Transgêneros no exterior podem mudar nome em consulados e embaixadas

Mudança será remetida ao Cartório de Registro Civil no Brasil

Publicado em 06/11/2023 - 15:30 Por Alana Gandra – Repórter da Agência Brasil - Rio de Janeiro

Brasileiros transgêneros que vivem no exterior já podem mudar nome e sexo diretamente nos consulados ou embaixadas dos países onde residem. Esse direito já era garantido aos brasileiros que residem no Brasil pelo Provimento 73 da Corregedoria Nacional de Justiça, de junho de 2022. A corregedoria é vinculada ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e disciplina os serviços cartorários em âmbito nacional no Brasil.

Pelo Provimento 73, qualquer pessoa com mais de 18 anos pode requerer ao cartório de registro civil de origem a adequação de sua certidão de nascimento ou casamento à identidade autopercebida, sem necessidade de ação judicial. “Isso já estava a pleno vapor no país”, disse nesta segunda-feira (6) à Agência Brasil a presidente da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado do Rio de Janeiro (Arpen/RJ), Alessandra Lapoente.

Destacou, porém, que os brasileiros que se acham fora do território nacional estavam ainda alijados desse direito até agora. “Então, em uma medida bem recente, através do Provimento 152, publicado em setembro deste ano, o CNJ passou a permitir que o procedimento extrajudicial de alteração de nome e sexo pudesse ser feito diretamente nos consulados, sem precisar da judicialização do feito. Assim como era feito pelo Provimento 73, para aqueles que estavam dentro do território nacional”.

Declaração

Alessandra esclareceu que o Provimento 152 viabiliza a mudança de nome ou gênero sem necessidade de comprovação ou qualquer exigência de laudo pericial ou exame. Basta a declaração do requerente.

“O cônsul terá que ter a mesma cautela que o registrador tem ao fazer a entrevista, para ter certeza que aquele é um ato de livre e espontânea vontade, um ato consciente de todas as repercussões jurídicas. Ele prevê, no próprio Provimento, algumas certidões que a pessoa interessada precisa apresentar. Caso o oficial tenha alguma dúvida eventual, ele a submete ao crivo judicial só para esclarecimento, mas, ainda assim, a pessoa tem direito de redesignação de nome e sexo”.

Os consulados enviam o procedimento para o Cartório de Registro Civil de nascimento do interessado no Brasil. Após a mudança de nome ou sexo, se a pessoa for casada poderá fazer modificações no registro subsequente. “Se a pessoa trans brasileira que reside no exterior vier a se casar, após ter feito a mudança de sexo e nome, ela fará outra averbação com base na decisão pretérita da alteração de redesignação no nascimento”.

Em cinco anos de permissão no Rio de Janeiro, a mudança de sexo cresceu 2.860% e já registra mais de 430 alterações em cartórios desde 2018, sem a necessidade de procedimento judicial nem comprovação de cirurgia de redesignação judicial, conhecida como transgenitalização.

A medida beneficia também estrangeiros que se naturalizaram brasileiros a realizarem o procedimento. Segundo dados da Coordenação-Geral de Política Migratória do Departamento de Migração, do Ministério da Justiça, nos últimos seis anos, 23.661 estrangeiros se naturalizaram brasileiros. Em 2023, já são mais de 5 mil pedidos, maior número desde 2019.

O valor cobrado depende de cada estado. No estado do Rio de Janeiro, o custo alcança em torno de R$ 500, englobando processo mais averbação. Depois, a pessoa tira uma segunda via atualizada. A presidente da Arpen-RJ reiterou que a competência para legislar sobre emolumentos é de cada estado.

Dignidade

Para o Corregedor Nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, a medida garante dignidade às pessoas transgêneros.

“A facilitação da alteração do nome e/ou sexo diretamente no cartório de registro civil daquele que possui nacionalidade brasileira, ainda que resida no exterior, através das unidades consulares, bem como dispensar totalmente o solicitante da apresentação de laudos médicos e psicológicos sobre a sua qualidade de transgênero, foram modernizações necessárias trazidas ao Provimento 73/2018 pelo Provimento 152/2023, cuja intenção é promover dignidade a esse público de forma mais efetiva e célere”.

Regulamentada em todo o país em 2018, após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), a mudança de sexo em cartório regulada pelo Provimento 73 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), passou a vigorar em junho do mesmo ano. Em seu primeiro ano de vigência, de junho de 2018 a maio de 2019, foram contabilizadas 1.916 alterações. No último ano, compreendido entre junho de 2022 a maio de 2023, foram registradas 3.819 mudanças de gênero, alta de 99,3%.

Cartilha

Para orientar os interessados em realizar a alteração, a Arpen-Brasil editou uma Cartilha Nacional sobre a Mudança de Nome e Gênero em Cartório, onde apresenta o passo a passo para o procedimento e os documentos exigidos pela norma nacional do CNJ. A publicação pode ser acessada aqui.

Para realizar o processo de alteração de gênero em nome nos Cartórios de Registro Civil é necessário a apresentação de todos os documentos pessoais, comprovante de endereço e as certidões dos distribuidores cíveis, criminais estaduais e federais do local de residência dos últimos cinco anos, bem como das certidões de execução criminal estadual e federal, dos Tabelionatos de Protesto e da Justiça do Trabalho. Na sequência, o oficial de registro deve realizar uma entrevista com a pessoa interessada.

Procurado pela Agência Brasil, o Ministério das Relações Exteriores (MRE), por meio de sua Divisão de Assessoria de Imprensa, confirmou que o Provimento 152, publicado pelo CNJ em 28 de setembro de 2023, em seu artigo 518-A, “reconhece expressamente a possibilidade de que a alteração de nome e de gênero de pessoa transgênero possa ser iniciada perante autoridade consular, tal como já era previsto nas normas do Regulamento Consular Brasileiro (RCB) desde dezembro”.

O MRE reforçou que, dessa forma, “tornou-se possível iniciar o processo de averbação de nome e de gênero em documentos brasileiros, para pessoas transgênero residentes no exterior, por meio da rede consular brasileira”.

Edição: Denise Griesinger

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