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No Rio, moradores de Barra Mansa temem criação de aterro para resíduos tóxicos

Léo Rodrigues - Repórter da Agência Brasil
Publicado em 16/01/2018 - 14:32
Rio de Janeiro

A criação de novo aterro sanitário em Barra Mansa, no Rio de Janeiro, no sul do estado, está gerando descontentamento entre moradores e organizações ambientais da região. O projeto envolve a construção de uma unidade de tratamento de resíduo industrial, para a qual seriam destinados tintas e óleos, telhas de amianto, solos contaminados, latas e outras embalagens de produtos químicos, os chamados resíduos classe 1.

A principal preocupação é com a toxidade dos resíduos. Moradores querem que o Instituto Estadual do Meio Ambiente (Inea), órgão vinculado ao governo do Rio de Janeiro, responsável pela análise e aprovação do projeto, agende uma nova audiência pública, já que a última teve pouca participação dos interessados, por ter sido divulgada no período de festas natalinas. A audiência é obrigatória no processo de tramitação do pedido de licenciamento ambiental.

“Ao ser questionada, na primeira audiência, sobre o transporte do material, a empresa Foxx Haztec, responsável pela execução do projeto, respondeu que a responsabilidade será da transportadora e, com isso, vemos que há possibilidade de ocorrer um acidentes e o material se espalhar na estrada, nas áreas onde ficam as casas”, disse Adriana de Vasconcellos, coordenadora da Comissão Ambiental Sul-RJ, organização não-governamental criada em 2009.

O local de instalação do aterro é próximo ao encontro dos rios Bocaina e Carioca, que desaguam no rio Bananal, um dos principais afluentes do Rio Paraíba do Sul. “Não somos contra o aterro, mas temos preocupações em função do histórico da empresa”, disse José Arimathéa Oliveira, presidente do Comitê Médio Paraíba do Sul, que participou de reunião, na sexta-feira (12), com moradores e organizações ambientais. Oliveira disse que vê o empreendimento com receio.

A construção da nova unidade de tratamento está em fase de licenciamento prévio. O projeto apresentado ao Inea prevê um aterro com capacidade para receber até 300 toneladas de resíduos por dia, embora a previsão seja de 100 toneladas diárias. A unidade teria vida útil de aproximadamente 15 anos.

O instituto informou que o processo segue os ritos processuais e prazos estabelecidos pela lei e que, por isso, a audiência pública foi realizada no dia 18 de dezembro do ano passado. A possibilidade de nova audiência pública está sendo avaliada.

Em nota, a Foxx Haztec afirma que fez estudos de viabilidade e de impacto social e ambiental, como determina a legislação. A empresa defende a necessidade do empreendimento. “Apesar de ter um dos maiores polos industriais do Brasil, situado na região de Barra Mansa, o estado do Rio de Janeiro não possui nenhum aterro sanitário destinado a resíduos provenientes desse mercado.”

Segundo a empresa, serão gerados 50 postos de trabalho diretos no município, que também se beneficiará com a arrecadação de impostos e o pagamento da outorga sobre o faturamento do aterro. “Não há risco de contaminação do solo, pois na construção do aterro serão instaladas camadas mantas impermeabilizantes e sistema de drenagem. Desta forma, o resíduo não terá nenhum contato com o solo”, acrescentou.

Em Barra Mansa, a Foxx Haztec opera, desde 2012, um aterro de resíduos classe 2, destinado a lixo domiciliar. Para o novo empreendimento, a empresa adquiriu um terreno de 78 mil m² na Rodovia Engenheiro Alexandre Drable (RJ-157), no bairro Cotiara. Em outros municípios brasileiros, a empresa gere mais oito unidades de tratamento de resíduos, duas delas voltadas para resíduos de classe 1.

Arrecadação municipal

A Comissão Ambiental Sul-RJ informou que, de acordo com dados  repassados, a prefeitura de Barra Mansa receberia R$ 200 mil mensais pelo empreendimento. A entidade avalia que esse montante seria insuficiente para obras de manutenção das estradas por onde passarão os caminhões transportando as 100 toneladas diárias de resíduos.

Questionado pela Agência Brasil, o município negou o valor e informou que, caso o aterro se concretize, seriam arrecadados recursos oriundos do Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza (ISS), correspondente a 5% das receitas da empresa, além de um percentual de royalties sobre o faturamento. “O município ainda está estudando quais compensações seriam feitas, além das ambientais e estruturais das vias de acesso ao complexo.”

A prefeitura disse que a responsabilidade pelo licenciamento é do Inea e da Comissão Estadual de Controle Ambiental (Ceca) e que cabe ao município o acompanhamento, podendo até criar restrições e impedir a instalação usando mecanismos da legislação municipal caso entenda haver prejuízo ao ambiente da cidade.

Ainda de acordo com a nota, o prefeito solicitou, na semana passada, a paralisação do processo até que sejam avaliados questionamentos relacionados com o aterro de lixo domiciliar da Foxx Haztec, já em funcionamento.

“Segundo o prefeito, o Inea não deve avançar com qualquer novo licenciamento enquanto existirem pendências do anterior, como por exemplo a estação de tratamento de chorume, cobertura florestal, recuperação da área do antigo lixão e recuperação das estradas municipais de acesso ao centro de tratamento”, diz a nota.

Legislação rígida

De acordo com Gandhi Giordano, pesquisador de engenharia sanitária e ambiental da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), há hoje legislação rígida que trata do manejo, controle e segurança em aterros de classe 1. Isso se dá porque os resíduos a eles destinados têm propriedades físico-químicas e infectocontagiosas que podem apresentar perigo à saúde pública e ao meio ambiente. Daí, a exigência de mais atenção por parte dos geradores, já que acidentes mais graves e de maior impacto ambiental são causados por esta classe de resíduos.

“A legislação vigente atende. Se ela for seguida, o risco é minimizado”, disse o pesquisador. Ele menciona a obrigatoriedade de constar no projeto a garantia de tratamento do chorume, os riscos de poluição do ar, o atendimento a normas de isolamento para evitar contaminação, os cuidados em relação ao solo e à localização. “No final do processo de licenciamento, pode-se chegar à conclusão que a localização não é adequada”, ressaltou.

Para Giordano, as pessoas em geral não querem aterros próximos às suas casas, o que é uma reação normal. No entanto, desde tenham as condições necessárias para a implementação, os empreendimentos precisam existir em algum lugar, já que são fundamentais para o correto descarte de lixo e para a preservação ambiental.

“Não tenho detalhes do projeto de Barra Mansa, mas é uma região que tem muitas indústrias, então deve haver demanda. Por outro lado, estamos falando do Vale do Paraíba, onde temos um manancial que atende vários municípios do estado e da região metropolitana. Então, tem que se tomar cuidado, poque é uma área sensível. Para esse tipo de projeto, se exige uma distância mínima dos rios e dos corpos d'água. Deve se levar em conta a proteção ao lençol freático e às nascentes. Esses elementos não podem ser ignorados”, afirmou.

O pesquisador disse que o Rio de Janeiro é carente deste tipo de unidade de tratamento. “Tem resíduo que sai de Macaé e vai para São Paulo. Quanto mais se anda na estrada, maior o risco de um acidente. Tem também a questão econômica. Mandar um resíduo para outro estado, certamente tem um custo para as indústrias do Rio de Janeiro. Quando se tem uma infraestrutura como essa, fica mais fácil o cumprimento da legislação ambiental e aí você atrai indústrias”, acrescentou.