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Pesquisa encontra agrotóxico em 60% dos alimentos em São Paulo e Brasília

Camila Boehm – Repórter da Agência Brasil
Publicado em 31/10/2017 - 21:39
São Paulo

Testes toxicológicos realizados pelo Laboratório de Resíduos de Pesticidas (LRP) do Instituto Biológico de São Paulo, a pedido da organização não governamental Greenpeace, mostraram que 60% dos alimentos que a população de São Paulo e Brasília come diariamente contém resíduos de agrotóxicos. Em 36% das amostras, havia ainda alguma irregularidade, como presença de agrotóxicos banidos do país e de quantidade acima do limite máximo de resíduos permitido no Brasil.

Os alimentos foram comprados principalmente de empresas na Central de Abastecimento  (Ceasa) do Distrito Federal; na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), em São Paulo; e na zona cerealista da capital paulista. No total, 113 quilos de alimentos foram analisados, divididos em 50 amostras. Os alimentos testados foram mamão formosa, tomate, couve, pimentão verde, laranja-pera, banana-prata, banana-nanica, café, arroz integral, arroz branco, feijão-preto e feijão-carioca.

“Os agrotóxicos podem causar sérios problemas de saúde. Vários estudos associam estes pesticidas com problemas como desregulação hormonal, malformação, distúrbios nos sistemas nervoso, reprodutivo e imunológico, e até o câncer. Estamos expostos a essas substâncias diariamente pelos alimentos”, disse Marina Lacôrte, especialista do Greenpeace em agricultura e alimentação.

Em diversos alimentos testados, encontrou-se mais de um resíduo de agrotóxico. A mistura de substâncias químicas no mesmo alimento pode causar o que é conhecido como efeito coquetel, cujos efeitos no corpo não são conhecidos e podem ser diferentes dos efeitos causados pelas substâncias isoladas, alertou o Greenpeace.

“Comer todos os dias, mais de uma vez por dia, algum desses alimentos que apresentaram mais de um tipo de resíduo de agrotóxicos, isso é realmente muito preocupando. Alimentar-se no Brasil hoje é uma verdadeira loteria, só que ninguém quer ganhar porque os prêmios são esses: problemas de saúde e diversos impactos ambientais”, disse.

Segundo Marina, os resultados refletem um cenário ruim de fiscalização no campo. “Essas irregularidades que apresentamos mostram que o cenário é muito ruim em termos de controle e fiscalização. Significa que boa parte das práticas que eram para ser cumpridas no campo não estão sendo cumpridas”. Em sua avaliação, este cenário pode piorar caso um conjunto de projetos de lei que tramitam na Câmara dos Deputados seja aprovado, e que inclui o PL 6.299/2002, de autoria do atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi, além de outros projetos de parlamentares da chamada bancada ruralista.

“Se esse pacote for aprovado, vão transformar o país em um mar de veneno. O pacote do veneno é, que já está tramitando na Câmara, vai causar um verdadeiro desmonte da lei atual de agrotóxicos. Ele muda uma série de regras, causa uma série de retrocessos nessa lei. Um deles é que ele pretende mudar o nome de agrotóxicos para defensivos fitossanitários, o que é bastante grave, porque isso mascara a nocividade dessas substâncias”, avaliou. Além disso, o pacote de projetos prevê retirar o Ministério do Meio Ambiente e a Anvisa do processo final de aprovação dos agrotóxicos.

“Ele [o pacote] pode permitir que substâncias cancerígenas venham a ser aprovadas. Hoje em dia, a lei traz uma série de aspectos proibitivos. Um deles é se a substância se apresentar potencialmente cancerígena. Se ela tiver essa característica, ela nem passa para frente para continuar sendo avaliada, aprovada e registrada. Esse projeto de lei pode mudar isso”, disse. Marina explicou que o chamado “pacote do veneno” dará abertura para que tais substâncias sejam aprovadas.

A proposta do Greenpeace é que a população pressione para que a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos, que também é um projeto de lei e já está na Câmara, seja aprovada. É preciso que seja instalada uma comissão especial para analisar a matéria, mas, de acordo com Marina, existe uma pressão de deputados para que a comissão não se instale. “O que mostra que estamos muito na contramão, porque não só a gente não está começando a pensar no caminho de reduzir essas substâncias, ter uma agricultura menos impactante, mais regenerativa, que produza comida saudável para todo mundo, como estamos indo pelo caminho totalmente oposto, que é o de liberar substâncias mais perigosas”, disse a especialista.

O Ministério da Agricultura, sob o comando de Blairo Maggi, foi procurado, mas não retornou até a publicação da reportagem.