Deficientes visuais vão aos jogos torcer pela Bélgica
Eles não podem ver as imagens bem definidas dos jogadores em campo, mas fizeram uma viagem de mais de dez horas para acompanhar a Copa do Mundo. Quatro belgas deficientes visuais desembarcaram no Brasil para ir aos jogos do time de seu país, com apoio da organização não governamental Acesso a todos os Serviços (em tradução livre). Para concretizar o sonho, vieram com três acompanhantes e um narrador especializado.
É a primeira vez que a ONG compartilha uma Copa com um grupo de deficientes. “Todo mundo na Bélgica sonha em vir para o Brasil, porque temos um novo time, uma geração mais jovem de jogadores e muita motivação. Obviamente, os torcedores belgas cegos também queriam vir”, explicou Alban Henrickx, documentarista que acompanha o grupo.
Os torcedores cegos ou com baixa visão foram escolhidos entre os frequentadores de estádios naquele país. Lá, há dois anos, a organização reúne as pessoas com deficiência visual, uma vez por semana, nos campeonatos locais. Com suporte da narração audiodescritiva, é possível criar imagens das partidas e da atmosfera, explica o deficiente Augustin Hazard, de 24 anos.
“Os sentimentos não estão relacionados apenas ao que você vê, mas também ao que você ouve. Tanto a narração especializada, quanto os torcedores a sua volta, os sons do estádio, tudo isso importa. Quando estamos cantando juntos, torcendo, é fantástico”, revelou ele.
Idealizador da iniciativa e coordenador do ONG, Jean Marc Streel explica que costuma fazer a audiodescrição do mesmo local onde ficam os jornalistas. Os deficientes captam a transmissão em pequenos rádios. Porém, no Brasil, a Federação Internacional de Futebol (Fifa) não permitiu acesso ao centro de mídia e o coordenador faz seu trabalho, em francês, da própria arquibancada. Apesar de a Fifa oferecer narração especializada para pessoas cegas, o serviço está disponível somente em português em quatro dos 12 estádios.
A narração é fundamental para que os cegos acompanhem as partidas ao máximo. A belga Joannie Beaufys, de 30 anos, disse que consegue seguir os passes de bola e até fazer fotos. Torcedora do Royal Standard, da cidade de Liège, ela tem suas fotografias publicadas no site do clube. “Com a audiodescrição, Joannie consegue dar o zoom da câmera no campo e usar o recurso como uma televisão. Vê o jogo e faz fotos incríveis”, contou Henrickx.
Parte do grupo de deficientes visuais belgas assistiu a primeira partida de sua seleção em Belo Horizonte, na terça-feira (17), depois de driblar o atraso em um dos voos - problema que acabou retendo parte deles em São Paulo . Laurent Victoor, de 37 anos, que perdeu a visão aos 13 anos, chegou a três minutos do início da partida contra a Argélia. Disse que o jogo, que a Bélgica ganhou de virada, valeu a pena. “Ficamos com os torcedores belgas, ingleses e brasileiros. Era uma atmosfera tranquila, as pessoas foram muito simpáticas conosco”.
O grupo viaja na companhia de documentaristas da ONG Um mundo de Futebol (tradução livre) e ficam no Brasil até o fim da primeira fase da Copa. O último jogo dos Diabos Vermelhos, como a seleção belga é conhecida, será quinta-feira (26), em São Paulo.