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Direitos Humanos

Dia da Consciência Negra: conheça cinco cientistas que dão o tom

No 1° ep. do podcast ouça a doutora em física do ITA, Sônia Guimarães
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Beatriz Arcoverde e Fran de Paula
20/11/2024 - 07:15
Brasília
Sônia Guimarães - Professora do ITA - Ciência: Mulheres negras dão o tom 1
© Arte EBC

Pela primeira vez o dia 20 de novembro, o dia Nacional de Zumbi dos Palmares e da Consciência Negra, será celebrado como feriado nacional. A lei foi sancionada no ano passado. A data marca o protagonismo negro na história do Brasil.

Neste dia 20, a Radioagência Nacional apresenta o podcast “Ciência: mulheres negras dão o tom”, em que traz histórias de mulheres negras incríveis que contribuem para a pesquisa nacional nas mais diversas áreas de conhecimento e ainda atuam na luta por Direitos Humanos e contra o racismo.

Neste primeiro episódio, Sônia Guimarães: Uma pequena xereta e sua enciclopédia, trazemos a história da professora do Instituto Tecnológico de Aeronáutica o ITA de São José dos Campos, Sônia é a primeira é mulher negra doutora em física.

Primeira. Pioneira. Desbravadora. Abridora de caminhos. Essas são algumas das palavras mais relacionadas, ainda hoje, às mulheres negras que ingressam no mundo das ciências exatas. Engenharias, física, química, ciências, matemática... tudo isso ainda está muito atrelado aos homens e aos homens brancos.

"Porque as exatas têm dono: branco e do gênero masculino. e eles não gostam dessa invasão da mulherada, ameaçando a posição deles. Então eles fazem o que eles podem para impedir que a mulherada chegue onde elas querem." destaca Sônia.

A PHD ingressou no ITA – o Instituto Tecnológico de Aeronáutica, em 1993, mas três anos depois ela é expulsa da Instituição. No entanto, ela reconquista seu direito de estar na sala de aula e volta para o ITA.

Pioneira. Desbravadora. Abridora de caminhos. Essas são algumas das palavras mais relacionadas, ainda hoje, às mulheres negras que ingressam no mundo das ciências exatas. Engenharias, física, química, ciências, matemática... tudo isso ainda está muito atrelado aos homens e aos homens brancos.

Sônia Guimarães, pesquisadora desde pequena quando buscava respostas nas enciclopédias, está na luta para garantir o direito das meninas, principalmente as meninas negras, de sonhar e conquistar. Ela atua  e é referência em projetos como Cientistas do Alto Sertão, Futuras Cientistas, Investiga Menina e Pesquisa para Elas.  E ainda preside a Comissão de Justiça, Equidade, Diversidade e Inclusão da Sociedade Brasileira de Física e é membra da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros.

Então aperte o play e ouça este episódio que está imperdível!

Você também pode ouvir nas plataformas de áudio!

Episódio 1 – Sônia Guimarães - Uma pequena xereta e sua enciclopédia

BEATRIZ: Pela primeira vez, o dia 20 de novembro, o dia Nacional de Zumbi dos Palmares e da Consciência Negra, será celebrado como feriado nacional. A lei foi sancionada no ano passado. A data marca o protagonismo negro na história do Brasil.

FRAN: Neste dia 20, a Radioagência Nacional apresenta o podcast “Ciência: mulheres negras dão o tom”, em que traz histórias de mulheres negras incríveis que contribuem para a pesquisa nacional nas mais diversas áreas de conhecimento. E ainda atuam na luta por Direitos Humanos e contra o racismo.

VINHETA: Ciência: Mulheres negras dão o tom🎶  

BEATRIZ: Olá, eu sou Beatriz Arcoverde, jornalista negra e vamos falar de mulheres potentes.

FRAN: Eu sou a Fran de Paula, também uma jornalista negra. Juntas, nós conversamos com cinco pesquisadoras que dão o tom nas suas áreas de atuação.

BEATRIZ: Primeira. Pioneira. Desbravadora. Abridora de caminhos. Essas são algumas das palavras mais relacionadas, ainda hoje, às mulheres negras que ingressam no mundo das ciências exatas. Engenharias, física, química, ciências, matemática... tudo isso ainda está muito atrelado aos homens e aos homens brancos.

