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Família denuncia superlotação de hospital após internação na Cracolândia

Daniel Mello - Repórter da Agência Brasil
Publicado em 30/05/2017 - 16:34
São Paulo

A família da usuária de drogas Letícia Junqueira, de 33 anos, internada no pronto-socorro psiquiátrico do Hospital Santa Marcelina, no Itaim Paulista, zona leste paulistana, buscava hoje (30) um espaço com melhores condições para ela. Segundo a mãe, Roseli Faleiros, de 51 anos, Letícia está dormindo em uma maca no chão do hospital desde sábado (27), por causa da superlotação.

Letícia procurou junto com a família o Centro de Apoio Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD) na Rua Helvetia, no final da tarde do último sábado. A unidade foi inaugurada emergencialmente na sexta-feira (26) em um contêiner na área onde ficava o chamado fluxo da Cracolândia, concentração de usuários de drogas na Luz, região central da capital paulista. Após a operação policial feita na semana passada, a maior parte das pessoas que ocupavam o local se deslocou para a Praça Princesa Isabel, a menos de 500 do ponto original.

São Paulo - Usuários de drogas se concentram na Praça Princesa Isabel, após ações de desocupação da Cracolândia (Rovena Rosa/Agência Brasil)

Usuários de drogas se concentram na Praça Princesa Isabel, após ações de desocupação da CracolândiaRovena Rosa/Agência Brasil

Os psiquiatras de plantão no contêiner encaminharam Letícia para o hospital. Segundo a mãe da dependente química, durante a conversa, profissionais do local garantiram que Letícia seria levada a uma clínica com quarto individual. “Eles enganaram a gente”, protestou Roseli ao voltar ao Caps para procurar orientação.

No hospital, Roseli criticou a superlotação, com macas no chão, além da falta de higiene. “Não tive coragem de usar o banheiro.” Segundo ela, não havia água quente para banho na instituição.

Com problemas com o uso abusivo de drogas desde a adolescência, Letícia passou, segundo a mãe, por diversas internações, a primeira quando tinha 19 anos. “A gente enganou ela, levou como se fosse para um passeio”, relata Roseli sobre como a filha foi colocada contra a vontade em uma instituição pela primeira vez.

Ao longo dos anos, Letícia passou por outras desintoxicações voluntariamente. “Quando ela sentia que estava muito ruim, ela ia para lá, ficava 30 dias e melhorava”, lembrou a mãe.

Alternativas à internação

Segundo a psicóloga e militante da Frente Antimanicomial Marília Fernandez, há outras formas de desintoxicação além da internação. Alguns Caps oferecem, de acordo com a especialista, o chamado acolhimento integral, quando o paciente permanece na instituição, mas pode sair quando quiser. “Para desintoxicar, passar um período de crise. Evita que o sujeito vá para a internação em hospital geral”, explica.

Na avaliação de Marília, a conduta no caso de Letícia parece ter sido correto, com o encaminhamento dela a um pronto-socorro especializado. No entanto, os serviços de saúde sofrem, de acordo com ela, uma precarização sistemática. “Estamos passando por um problema muito grave de saúde. Foram congeladas as verbas do SUS [Sistema Único de Saúde] e o governo de São Paulo não financia a rede de atendimento psicossocial”, criticou a ativista ao relacionar os problemas de atendimento à falta de recursos.

A prefeitura de São Paulo informou que desde o último dia 21, quando foi realizada a megaoperação policial na Cracolândia, foram feitas 4,5 mil abordagens a usuários e quase 3 mil encaminhamentos para a rede de assistência. O balanço da administração municipal contabiliza ainda 76 internações voluntárias.

Transferência

Em resposta às reclamações da família sobre as condições de internação, a Secretaria Municipal de Saúde informou que Letícia foi encaminhada hoje para o Centro de Referência de Álcool, Tabaco e Outras Drogas, um serviço especializado. De acordo com o órgão, apesar dos atendimentos serem feitos pela prefeitura, os dois serviços, do hospital e do centro, são administrados pelo governo estadual.

No começo da noite, a Secretaria de Saúde do estado também respondeu às criticas, confirmou a transferência de Letícia e disse que a denúncia da família da paciente sobre o hospital não procede. “A paciente Letícia Faleiro estava internada numa maca que foi rebaixada até a altura mínima, próxima do solo, conforme determinam os protocolos de atendimento para pacientes com esse tipo de quadro. Portanto, não se trata de 'um colchão no chão'”, diz nota enviada à Agência Brasil.

O procedimento, segundo o órgão estadual, evita que pacientes nessa condição caiam da maca e se machuquem. “A paciente recebeu todo o atendimento necessário, foi alimentada, medicada, tomou banho e ficou em observação”, acrescenta a secretaria, que informou também que a família não protocolou nenhuma reclamação nos serviços de atendimento ao usuário do hospital.

Texto atualizado às 16h40 e às 18h24 para inclusão dos posicionamentos das secretarias municipal e estadual de Saúde