Coluna – Taí o que você queria, porque é disso que o povo gosta
“Taí o que você queria, bola rolando no Maracanã”. Para mim é impossível esquecer essa narração, na voz incomparável de Januário de Oliveira. Anos 80, eu no gramado, ele e os bordões na cabine da TVE, hoje TV Brasil, ao lado do mestre Achilles Chirol, nas transmissões de jogos que eram reprisados em VTs, como se fossem ao vivo e inéditos, nos fins das noites de domingo.
“Eeeee o gol!” Eu me sentia como um jogador que acabara de marcar um gol. Estar ali era a realização de um sonho que só começou a ser construído já nos últimos períodos da Escola Técnica de Eletrônica, o CEFET, ali pertinho do Maracanã, e enquanto eu estudava para a prova do ITA, de São José dos Campos. Não foi fácil convencer a mãe dessa mudança de planos.
“É o primeiro carreto do jogo”. Quem me levou ao estádio pela primeira vez, aliás, foi a minha mãe, mas não lembro o jogo. De lá até 1984, quando estreei no microfone da TVE, na beira do campo, fui muitas outras vezes ao Maracanã. Só que a partir dali a ligação com o então “Maior do Mundo” mudou. E não tenho dúvida em afirmar que o estádio tem peso relevante na minha carreira, que não seria completa se não tivesse trabalhado lá.
“Sinistro, muito sinistro”. A gente olhava pros lados e via até cem mil pessoas em volta. Eu ficava no fosso, entre o banco de reservas e a geral. Ouvia desde pedidos do torcedor para passar alguma instrução para um dos técnicos, até xingamentos, como se nós, repórteres, tivéssemos culpa por um resultado adverso. Em dia de chuva, os choques elétricos eram normais. Mas nunca impediram alguém de trabalhar. Por sinal, tenho de dizer que poucos estádios davam tanta condição de trabalho quanto o bom Maracanã.
“Tá lá o corpo estendido no chão.” Quem nunca tropeçou naquele monte de fios que invadiam o gramado, fosse no intervalo ou no fim dos jogos? Em dia de volta olímpica, nem se fala. O pessoal das rádios tinha a vantagem do microfone sem fio. Posso dizer, agora, que era uma covardia, com quem ficava preso no cabo, como eu. Mas não dá pra reclamar. Nos anos 80 vi, lá de dentro do campo, títulos dos quatro grandes do Rio e entrevistei os maiores ídolos. Como contar essas histórias, se não fosse o Maracanã?
“Cruel, muito cruel.” Não fui favorável à obra que transformou o estádio em uma arena. O saudoso amigo Alberto Léo tinha uma frase perfeita: “antes a gente via pela TV e sabia que era o Maracanã, agora todos os estádios são iguais”. Sei que hoje a segurança e o conforto entram nos requisitos de um estádio de futebol, e que o novo Maraca ganhou com a reforma. Mas e a alma, que a gente sabia existir por lá? E os 100 mil torcedores que não cabem mais no estádio? E o direito de assistir ao jogo de pé?
“É disso que o povo gosta”. Não há quem more, ou tenha morado, no Rio de Janeiro que não tenha uma história para contar envolvendo o “Maior do Mundo”. Gostando ou não de futebol. Por isso não tenho dúvidas em afirmar que todos nós, que ao menos um dia estivemos no estádio, temos de agradecer por essa oportunidade. Aos 70 anos, o Maracanã, na verdade, é o nosso presente.
Parabéns, Maraca. Mas, além disso, muito obrigado.