Escolas cívico-militares: divergências marcaram debates preparatórios
Ao longo das férias, durante as reuniões sobre a implementação das escolas cívico-militares, pais, professores e alunos participaram de debates acalorados. Houve dúvidas e baixa participação durante os encontros. Portaria que trata da implementação do modelo foi publicada no dia 31 de janeiro.
A maioria dos pais, mães e responsáveis ouvidos pela Agência Brasil apoia o projeto, pois acredita que reduzirá a violência e melhorará o desempenho dos estudantes. É o caso da dona de casa Rosa Lima Nogueira, 47 anos, moradora do Recanto das Emas, mãe de Mirelly, 12 anos. “Aqui é muito violento. Não sei se é porque os pais trabalham muito, não sei explicar, mas tem muita briga na frente das escolas da região. Às vezes, não temos condições financeiras para dar o melhor para nossos filhos. Já pensou, o melhor chegando aqui? Coisa de Deus”, disse a mãe.
Já parte dos docentes e dos estudantes acredita que o modelo é muito rígido e pode ser pouco efetivo no processo pedagógico. Para o professor de educação física Milton José da Silva, presidente do conselho escolar do CED 308 do Recanto das Emas, a presença da Polícia Militar nas escolas não resolve os problemas da comunidade que impactam no aprendizado dos jovens. “Essa comunidade precisa de emprego, precisa de renda para as famílias, precisa valorizar mais o trabalho das pessoas e não de disciplina dura. Temos muitos pais que vêm aqui para almoçar. Muitos alunos que vêm para almoçar porque não têm almoço em casa", afirmou o professor.
Recanto das Emas
Os processos de votação foram diferentes em cada uma das escolas. No CED 308 do Recanto das Emas, que fica a cerca de 30 km do centro de Brasília, uma primeira reunião com a comunidade foi feita no dia 29 de janeiro. Compareceram pais de ex-alunos, pais e responsáveis interessados em matricular os filhos futuramente na escola, pais e estudantes que estavam matriculados no centro de ensino, além de curiosos.
Durante a reunião, um abaixo-assinado passava entre os presentes, sem a conferência de quem tinha ligação com a escola. Segundo o diretor, Márcio Jesus Faria, foram recolhidas 1,4 mil assinaturas, que serviram de comprovação da aprovação do projeto.
A PMDF reuniu-se com os professores para apresentar detalhadamente o projeto no último dia 5. No dia 7, uma nova reunião foi convocada pelo conselho escolar que questionou a legitimidade do abaixo-assinado. Nela, foi feito um controle dos presentes e apenas a comunidade escolar, composta por pais, estudantes e professores, pôde votar. Dos 956 alunos, compareceram à votação 22 estudantes e quatro pais. A maioria votou contra a implantação do modelo. Para a direção da escola e a Secretaria de Educação, o quórum baixo não representa a comunidade.
“Talvez um dos maiores problemas que assolam a educação pública hoje seja a falta de disciplina. Com a falta de disciplina, o professor não consegue ensinar. Com o modelo de gestão compartilhada com a PM vamos conseguir uma disciplina maior e, com isso, o professor vai ser respeitado e conseguir ministrar as aulas com qualidade”, destacou Faria.
Professores reagiram à forma como o processo foi implementado. “A comunidade não foi consultada. A gente ficou sabendo dessa primeira reunião pelas redes sociais. A gente não foi convidada”, disse a professora de história Carina Mendes.
Estrutural
Na última terça-feira (5), foi feita uma reunião no CED 1 da Estrutural. Pais, professores e estudantes participaram. Mas houve queixas sobre a falta de divulgação em torno das discussões. Para os professores, é preciso investir em várias áreas que envolvem educação, e não na militarização.
Devido ao baixo quórum, a diretora da escola, Estela Accioly, disse que faria uma votação nominal, provavelmente, no dia 13, depois do início das aulas. Dias depois, ela voltou atrás e disse que as assinaturas recolhidas na reunião eram suficientes para implementar o novo modelo. “Percebemos que a comunidade está a favor”, disse a diretora.
Os pais eram minoria na reunião. A costureira Alcione Pereira dos Santos, 32 anos, mãe da Vitória, 9 anos, disse que não foi convocada para reunião e recebeu a informação do projeto por grupo de WhatsApp. Assim que soube da iniciativa, ela disse que foi ao colégio pedir esclarecimentos. Apesar da falta de informação inicial, ela afirma que é favorável ao modelo. “Acho que é um projeto ideal para a Estrutural. É um projeto que vai ajudar muito tanto os adolescentes, quanto as crianças, tinha que ter em todas as escolas”, afirmou a mãe.
Entre os professores, o clima era de dúvida. A professora de língua portuguesa, Sílvia de Oliveira Rocha, defendeu a necessidade de ações estruturais para melhoria da educação. “Há necessidade de investimento educacional. Com a militarização vai vir música, esporte, isso há de se ter em todas as escolas da rede. Além disso, são necessários outros profissionais, como orientadores, psicólogos. Toda estrutura para que se tenha índices melhores”, disse.
Sobradinho
No CED 3 de Sobradinho, a reunião para a votação também foi feita no dia 5, à noite. Ao todo, 556 votaram pela implementação do modelo e 29 foram contrários. A escola tem matriculados 1,7 mil estudantes. Puderam votar os pais, professores, funcionários da escola e estudantes maiores de 18 anos. “Eu estou acreditando muito no projeto. A gente tem dificuldade em relação a droga na escola, a agressão entre os alunos”, afirmou a diretora Andréia Martins da Silva.
Ceilândia
Outra reunião realizada no dia 5 foi a do CED 7 de Ceilândia, no ginásio da escola. O público – formado por pais, professores e estudantes – estava dividido. Por isso, houve duas votações.
Dos encontros acompanhados pela Agência Brasil, o do CED da Ceilândia foi o que teve a maior presença de estudantes, a maioria deles contrária à implantação do modelo. “Tem que investir mais em segurança. Para melhorar tem que ter projetos, esportes, coisas assim”, defendeu Robert Oliveira, 17 anos, estudante do 2º ano do ensino médio.
Na segunda votação, o projeto foi aprovado por 58,46% dos presentes. Puderam votar os alunos maiores de 18 anos, os pais ou responsáveis, sendo considerado um voto por família, professor e servidor.
Governo
Para o secretário de Educação do DF, Rafael Parente, as votações foram legítimas, e o projeto foi aprovado em todas as escolas em que foi apresentado.
"De acordo com a lei da gestão democrática, é preciso fazer assembleia nas escolas para que as comunidades escolares aprovem ou não a continuidade do projeto. Fizemos as assembleias nas quatro comunidades. Houve algum tumulto em dois lugares, mas, mesmo assim, fizemos as reuniões, e a maior parte da comunidade escolar, a maior parte dos professores aprovou a participação. A gente seguiu a lei", disse Parente.
Matéria alterada às 10h15 para acescentar a fala do secretário de Educação do DF, Rafael Parente.
Matéria alterada às 11h15 para acréscimo de informações.