeu a presidente do Instituto de Medula Óssea (TMO), Regina Bruni. Segundo a especialista, atualmente não há um protocolo nacional para a doença, mas há um protocolo no TMO que se tornou referência internacional.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), doenças raras são aquelas que afetam até 65 pessoas a cada 100 mil indivíduos. Estudos internacionais indicam que a incidência da anemia Fanconi pode variar de um em cada 360 mil até um em cada 100 mil indivíduos nascidos vivos. O Ministério da Saúde não se manifestou sobre a inclusão desta doença à política nacional.

Anemia de Fanconi é uma síndrome genética herdada dos pais. É preciso herdar uma mutação do pai e outra mutação da mãe para a criança apresentar a doença. Embora seja incurável, é possível evitar a mais grave complicação, a falência da medula óssea, caso a doença seja diagnosticada logo no início. “Com o transplante, os sintomas ficam estancados porque a medula passa a funcionar de uma forma correta”, explicou Regina.

O hematologista pediátrico Lisandro Ribeiro, do Hospital das Clínicas de Curitiba, diz que parte das crianças fanconi nascem com características peculiares à síndrome. “A maioria das crianças apresenta alguns estigmas genéticos, algumas características que auxiliam para chamar atenção para anemia: baixa estatura, baixo peso, manchas café com leite pelo corpo, rosto mais delicado, olho menor, boca pequena, rosto típico da anemia de Fanconi, mais delicado, podem ter alterações esqueléticas, nascer sem o dedinho”, detalhou Ribeiro.

O especialista, que atua em um centro referência no atendimento de pacientes com anemia de Fanconi, também ressaltou que esta doença predispõe a pessoa a ter alguns tipos de câncer.  “Quanto mais cedo o paciente for diagnosticado, mais cedo ele irá receber orientações para evitar hábitos que facilitem o desenvolvimento de cânceres”, disse. “Tem toda uma orientação a não exposição ao sol, tabagismo, a tomar vacina contra HPV, evitar bebidas alcoólicas”, exemplificou Ribeiro.

O especialista estima que no Brasil menos de 500 pessoas tenham a anemia de Fanconi. "Quase todos vêm para Curitiba. Atualmente estamos acompanhando cerca de 300, mas devem ter outros sendo tratados em outros estados". 

Vida normal

Aos 25 anos, fazendo faculdade de ciências contábeis, a goiana Alessandra Goularte recebeu o diagnóstico de que tem Síndrome de Fanconi. “Minhas características são bem pequenas, uma pessoa leiga não nota nada. Então fisicamente não se notou nada até esse momento. Eu tive o diagnóstico depois que o médico viu alterações no hemograma, que eu tinha feito nos exames de rotina”, disse a contadora, hoje com 40 anos. Depois do diagnóstico, a estudante começou a ser acompanhada por especialistas em Curitiba.

Alessandra Goularte

Aos 25 anos, fazendo faculdade de ciências contábeis, a goiana Alessandra Goularte recebeu o diagnóstico de que tem Síndrome de FanconiAlessandra Goularte/Arquivo pessoal

No mesmo período, Luciano, irmão de Alessandra, também teve o mesmo diagnóstico e os dois receberam orientações para levarem uma vida mais regrada, para evitar as complicações .  ”Eu sempre me cuidei bastante em relação à alimentação, nunca bebi ou fumei, nunca virei noites em baladas. Passeava, viajava: vida normal. Mas tudo dentro de um determinado limite. Já meu irmão não aceitou a doença, teve uma vida bem agitada, ia para balada, ingeria álcool, como todo jovem, e isso é um ponto que para nós, fanconi, aumenta muito risco de câncer”, afirmou.

Em 2013, Luciano teve o diagnóstico de câncer na gargante e em 2014 morreu por complicações da doença. “Nesse período eu cuidei dele e passei por todo o processo. Acredito que o emocional me fez ficar com a imunidade mais baixa”, disse Alessandra.

Em 2014, ela precisou fazer transplante de medula óssea e meses mais tarde teve diagnóstico de câncer de mama. Depois da cirurgia de mastectomia, a contadora se recupera em Curitiba, cidade que se tornou referência no tratamento de anemia de fanconi.“Sou uma pessoa feliz, alegre, amada, e vivo a vida normal dentro do possível”, afirmou.

Doenças Raras

Em 2014, foi publicada a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras, que organiza a rede de atendimento para prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação. Além disso, o Ministério da Saúde pretende lançar, até 2018, os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) para 47 doenças raras, orientando médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e demais profissionais de saúde a como realizar o diagnóstico, o tratamento e a reabilitação dos pacientes.