Venda de liminares era negociada em aplicativo de mensagens
Advogados e pessoas de confiança de desembargadores do Tribunal de Justiça do Ceará (TJ-CE) negociavam venda de liminares por meio de grupos formados no aplicativo WhatsApp, segundo informações divulgada pela Polícia Federal em Fortaleza. A PF deflagrou hoje (28), junto com o Ministério Público Federal no Ceará (MPF-CE), a segunda fase da Operação Expresso 150.
Catorze advogados e três desembargadores foram alvos de mandados de condução coercitiva e de busca e apreensão em seus escritórios e gabinetes. Batizada de Cappuccino, essa fase da investigação revelou que os envolvidos se organizavam em três núcleos, cada um atuando em torno de um magistrado.
Um dos núcleos envolveu candidatos a concurso da Polícia Militar do Ceará feito entre 2011 e 2012. Mais de 300 pessoas foram beneficiadas a partir da compra de liminares que permitiram o ingresso na carreira de soldado. A Polícia Federal estima que cada candidato pagou cerca de R$ 5 mil. Os outros dois núcleos envolviam, na maioria, a negociação de habeas corpus para criminosos em plantões judiciários, que chegavam a custar R$ 150 mil.
“No plantão, o desembargador atua de maneira isolada e, mesmo que a decisão seja revertida na próxima sessão, o prejuízo já foi causado. Numa situação em que alguém está sendo procurado pela Justiça, com mandado expedido pelo próprio Judiciário, ou em flagrante-delito feito pela polícia, todo o trabalho é posto em prejuízo absoluto porque quem tem uma decisão como essa não vai ser encontrado na segunda-feira no mesmo local onde a polícia o encontrou durante a prisão”, disse o superintendente da Polícia Federal no Ceará, Delano Cerqueira Bunn.
Operações
As investigações da Polícia Federal começaram em 2013 quando um homem preso em flagrante com 107 quilos de cocaína teve um habeas corpus concedido durante um plantão judiciário. O fato foi verificado durante o andamento da Operação Cardume, que prendeu 26 pessoas envolvidas em tráfico internacional de drogas. Seis pessoas ligadas à organização do tráfico foram beneficiadas com alvarás de soltura pagos pelos chefes do grupo, cada um a R$ 150 mil.
Juntando as duas fases da operação, segundo a PF, cinco magistrados teriam envolvimento no esquema de venda de liminares. Na primeira fase, em junho de 2015, a Polícia Federal foram investigados os desembargadores Carlos Rodrigues Feitosa, Paulo Camelo Timbó e Váldsen da Silva Alves Pereira. Nesta fase, Pereira foi ouvido novamente e foram alvos de mandados de condução coercitiva os desembargadores Francisco Pedrosa Teixeira e Sérgia Maria Mendonça Miranda. Quando houve a deflagração da primeira fase da operação, Timbó e Feitosa disseram que não iriam se pronunciar sobre o caso.
Feitosa e Timbó também foram alvo de Processos Administrativos Disciplinares (PAD) no Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Além do processo disciplinar, Feitosa também é réu em ação penal no Superior Tribunal de Justiça (STJ). “Muitas dessas pessoas agiam com a certeza absoluta da impunidade, de que estavam respaldas e eram intocáveis”, disse o superintendente.
O inquérito que investiga o esquema de venda de liminares no TJ-CE está sob a responsabilidade do ministro do STJ, Herman Benjamin, que foi quem autorizou as ordens de busca e condução coercitiva. O processo teve o segredo de justiça suspenso hoje.
Em nota, a desembargadora Iracema do Vale, presidente do TJ-CE, disse que a instituição “viabilizou todos os procedimentos necessários ao cumprimento das referidas decisões, pautando-se, como deve ser, pela transparência e pelo respeito à ordem constitucional”.
A Ordem dos Advogados do Brasil – Seção do Ceará informou que “se dispõe, no âmbito de sua alçada, a contribuir com os trabalhos investigativos, apurando com rigor e respeito aos cânones constitucionais da defesa ampla, bem como, eventuais desvios de conduta praticados por advogados.” O Tribunal de Ética e Disciplina da ordem investigou outros 13 advogados citados na primeira fase da Operação Expresso 150.
Pornografia infantil
Com a análise do material apreendido na primeira fase, a Polícia Federal encontrou imagens e vídeos de pornografia infantil em dispositivos eletrônicos de advogados envolvidos na venda das liminares. Segundo Bunn, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece que a posse desse tipo de material já constitui crime. O MPF informa que, caso as evidências sejam confirmadas, os advogados serão julgados pela primeira instância de Justiça.