SÔNIA: Porque as exatas têm dono: branco e do gênero masculino. E eles não gostam dessa invasão da mulherada, ameaçando a posição deles. Então eles fazem o que eles podem para impedir que a mulherada chegue onde elas querem.

FRAN: Essa que está falando é a Sonia Guimarães. Ela é a primeira em muitas coisas.

SÔNIA: Meu nome é Sônia Guimarães, eu sou professora doutora do Instituto Tecnológico de Aeronáutica, o ITA, de São José dos Campos, eu dou aula de física Experimental. Mais do que tudo eu sou a primeira doutora, né, que tirei o título de doutor, de PHD, no doutorado obtido na Inglaterra.

BEATRIZ: Uma pioneira. Uma história que é dela, mas também de tantas outras mulheres negras. Em 1989, Sônia voltava da Inglaterra com seu PHD em física.

EFEITO SONORO VOLTA NO TEMPO🎶  

FRAN: Em 1945, Enedina Alves Marques formava-se em Engenharia Civil na Universidade Federal do Paraná. Foi a primeira mulher a se formar em engenharia no estado. A primeira negra.

BEATRIZ: A história da Enedina está contada na página “Personalidades do Muro” da Universidade Federal de Itajubá. Lá, eles contam que a engenheira foi criada na casa de um delegado, para quem a mãe trabalhava como empregada doméstica. Para acompanhar a filha do patrão da mãe, foi matriculada em uma escola particular.

FRAN: Fez escola normal, trabalhou como professora no interior do estado e, em 1940, ingressou no curso de engenharia. Já formada, trabalhou no Plano Hidrelétrico do Paraná e atuou no aproveitamento das águas dos rios Capivari, Cachoeira e Iguaçu. Segundo o muro da Unifei, muitos consideram a Usina Capivari-Cachoeira seu maior feito como engenheira.

BEATRIZ: Em matéria sobre os 110 anos de Enedina, em 2023, a Agência Brasil trouxe trechos de um artigo sobre a engenheira. No trabalho, o então estudante Jorge Luiz Santana, afirma que a mulher sofreu preconceito e perseguições na universidade, com professores que insistiam em reprová-la. Em um dos episódios em que recebeu nota baixa em avaliação, ela precisou mostrar ao professor o trecho que usou na resposta, tirado do livro do próprio professor.

FRAN: Mais uma vez, uma experiência que não é única entre as pioneiras. Aconteceu na década de 1940, quando Enedina era estudante, e também aconteceu com a Sônia, em 1993, quando ela ingressou no ITA – o Instituto Tecnológico de Aeronáutica, já como docente.

SÔNIA: A pior coisa do mundo. A Pior coisa que eu fiz na minha vida foi entrar nesse Instituto. Eu passei, eu fui aprovada no concurso, mas eu fui aprovada em segundo lugar. Mas o primeiro lugar não pode assumir. Um colega meu queria cancelar o concurso, mas isso aconteceu em 16 de fevereiro e as aulas começariam 1º de março. Então ele não pode cancelar, ele teve que me engolir por três anos. No terceiro ano, ele entra na minha sala com 12 avaliações dos meus alunos, eu dava aula só para meninos, 120 meninos. Ele entra com, da ordem de 12 avaliações na mão, onde as avaliações estava escrita assim, “a Sônia é a pior professora do mundo”. Eles estavam no segundo semestre do primeiro ano, eles já conheciam todas as professoras do mundo. “A Sônia não sabe física”. Graduação na Federal de São Carlos, mestrado na USP de São Carlos, doutorado na Universidade de Manchester na Inglaterra, PhD portanto e eu ainda não sabia física. Por causa dessas 12 ou 13 avaliações, eu fui expulsa do ITA por mais de 10 anos, eles me mandaram embora.

