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Governo, sociedade civil e empresas apontam rumos para governança climática

Helena Martins - Repórter da Agência Brasil
Publicado em 31/10/2017 - 20:07
Brasília
Brasília - Representantes do governo, da sociedade civil e de empresas discutem modelo de governança climática para o Brasil(Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Participantes  de  workshop  em  Brasília  defendem  revisão  do  modelo atual e definição de estrutura de liderança capaz de coordenar iniciativas e incidir no conjunto de políticas públicasFabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

A três anos do prazo prevista para o Acordo de Paris, fruto da Conferência Mundial do Clima (COP21) sobre a redução das emissões de gases de efeito estufa, substituir o atual Protocolo de Quioto, governos em todo o mundo debatem a necessidade de estabelecer um modelo de governança da política climática que leve à efetivação das metas fixadas para evitar um aquecimento intenso do planeta que supere 2º.

Para tanto, representantes de diversos ministérios, de organizações da sociedade civil e empresas participaram, nesta terça-feira (31), em Brasília, do workshop Caminhos e Oportunidades para Assegurar uma Efetiva Governança Climática do Brasil. O evento ocorre dias antes da COP23, a conferência do clima das Nações Unidas (ONU), que começa no dia 6 de novembro.

“O objetivo do que deve ser uma nova governança é olhar para que futuro queremos com essa política”, resumiu o coordenador de Planejamento e Desenvolvimento Econômico do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Gustavo Fontenele. “É um desafio de país, de sociedade, muito mais que um desafio de governo”, destacou.

Hoje, o modelo de governança das políticas de clima do Brasil compreende centralmente o Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima; o Grupo Executivo sobre Mudança do Clima; a Comissão Interministerial sobre Mudança Global do Clima e o Fórum Brasileiro de Mudança do Clima. Os dois primeiros estão inativos e o fórum foi reativado recentemente por meio de decreto governamental. Outras comissões e grupos das várias esferas governamentais compõem essa arquitetura.

De acordo com os participantes do encontro, é preciso rever essa arquitetura, definir uma estrutura de liderança capaz de coordenar as iniciativas e incidir no conjunto das políticas públicas. O auditor federal de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (TCU), Rodrigo Araújo Vieira, destacou que, “quanto mais transversal o problema, maior a responsabilidade de o governo atuar, coordenar e chamar os atores à mesa”. Representante do Ministério da Fazenda no seminário, o coordenador-geral de Meio Ambiente e Mudanças Climáticas do órgão reconhece que é preciso “um novo tipo de política, abordagem e engajamento”. Ele explicou que, ao definir as ações que o Brasil adotaria com vistas à meta, cada órgão colocou à mesa aquilo que se dispunha a efetivar. Alguns avançaram e outros não, disse ele, lembrando que a centralidade do problema do aquecimento exige ir além do olhar setorial.

Para dar conta desse desafio, o secretário de Mudanças do Clima e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, Everton Lucero, destacou a necessidade de se incorporar às diversas políticas governamentais “a lente climática, seja do ponto de vista de adaptação ou redução de emissões de carbono”; “dar voz aos povos indígenas e povos tradicionais", que muito têm a ensinar "sobre como lidar com os territórios, com a natureza e com a água” e mobilizar a sociedade para que essa agenda seja promovida e defendida.

“Hoje em dia, o que se tenta discutir é que, sem o envolvimento claro e efetivo de todo os atores da sociedade, não conseguiremos implementar as ações de que precisamos”, disse o coordenador do Programa de Mudanças Climáticas da WWF-Brasil, André Nahur. Embora a transformação do clima atenda a uma dinâmica fortemente global, ele defende a necessidade de articulações internacionais e supranacionais. No caso do Brasil, Nahur disse que é possível implementar cenários de descarbonização envolvendo todos os setores, inclusive a iniciativa privada.

Desafio

O tema da governança climática está alinhado com o principal desafio da COP23, que é avançar na elaboração do livro de regras para implementação do Acordo de Paris, que, segundo as Nações Unidas, está em risco. Hoje, a organização lançou a oitava edição do Relatório da ONU Meio Ambiente sobre a lacuna das emissões, intitulada Emissions Gap Report. De acordo com o estudo, mesmo se fossem cumpridos todos os compromissos assumidos, isso representaria apenas um terço do que é necessário alcançar até 2030 para que os piores impactos das mudanças climáticas sejam evitados.

O fato de os 195 governos que subscreveram o pacto terem, em geral, proposto medidas ainda insuficientes para evitar o aquecimento do planeta nos termos de Paris indica que ainda é um desafio a internalização da problemática das mudanças climáticas como base para as decisões governamentais. Isso implicaria, segundo os participantes do seminário, orientar o setor de infraestrutura, agropecuário e outros a partir de tal premissa.

Para apoiar os países no cumprimento de seus compromissos de adaptação e mitigação e promover mais transparência, a organização WRI tem testado e avaliado a efetividade de medidas de governança com uma ferramenta desenvolvida pela Open Climate Network (OCN). “Nossa preocupação ao trazer o tema da governança climática é ir além da mensuração do impacto do efeito estufa”, explica Juliana Speranza, que cita a necessidade de avaliar também os processos de implementação das políticas relacionadas às mudanças climáticas de forma geral.

Na aplicação da ferramenta no Brasil, a organização analisou a governança da Contribuição Nacional Determinada (iNDC, na sigla em inglês) ao Acordo de Paris, instrumento de ratificação das medidas que o país pretende desenvolver para colaborar na busca das metas pretendidas pelo conjunto dos signatários. Foram constatados, então, alguns problemas, como a ausência do sistema de monitoramento e avaliação dos resultados da política climática; a fragmentação das políticas em diversos grupos temáticos e a garantia de montante “marginal” de recursos para os instrumentos como financiamento climático, como o Fundo Clima e o Programa de Crédito para Agricultura de Baixo Carbono.

Risco de desarticulação

Representantes do governo federal reconheceram, no seminário, que há um arranjo institucional, mas que há riscos de desarticulação, dificuldade de transformar a agenda do clima em uma agenda de desenvolvimento econômico, necessidade de integração das agendas do clima e de infraestrutura, que o atraso na tomada de decisão pode aumentar os custos da transição para uma economia de baixa emissão de carbono e questionável transparência na elaboração dos NDCs A avaliação foi apresentada pela subchefe adjunta de Análise e Acompanhamento de Políticas Governamentais da Casa Civil, Fabiana Martins.

Fabiana defendeu maior visibilidade e prioridade para a política de clima. Como possibilidades para isso e para o desenvolvimento de uma governança, ela citou a solicitação brasileira de adesão à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), o que inclui atender recomendações e diretrizes que sinalizam boas práticas internacionais. De acordo com Fabiana, um terço das recomendações trata de questões ambientais.

Além disso, está em curso a revisão da política de governança pública. Na proposta, constam tarefas como o planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado, que tem como diretrizes o respeito aos acordos e compromissos internacionais ratificados pelo Brasil, como o Acordo de Paris e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS); a adoção de mecanismos de participação social e maior transparência das ações governamentais. A política deve ser encaminhada ao Congresso nas próximas semanas.