Familiares relatam ameaças após encontro dos corpos de jovens desaparecidos

Publicado em 11/11/2016 - 00:15 Por Elaine Patricia Cruz – Repórter da Agência Brasil - São Paulo

Familiares dos cinco jovens que foram encontrados mortos em Mogi das Cruzes no último domingo, após duas semanas de desaparecimento, vêm sofrendo ameaças de policiais desde que os corpos foram encontrados. A informação foi confirmada ontem (10) à reportagem da Agência Brasil por Ariel de Castro Alves, membro do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe).

“Os relatos que alguns familiares passaram é que o irmão de um dos jovens, de 18 anos, teria sido abordado por pessoas à paisana, no último domingo e teriam verificado o celular dele e visto a foto de uma das vítimas e teriam dito que ele poderia ter o mesmo destino”, disse. “Depois, na segunda-feira, o sobrinho de uma das vítimas, de apenas 13 anos, foi seguido por uma viatura da polícia e dois policiais teriam feito a abordagem e teriam verificado o celular dele. Sabiam que ele tinha parentesco com uma das vítimas e teriam feito ameaças”.

Para Alves, é possível que os policiais estivessem procurando “as mensagens de Whatsapp e dos áudios que teriam sido trocados na noite em que os jovens desaparecerem com parentes e amigos que residem lá no bairro”. O Condepe relatou essas denúncias de familiares à Secretaria de Segurança Pública. “É possível que esses jovens sejam ouvidos no Departamento de Homícidios e de Proteção à Pessoa (DHPP) tanto pela delegacia de chacinas, que está responsável por essa apuração, a partir de agora, quanto pela Delegacia de Proteção à Pessoa”, disse.

Investigação

Segundo Ariel, há várias linhas de investigação sobre o caso. Uma delas é de que os jovens teriam participado da tentativa de assalto a um policial militar, que foi baleado, meses atrás. Outra linha é de que um guarda municipal teria sido morto no mês de setembro e que familiares desse guarda acusavam um dos jovens pela morte. Uma outra possibilidade é de que dois jovens teriam participado de um assalto a um policial. “Mas ainda é prematuro termos uma conclusão. É claro que existem alguns indícios da atuação de grupos de extermínio e de agentes de assalto, mas investigações ainda são iniciais”.

Alves comentou também sobre a existência de um sítio, que foi descoberto pela Corregedoria, próximo ao local onde os corpos foram encontrados e que era frequentado por policiais. “Tivemos essa confirmação, no próprio DHPP, de que um sítio próximo ao local seria utilizado por alguns policiais militares e lá, em uma busca e apreensão da Corregedoria, teriam sido encontrados cartuchos de [calibre] ponto 40 e também cal. Curiosamente os corpos tinham sido enterrados junto com cal”, disse.

Mensagens

Cheila Olalla, que também é membro do Condepe, disse que as famílias relataram que vem recebendo ameaças desde antes que os corpos fossem encontrados, principalmente relacionados às pessoas que receberam mensagens dos jovens em áudio nos celulares: uma dessas mensagens, um dos jovens relata que eles estavam sendo abordados em uma blitz policial e outra mensagem, enviada a outro parente, diz que o carro deles estava quebrado.

Segundo Cheila, as famílias relataram que os jovens vinham sofrendo ameaças. “Tinha essa história de dizer que um dos meninos estava envolvido na morte de um policial e que [os ameaçadores] mandaram recado. Isso já tinha aparecido, era o comentário no bairro. Depois que eles desapareceram, deu uma esfriada porque eles [os ameaçadores] foram atrás da família, descobrir onde eles estavam. E recentemente, depois que descobriram [os corpos], veio essa conversa dizendo que haviam pessoas que falavam que policiais foram lá, andando, para saber do enterro, essas coisas”, disse.

Segundo Cheila, muitas histórias chegam à família, como, por exemplo, de uma pessoa que relatou ter visto quando uma viatura abordou os jovens e os colocou em uma van, mas as pessoas se negam a prestar depoimentos por medo. “Diante da gravidade da situação, as pessoas não querem dar a cara a tapa”, disse. “Nossa avaliação, do Conselho Estadual, em conversas com famílias e com pessoas do bairro, é de que existem indícios muito fortes de que há policiais envolvidos, mas ninguém tem certeza. Os indícios apontam para isso”.

IML

Segundo Alves, as famílias pretendem ir amanhã cedo ao Instituto Médico Legal (IML) para liberarem os corpos, que podem ser sepultados ou velados amanhã à tarde. “O que elas estão pedindo é que peritos [independentes do IML] possam acompanhá-las para conversar com equipes do IML. Na verdade, a equipe de peritos não seria para fazer o trabalho que já está sendo feito pelo IML. Eles só iriam para obter informações e participar de reuniões com a equipe. Não entendemos porque isso gerou tanto melindre e polêmica. Muitas famílias reclamaram de que não obtiveram os esclarecimentos necessários sobre a causa da morte e do laudo esclarecendo as mortes”, disse. A secretaria tem negado às famílias o acompanhamento desses peritos independentes.

Por meio de nota, a secretaria informou que a Superintendência da Polícia Técnico-Científica vem fazendo “tratativas com as famílias para a retirada dos quatro corpos já examinados e identificados” e que “o quinto corpo segue em processo de identificação”.

A secretaria também informou que a possibilidade de que peritos indicados pelas famílias acompanhem o caso “somente será analisada caso haja alguma alegação consistente, ao presidente do inquérito, com prova ou evidência de irregularidade ou suspeição em relação ao trabalho dos peritos oficiais”. Na noite de ontem foi identificado o quarto corpo, por meio de exame de arcada dentária de Jonathan Moreira Ferreira. O único ainda não identificado foi o do motorista, Jones Ferreira Januário, 30 anos, o que só deve ocorrer por meio de DNA.

A reportagem enviou email para a Secretaria de Segurança Pública questionando sobre as denúncias de que policiais estariam ameaçando familiares dos cinco jovens que foram encontrados mortos em Mogi das Cruzes, mas até a publicação desta matéria não houve resposta da secretaria.

O caso

Os cinco jovens estavam indo de carro para uma festa em um sítio em Ribeirão Pires, no Grande ABC, no dia 21 de outubro e desapareceram. A última notícia que os familiares receberam foi uma mensagem de um dos jovens no celular dizendo ter sido parado em uma blitz policial. Os corpos dos jovens foram encontrados somente no último domingo, em Mogi das Cruzes, já em estado avançado de decomposição.

Como há a suspeita de participação de policiais no desaparecimento dos jovens, a Corregedoria da Polícia está acompanhando o caso.

Ontem à noite, reportagem da TV Bandeirantes informou que um agente da Guarda Civil Metropolitana (GCM) foi preso por participação nas mortes dos cinco jovens, mas até este momento a informação não foi confirmada pela Secretaria de Segurança.

Edição: Fábio Massalli

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