Quem observa o pequeno João Lucas, de seis meses, tranquilo no colo de Andreia de Andrade nem imagina, mas ele e a jovem mãe de 24 anos percorrem mais de 180 quilômetros, três vezes por semana, em um transporte tipo lotação para chegar até o Recife, onde o bebê é acompanhado por causa da microcefalia. Eles são moradores de Belo Jardim, interior de Pernambuco. A cada viagem, Andreia paga R$ 100. Para ajudar nas contas a jovem tenta acessar o Benefício de Prestação Continuada (BPC), do governo federal, mas a espera para conseguir atendimento é de meses.
Sonora: “Eu fui, dei entrada, agendou um dia. Só que no dia que eu fui lá não tem perito para microcefalia. Eles disseram que tinha quer ter um especialista. Mas o caso é tão novo que eu acho que nem tem, mas assim, se a minha cidade não tem o perito devia me mandar para outro canto que tivesse. Mas eu estou aguardando, me deram um novo papel para ir no dia 4 de abril”.
O benefício daria à família de Andeira uma renda extra de R$ 880. Ele é concedido a pessoas com deficiência, de baixa renda, que tenham impedimentos físicos ou mentais de longo prazo. Para suportar meses sem o benefício a que tem direito, Andreia só conta com o salário-mínimo do marido, já que ela, que era vendedora, saiu do emprego para cuidar do filho. E nem o transporte da prefeitura ela conseguiu.
Sonora: “Fui lá para agendar, mas não consegui, o ônibus já estava lotado. E eu não posso perder as consultas e tenho que dar um jeito de trazer ele. Porque ficar sem atendimento a criança não pode. E se o benefício saísse me ajudaria muito na questão do transporte porque dificulta muito. E também no financeiro, porque aí tem remédio, vem o leite, fralda, aí quando a gente vai juntar o orçamento, passa”.
Ao saber do caso de Andreia, o superintendente do INSS no Nordeste, Rolnei Tosi, argumentou que vai pedir à agência do município informações sobre o motivo do reagendamento, já que, segundo ele, não existe a necessidade de contratação de um especialista em microcefalia.
Sonora: “Se já vem todo o laudo do hospital, com todos os documentos, que a pessoa está com microcefalia, ela é considerada uma deficiente e pode ser concedido o BPC. Então a gente vai procurar saber mais informações porque não tinha chegado nenhum caso que o médico tinha se recusado a atender”.
Ainda segundo o superintendente do INSS, um dos motivos para a demora da perícia é a quantidade alta de procedimentos que não foram realizados nos últimos meses por causa da greve dos médicos peritos, que durou mais de cinco meses e acabou no último dia 22 de fevereiro.
Sonora: “Por conta da greve realmente algumas agências chegam até a 90 dias, mas estamos dando prioridade a casos mais complexos. Eles estão atendendo três a quatro perícias a mais todo dia, e algumas gerências estão se propondo a fazer mutirão no fim de semana só para fazer perícia médica”.
Em Pernambuco, 30 pedidos para acessar o BPC já foram feitos por famílias que têm bebês com microcefalia: cinco no Recife, 15 na gerência de Caruaru, oito na de Garanhuns e três na de Petrolina. Apenas os cinco casos do Recife já passaram por perícia. Até a última sexta-feira nenhum deles já havia recebido a primeira parcela.
* O Benefício de Prestação Continuada é concedido a pessoas com deficiência de qualquer idade ou idosos de mais de 65 anos, desde que tenham impedimentos de longo prazo, de natureza física ou mental, e atendam ao critério da renda. A transferência mensal é de um salário-mínimo, e não é preciso ter contribuído com a Previdência Social.
Para acessar o BPC, é preciso passar por uma perícia médica da Previdência Social, que vai identificar se há deficiência e qual o grau de impedimento que ela impõe à pessoa avaliada. O início do processo é feito em uma agência do INSS. É possível agendar atendimento pelo telefone 135 (ligação gratuita) ou pela internet (previdenciasocial.gov.br).