Israel deu "passo em falso" ao indicar embaixador, diz assessor da presidência
O assessor especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, disse hoje (19) que Israel deu um “passo em falso” ao indicar o diplomata Dani Dayan para o cargo de embaixador no Brasil. A indicação causou polêmica pelo fato de Dayan ser morador da Cisjordânia, território palestino ocupado por Israel desde 1967, e ser contrário à criação de um Estado Palestino.
O Brasil é formalmente contra as ocupações judaicas em territórios palestinos. Segundo Garcia, Israel não respeitou a convenção diplomática de mandar as credenciais do candidato a embaixador para que o país anfitrião analise antes de conceder o agrément, autorização para que um nome proposto por um país possa chefiar a missão diplomática em outro. É praxe na diplomacia que, antes de um país solicitar o agrément, o currículo da pessoa indicada seja analisado para evitar constrangimentos futuros.
“Eu acho que foi um passo em falso dado pelo governo de Israel. Em primeiro lugar, ao romper uma regra diplomática que não é uma frivolidade, é um procedimento que corresponde à gravidade que as relações internacionais têm: isto é, antes de pedir o agrément ao embaixador, noticiar publicamente”, disse Garcia em entrevista ao programa Espaço Público, da TV Brasil.
Para Garcia, a política externa israelense está sendo influenciada por componentes ideológicos que estão dificultando a formulação de relações internacionais mais respeitosas. “O caso era que ele [Dayan] tem condições muito marcadas em dois temas caríssimos para a politica externa brasileira e para a política internacional, que são os assentamentos [judeus em territórios palestinos], condenados pela imensa maioria dos países das Nações Unidas e inclusive por nós, e o fato de que ele se opõe a formação de um Estado Palestino”, completou.
Erro diplomático
Segundo o assessor da Presidência, a indicação de Dayan veio na esteira das ações do Exército Israelense nos territórios ocupados da Palestina e do episódio em que, após o Brasil protestar contra presença das forças israelenses na Cisjordânia, um funcionário da diplomacia de Israel ter chamado o país de “anão diplomático”.
“Naquela ocasião houve uma reação desproporcionada e grosseira de um funcionário de terceira ou quarta categoria que disse que o Brasil era um país irrelevante, um anão diplomático. A ação foi tão desastrosa que o presidente de Israel teve que ligar depois para a presidenta Dilma [Rousseff] para se desculpar”, lembrou.
Um dos formuladores da política externa brasileira desde o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando assumiu a chefia da Assessoria Especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais, Garcia negou que o episódio tenha desencadeado uma “queda de braço” com Israel.
“Não há uma queda de braço com um país amigo como Israel, com o qual a politica externa brasileira tem grandes vínculos antes mesmo do surgimento do Estado de Israel”.
Desde o final dezembro, quando o então embaixador israelense Reda Mansour deixou Brasília, o país está sem chefe da diplomacia no Brasil. Na semana passada, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, reafirmou que Dayan é o indicado para o cargo.
A indicação de Dayan também foi criticada pelo corpo diplomático brasileiro. No início do mês, um manifesto assinado por 40 embaixadores criticou a forma como Netanyahu conduziu a indicação do novo embaixador no Brasil. Para os diplomatas, foi “inaceitável” que o nome dele tenha sido anunciado publicamente antes de ser submetido ao governo brasileiro.
Crise e América Latina
Durante o programa, Garcia também comentou a situação da América Latina que, segundo ele, tem sofrido com a crise econômica mundial desde 2008, o que tem afetado a estabilidade política da região. Depois de 2010, segundo ele, a “marolinha” - expressão usada por Lula para definir a crise – ganhou volume e se transformou em uma onda mais forte.
“Se até 20120, 2011, os países emergentes, entre eles os da América do Sul, eram motores do crescimento mundial, porque os países desenvolvidos passaram a perder seu peso, a partir desse efeito retardado da crise mundial aqui, nós passamos a ter efetivamente uma diminuição do impacto das nossas economias”, avaliou.
Ao tratar da crise política na Venezuela, Garcia disse que o Brasil tem tido uma postura ativa na defesa de uma saída democrática para o impasse no país vizinho, aprofundado pelas dificuldades econômicas. “Hoje, o problema da democracia na Venezuela está nas mãos de dois atores: governo e oposição. Os dois têm que se entender no sentido de saber preservar as instituições para que esta crise possa ter uma boa solução”.
Garcia disse que o Brasil vai seguir defendendo a manutenção da institucionalidade no caso venezuelano. “Se houver uma solução fora da Constituição será uma tragédia, inicialmente para o povo venezuelano, e, em segundo lugar, para o Brasil, que tem fronteira e interesses econômicos na Venezuela, em terceiro lugar será algo desastroso para o Mercosul e Unasul [União de Nações Sul-Americanas]”, disse.