BEATRIZ: É que, junto com o pioneirismo, geralmente vem a descredibilidade. A desconfiança. E o preconceito mesmo, claro. Enedina, por exemplo, como conta o muro da Unifei, ficou conhecida por usar macacão durante a obra da Usina. A história fala ainda que ela portava uma arma na cintura para se fazer respeitada. Era enérgica e rigorosa. Precisava se impor. Por ser mulher. E por ser negra.

SOBE SOM🎶  

FRAN: Já a Sônia não anda com arma na cintura. O que não quer dizer que não está sempre lutando e trazendo meninas para a luta, em projetos como Cientistas do Alto Sertão, Futuras Cientistas, Investiga Menina e Pesquisa para Elas. Ainda atua na Comissão de Justiça, Equidade, Diversidade e Inclusão da Sociedade Brasileira de Física, é membra da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros, além de mentorar um “bastantão” de meninas, como ela mesma diz.

BEATRIZ: Uma vida dedicada à ciência, à pesquisa, à inovação. Pesquisa que ela já fazia desde pequena, em São Paulo, com as enciclopédias que a mãe, não sabendo como responder às muitas perguntas da menina, comprou. Desde sempre, Sônia se mostrou uma “pequena xereta”.

SOBE SOM🎶  

SÔNIA: A minha infância foi muita brincadeira, sempre que a gente brincava de escolinha, eu tinha que ser a professora, eu que definia quem eram os alunos. Mas eu sempre fui o que minha avó chamava de xereta, eu vivia perguntando “porque é que o céu é azul, porque que a nuvem branca?” E isso irritava a minha avó, porque ela não sabia as respostas. Então ela me chamava de xereta. Daí minha mãe conheceu uma professorinha, dona Hilda aposentada, mas que recebia criancinhas na casa dela para dar aula. Com quatro anos e meio eu já aprendi a lei a escrever e minha mãe comprou uma tal de enciclopédia, a gente tinha duas enciclopédias em casa. Enciclopédia é o que hoje é o Google, mas era impressa, da ordem de 16 volumes, livros pesadíssimos enormes. E quando eu fazia essas perguntinhas que todo mundo não sabia responder e minha avó me chamava de xereta, minha mãe dizia “agora você já sabe ler e escrever, vai lá na enciclopédia e veja a resposta”. E eu via mesmo. A enciclopédia sempre respondeu todas as minhas perguntas.

FRAN: Excelente aluna, Sônia era, pelo menos, a segunda melhor da classe. Isso dava a ela o direito de estudar no turno da manhã. Horário reservado para os mais inteligentes da escola. Mas, por uma questão, digamos, de “cor”, Sônia foi colocada pra estudar à tarde.

SÔNIA: Eu sempre fui pelo menos a segunda melhor aluna da classe e isso me dava o privilégio de estudar de manhã. De manhã estudavam os melhores estudantes do colégio. Aí teve um ano que a filha branca da faxineira queria estudar de manhã. Adivinha quem que eles tiraram de manhã? A única neguinha que tinha lá. Aí eles me botaram à tarde. Isso acabou comigo, eu queria morrer de ter que estudar à tarde. Na minha primeira prova de física, ciências, né, física, eu tirei uma nota baixa, tipo, sei lá, um seis. Eu nunca tinha tirado uma nota tão baixa. Cheguei para professora e a professora disse “você nunca vai aprender física”. Aí eu terminei esse ano como a segunda melhor aluna de todo o colégio. Eu tive que fazer um vestibular para sair do ginásio e ir para colegial, ou seja, do fundamental, como chama hoje, para ir para o ensino médio. E nesse vestibular a minha nota foi a segunda melhor nota de todo o colégio. Quer dizer, eu iria voltar para de manhã, né? Não ia mais ninguém ter dúvida que eu tinha que estudar de manhã.

BEATRIZ: Mas Sônia tinha outros planos. E também queria andar de ônibus todos os dias.

SÔNIA: Eu saí do colégio e fui estudar no Liceu de Artes e ofícios, fui fazer o curso técnico de edificações. Não porque eu sonhava em ser técnica em edificações, mas porque tinha que pegar o ônibus. A minha vida inteira, eu estudei pertinho da casa da minha mãe, pertinho da casa da minha avó e dessa vez eu ia precisar pegar ônibus e era no centro. Era uma farra ir pro centro todo dia.

