Proclamação da República: participação popular foi baixa

Publicado em 15/11/2023 - 08:01 Por Carolina Pessoa - Repórter da Rádio Nacional - Rio de Janeiro

A participação popular no processo de proclamação da república foi muito baixa, em especial a dos negros.

É o que explicam especialistas e estudiosos no tema. Marcada pela forte presença militar e por um pensamento elitista, a República veio em 1989, um ano após a abolição da escravatura. Mas não trouxe para os espaços de poder as camadas negras e populares, que até hoje sofrem com a desigualdade e a exclusão social.  

Vantuil Pereira, historiador e professor do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas em Direitos Humanos da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a UFRJ, explica o que levou a essa exclusão 

“A concepção de república é uma concepção elitista né. É uma concepção elitista que vem dos setores militares, setores positivistas, setores que estavam influenciados pelo pensamento científico europeu do final do século 19, que ainda primava pela exclusão das parcelas pobres, quiçá dos negros, né? Porque na verdade nesse conceito de sociedade não caberia a mestiços negros ocuparem espaços de poder né, em que pese no Brasil tem essa contradição, né? Alguns mulatos, alguns mestiços, ocupassem esses espaços, mas não é um projeto de estado, uma democratização ampla, né?” 

A historiadora e professora do Instituto Federal do Rio de Janeiro, Camilla Fogaça, que também integra o Coletivo de Historiadores Negros Tereza de Benguela, ressalta que as mulheres negras tiveram uma participação ainda mais reduzida nesse processo.  

“Essa redução e invisibilidade aparece inclusive na falta de fontes historiográficas sobre o papel feminino. Então há uma hierarquia em figuras que aparecem em toda a proclamação da república onde a mulher negra praticamente não aparece né. Esses nomes femininos negros eles não estão visíveis. E a participação da mulher ela se dá basicamente no ambiente familiar, no ambiente às vezes até mesmo de comércio, aonde trocam informações, e trocam contestação, à figura, ou a posição que elas detém, diante do processo da escravidão ou o fim da escravidão, mas que não aparece claramente para elas o fim desta escravidão”. 

E após a proclamação, além da República não adotar medidas para compensar a população negra pelas violações cometidas durante a escravidão, ela oficializou a exclusão. Por exemplo, em artigos da Constituição de 1981, como explica Vantuil. 

“A exclusão ela se acentua né, se acentua. É bom lembrar que a Constituição que logo vai ser votada é uma Constituição que, por exemplo, limitava o direito de voto do analfabeto né. E é bom lembrar que quem é essa parcela maior de analfabetos, são ou os ex escravizados ou os libertos né”. 

De acordo com o professor da UFRJ essas discriminações, diretas e indiretas, persistem e provocam desigualdades até hoje. 

“Nós sabemos hoje que um número esmagador de pessoas presas, encarceradas no Brasil hoje, são pessoas negras. Então acho que o sistema de justiça tem que passar por uma transformação completa no sentido de não ser um sistema racista na sua forma de ver a punição, ver a sociedade. Quando se fala em favela, em favelado, em violência, em especial a ação do Estado sob esses territórios, os mais atingidos são pessoas negras. Então é preciso a gente ter um olhar muito claro do Estado, de ter políticas públicas para essas populações, políticas de habitação, saúde, moradia”. 

Tanto Vantuil Pereira quanto Camila Fogaça acreditam que a participação política que não foi permitida durante a proclamação pode ser a chave para mudanças estruturais no presente. 

“Nós temos aí o voto, a ampliação parlamentar e do número de candidatas voltadas para as mulheres, isso foi recentemente né, isso já aumenta a participação política, mas eu acho que uma maior fiscalização em relação aos partidos, como eles estão aplicando a lei voltada para a ampliação das mulheres em seus partidos”. 

Pereira também defende o aprofundamento das políticas públicas de democratização da educação e as políticas de incentivo à diversidade, dentro dos espaços de decisão política e nas empresas. 

Edição: Tâmara Freire / Alessandra Esteves

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