Técnicos do Ipea apontam risco de crescimento das ações trabalhistas com reforma

Publicado em 31/10/2017 - 18:45 Por Alex Rodrigues - Repórter da Agência Brasil - Brasília

Técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontam que, se as instâncias de representação dos trabalhadores não forem fortalecidas, a reforma trabalhista não só prejudicará os trabalhadores como poderá causar diversos problemas para o Poder Público, incluindo o possível aumento de processos na Justiça do Trabalho e a queda na arrecadação de impostos. Isso porque o cenário pode inviabilizar a negociação coletiva, pontro central da nova legislação, que entra em vigência no próximo dia 11. O tema foi discutido em artigos na 63ª edição do Boletim Mercado de Trabalho e em entrevistas durante o lançamento do documento, ocorrido hoje (31).

Para o economista Sandro Sacchet, ao mesmo tempo em que procuraram conceder maior peso à negociação coletiva, estabelecendo que os acordos negociados entre sindicatos e empregadores deve prevalecer sobre a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), os legisladores acabaram enfraquecendo o principal representante dos trabalhadores, ou seja, os sindicatos (que perderam a contribuição sindical compulsória), sem deixar claro como deverão atuar os comitês de empresas e comissões de fábricas. Além disso, na avaliação do técnico, a reforma também procura restringir o acesso dos empregados à Justiça do Trabalho.

“Ao mesmo tempo em que concede um grande peso à negociação coletiva, a reforma contém inúmeros pontos que enfraquecem o poder de barganha dos trabalhadores e sindicatos, principalmente na questão sobre jornada de trabalho”, declarou Sacchet, que é doutor em economia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ).

Alternativa à judicialização

Ao abordar os conflitos laborais e a atuação da Justiça Trabalhista, o pesquisador André Gambier defendeu que as organizações representativas dos trabalhadores podem significar uma alternativa à judicialização das eventuais desavenças entre patrões e empregados.

“Desde que mais representativas e enraizadas nos locais de trabalho, essas organizações podem colaborar para o desenvolvimento de uma abordagem preventiva dos conflitos, capaz de evitar que estes sejam dirigidos à Justiça do Trabalho, onde sua resolução é demorada e dispendiosa para empregados, empregadores e para o próprio Estado”, sugeriu Gambier, doutor em sociologia pela Universidade de São Paulo (USP) e especialista em Direito do Trabalho. “Ocorre que a mais recente iniciativa de reestruturar as organizações de trabalhadores mostra-se limitada e restrita. Há muitas dúvidas se a Lei 13.467 será capaz de modificar tais organizações neste sentido. E, sem isso, é difícil cogitar alternativas para a resolução de conflitos laborais que não passem pela Justiça do Trabalho”.

Necessidade da reforma

Em seu artigo para o boletim, Sacchet enfatiza que não discute se havia ou não necessidade de alterar a legislação trabalhista, mas sim a forma como a Lei 13.467 foi aprovada. Para o técnico do Ipea, o texto da lei aprovada está repleto de contradições, podendo gerar consequências contrárias aos três principais benefícios esperados pelos entusiastas da reforma: crescimento do nível de emprego formal; mais segurança jurídica para empregadores e trabalhadores e aumento da produtividade.

“Acho que, possivelmente, nenhum destes três pontos serão atingidos. Pode até ser que sejam alcançados, mas não considero que as condições para garantir isso estejam efetivamente postam pela reforma”, disse Sacchet, enfatizando que o sucesso da reforma trabalhista depende fundamentalmente do fortalecimento da representação dos trabalhadores na negociação. “Caso não se consiga preservar o poder de barganha dos trabalhadores, deve-se esperar uma ampliação das desigualdades”.

Já o doutor em desenvolvimento econômico pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Tiago Oliveira, que é bolsista da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do Ipea, destacou que as mudanças na legislação vão repercutir também no mercado laboral no campo.

“Tanto as mudanças mais amplas, que estimulam a terceirização e introduzem novas formas de contratação, quanto as mudanças mais específicas, relacionadas à jornada de trabalho, aos intervalos e ao pagamento das horas de deslocamento entre casa e trabalho, por exemplo, serão provavelmente utilizadas para regularizar e amplificar práticas comuns no meio rural que estavam sujeitas a sanções”, alerta Oliveira.

Impactos negativos

Oliveira elenca uma série de possíveis impactos sobre as relações de trabalho estabelecidas no campo, como jornadas de trabalho mais extensas, período de descanso mais curtos e salários mais baixos. Além disso, ele teme pela repercussão negativa sobre os contratos de trabalhos informais, uma vez que a legislação trabalhista mais severa sempre serviu de parâmetro para a fiscalização do setor informal.

“A reforma vai no sentido de valorizar a negociação coletiva, o que é desejável, desde que isso venha acompanhado pelo fortalecimento do ente que vai representar o elo mais frágil da negociação, que são os trabalhadores. A reforma não fez isso. Ela apenas tira o peso legal da regulação do trabalho no Brasil, eleva o valor da negociação coletiva ao passo que enfraquece os sindicatos”, aponta o economista, defendendo o pagamento da contribuição sindical compulsória por todos os trabalhadores – mecanismo legal abolido com a reforma trabalhista. “Esta proposta tinha que vir acompanhada por uma discussão sobre a estrutura sindical no Brasil, pois as pessoas precisavam entender que a contribuição era cobrada de todos porque os efeitos das negociações coletivas beneficiava a toda a categoria, seja o trabalhador filiado ou não”.

Edição: Davi Oliveira

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