FRAN: Como técnica em edificações, Sonia só trabalhou na época do estágio mesmo. Logo depois, prestou o vestibular que era conhecido com MAPOFEI - Vestibular Unificado de Ciências Exatas e Engenharia que dava acesso ao Instituto Mauá de Tecnologia (MA), Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (PO) e a Faculdade de Engenharia Industrial (FEI).

BEATRIZ: Os candidatos podiam marcar até 16 opções de cursos. Sonia, então, marcou todas as 13 engenharias, já que era técnica em edificações, e as três físicas que apareciam como opção.

SOBE SOM🎶  

SÔNIA: E entrei em física na Federal de São Carlos. No segundo ano de física, eu comecei a fazer física moderna e dentro da física moderna, você aprende três operadores matemáticos que explicam a formação da luz. Na realidade de todo o espectro eletromagnético onde a luz está incluída. Eu sempre gostei muito de matemática, eu falei “genial”: matemática explicando o surgimento da Luz, um fenômeno físico. Genial. Eu gosto muito de física.

FRAN: Também no segundo ano do curso, Sonia foi apresentada, por um professor, aos semicondutores. E se decidiu, ali, a continuar na Física.

SÔNIA: Semicondutores são materiais que, às vezes conduz, e às vezes não. E ele faz isso conforme você o fabrica. Ele conduz ou não quando você quer, como você quer, onde você quer. E esses semicondutores são à base de todos os dispositivos que existem hoje: eletrônicos, microeletrônicos e nanoeletrônicos. E o (físico brasileiro Jorge André) Swieca previu isso nos anos 70 ele nos dizia: “o semicondutores vão ser a base de todo o desenvolvimento tecnológico que vai existir no futuro”. E eu fiquei numas “oh, sem condutor, a base do desenvolvimento tecnológico”. Me apaixonei por semicondutores e minha carreira inteirinha, eu trabalhei com semicondutores, no mestrado, no doutorado, agora no Instituto no Instituto Aeronáutico, espaço, também trabalhei com semicondutores. Então, na realidade eu decidi a continuar a física no segundo ano de física.

BEATRIZ: Uma decisão, em certa medida, solitária e sem muito apoio dentro da instituição.

SÔNIA: Tinha 1.500 alunos na federal quando eu entrei e eu era a única menina negra e tinha mais quatro meninos, quatro ou cinco meninos negros. Dois na física um na química e um da enfermagem. Já na já dentro da do curso, né? Fazendo o curso de física na federal, eu descobri que eu podia pedir uma bolsa de iniciação científica e eu já fazia pesquisa, desde os meus quatro anos, eu sempre buscava a enciclopédia para responder às minhas perguntas. Aí eu pensei “ulalá fazer ganhar dinheiro”, porque uma bolsa de iniciação científica te da um recurso, te dar um dinheiro para você fazer pesquisa, falei “legal, ganhar dinheiro para fazer pesquisa” e fui correndo pedir essa bolsa. Resposta: “você nunca vai usar a física para nada, para que que eu vou desperdiçar uma bolsa com você?” Não ganhei de jeito nenhum a bolsa. Mas eu terminei o curso de física em quatro anos, que era o tempo regulamentar. Quando eu entrei na física éramos da ordem de 50 alunos e alunas. 50 alunos, sendo que sei,s cinco ou seis meninas. Nos formamos da ordem de seis estudantes, duas meninas, Adivinha quem era uma das meninas que se formou no tempo regulamentar? E hoje eu sou professora de física. Quer dizer, eu tô usando física para alguma coisa.

SOBE SOM🎶  

FRAN: Entre as coisas para as quais Sonia usa a física, está a invenção de produtos, com pedido de patente e tudo. Lembra de quando ela foi mandada embora do ITA, por causa de algumas más avaliações de alunos? A pioneira Sonia não se deixou intimidar...

SÔNIA: Eles me mandaram embora pro Instituto de Aeronáutica e Espaço, onde eu inventei uma técnica para produzir sensores de radiação infravermelha. Sensores ainda de semicondutores, radiação infravermelha são ondas de calor. Os meus sensores, uma vez encapsulados, se tornam detectores de radiação infravermelha, eles vão na cabeça do míssil, é através dele que eles veem a temperatura de 600 Kelvin, é através dos meus sensores que o míssil vê o avião que ele vai atacar. Eu pedi uma patente e saiu a patente! Além de cientista, eu sou inventora!!

BEATRIZ: Arrasou!

SÔNIA: Sabe aquela neguinha, sabe aquela neguinha que “nunca iria aprender física”? Sabe aquela neguinha que nunca cairia usar física para nada? É inventora com uma coisa 80% física, química para produzir os sensores e engenharia eletrônica, porque na hora que os meus sensores veem o calor, veem as ondas de calor, ele transforma essas ondas em energia elétrica, que vão para um computador, que diz pro míssil qual, onde que ele tem que atacar. Então, meu bem, sabe, além de tudo, eu sou inventora ahah!

BEATRIZ: A, agora também inventora, Sônia, voltou para o ITA, mas ainda não tem sossego para realizar suas pesquisas, desenvolver seus projetos e ministrar suas aulas. O racismo e o machismo não costumam dar trégua mesmo. Ainda hoje.

SÔNIA: É um inferno até hoje, tá? Esse ano aqui, eu era o meu ano de pedir progressão profissional e a avaliação dos meus alunos de alunas vale também para essa progressão. Mandaram avaliações com palavras tão horrorosas que o reitor da graduação tirou essas avaliações. Porque a avaliação é para melhorar meu curso, não para me ofender. Pois os alunos foram lá e exigiram que aquelas avaliações fossem lidas, porque o objetivo deles é que eu não fosse promovida profissionalmente, mas eu fui agora eu sou professora associado dois. Nunca vou chegar a ser titular, porque 13 anos de expulsão. Quando eu voltei depois da expulsão, a minha avaliação profissional de 13 anos valeu só para um grau, só para uma promoção. Então eu não vou chegar a titular, imagina quantas professoras negras de física titulares nas universidades existem? Eles simplesmente me tiraram mais um pioneirismo.

FRAN: O Brasil, se a gente parar pra pensar, é um país que tira pioneirismos todos os dias. Dados do boletim Pele Alvo, divulgados no dia 07 de novembro deste ano, mostram que, a cada quatro horas, uma pessoa negra é morta pela polícia no país. Relatório do Unicef, apresentado em agosto, também revela que crianças e adolescentes negros são 83% das vítimas de mortes violentas no Brasil.

SOBE SOM🎶  

BEATRIZ: Tirar o pioneirismo negro é impedir que a diversidade faça novas perguntas e proponha novas soluções para os problemas que enfrentamos.

SÔNIA: A diversidade apresenta ideias novas. Formas novas de pensar. Nos aeroportos na Europa, as saboneteiras não reconhecem a pele negra, se uma pessoa botar a mãozinha na saboneteira soltar o sabonete, não vem. Porque, simplesmente, quem inventou essa tecnologia pensou só em pele branca. O oxímetro, aquele equipamento que foi usado durante a pandemia para medir o oxigênio no sangue da gente, aquele que a gente botava um dedinho lá dentro e ele dizia se a gente estava com pouco ou o suficiente de oxigênio no sangue, não funciona pra pele preta. Que que aconteceu nessa tecnologia? Quem inventou essa tecnologia, simplesmente esqueceu. Ele ainda tá pensando na cor da pele sabe? Na pele de quem? Sabe, a cor da pele, uma pele de quem? Porque a gama de cores da pele que existem é bárbara. Mesmo os reconhecimentos faciais. Quem inventou os reconhecimentos faciais fez de um jeito extremamente racista, que quando a pessoa se reconhecida é negroide, tem as características das pessoas negras, já é direto classificada como suspeito ou diretamente criminoso. Por ser negro. E é o reconhecimento das faces que vai direto para o policial. O policial já vê aquela coisa e já fala “não, suspeito”, só porque tem características negroides. Se tivesse um negro trabalhando nessas tecnologias todas, ele teria colocado a cor da pele dele nessa história.

FRAN: Os exemplos citados por Sonia ilustram um argumento que Gilberto Gil usou para defender as cotas raciais nas universidades. Em entrevista em 2019, o cantor e compositor afirmou “gosto de pensar a política de cotas como uma oportunidade que esse povo preto, periférico e de baixa renda está dando ao mundo acadêmico convencional, eurocêntrico e embranquecido, de conhecer os nossos saberes”.

SÔNIA: Então, sim, a diversidade traz outras formas de pensar, de resolver problemas, aumenta as soluções dos problemas. Aumenta a diversidade, é fundamental e ela dá lucro. As empresas mais diversas conseguem ter melhor resultado econômico. Portanto, a diversidade de gênero, de cor de pele, a diversidade de, sabe, ter pessoas diferentes pensando nos problemas, só vai trazer mais soluções, sem sombra de dúvida.

SOBE SOM🎶  

BEATRIZ: Sônia segue na busca por novas soluções. Pelo afeto, pelo incentivo e pela briga, se for preciso. Ela chama as meninas para a briga também. Principalmente se ouvirem que não vão conseguir... lembra que ela disse, lá no começo, que as exatas têm dono? Para eles, esses donos já não podem falar o que querem, nem impedir as meninas de fazerem o que querem.

SÔNIA: Agora se quem tá te impedindo é um professor ou um superior ou quem tá te barrando essa vida é alguém que você tem que, tipo, obedecer, denuncie! Isso pode ser racismo ou pode ser machismo, denuncie para um órgão superior. Se calar para violência ou para atos que te deixam desconfortável, denuncie, faz uma BO, vai para delegacia, denuncie o desgraçado. Porque enquanto essa gente não parar de fazer isso, vai ficar sempre essa situação: a meninada tentando chegar em algum lugar, alguém dizendo que ela não vai conseguir, e a meninada desistindo. E o único resultado da desistência é o nada.

FRAN: A Sônia, apelidada por sua avó de xereta, não é de desistir. A mãe, que comprou uma enciclopédia pra menina de 4 anos, é sua grande inspiração. As duas, como a grande maioria da população, podem até não entender muito bem o que ela faz na física. Mas, meninas de todo o Brasil...

SÔNIA: Quando eu voltei da Inglaterra, eu voltei para essa minha avó que me chamava de xereta. “Vó, agora eu sou Doutora”. Ela toda contente, “hum, e você pode me dar receita para os meus remédios?” Falei “não, vó, eu sou doutora em física!” “Ah filhinha, esse doutorado não serve pra nada”, hahaha. Essa é minha avó. Até hoje minha mãe não entende bem o que eu faço, ela acha é fantástico, eu ganhei um prêmio e aí ela virou para o presidente do Centro de Integração Empresa Escola e falou assim: “aonde você achou minha filhinha”. Aonde você conhece a minha Soninha?” ahahaha.

BEATRIZ: Soninha é destaque na sua área. Pesquisadora, inventora e exemplo de persistência.

SOBE SOM 🎶  

FRAN: O podcast Ciência Mulheres Negras Dão Tom é uma produção original da Rádio Agência Nacional. Gostou do conteúdo? Acesse as nossas produções em áudio, como os podcasts Imprensa Negra, Dos Griôs da África para as Periferias do Mundo - 50 Anos do Hip Hop e Golpe de 1964 - Perdas e Danos.

BEATRIZ: A produção, entrevista, roteiro, apresentação, montagem e edição foram feitas a quatro mãos. Por mim, Beatriz Arcoverde e pela Fran de Paula. A sonorização foi feita por mim junto com Jaime Batista. Cibele Tenório gravou a vinheta. Gravação de áudio e entrevistas Jaime Batista.

A arte é de Caroline Ramos. Interpretação em libras da equipe de tradução da EBC.

SOBE SOM🎶  

Em breve
 

Apresentação, produção, entrevistas, roteiro, edição e montagem 

Beatriz Arcoverde e Fran de Paula
Sonorização Beatriz Arcoverde e Jaime Batista
Voz da vinheta Cibele Tenório
Arte   Caroline Ramos
Interpretação em Libras: Equipe EBC
Implementação na web:: Beatriz Arcoverde e Lincoln Araújo

 

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