Acionistas movem ação coletiva nos EUA contra grupos frigoríficos brasileiros

Publicado em 27/03/2017 - 18:08 Por Alana Gandra - Repórter da Agência Brasil - Rio de Janeiro

As consequências da Operação Carne Fraca, da Polícia Federal, cujas investigações foram divulgadas no último dia 17, já começam a surgir para as empresas envolvidas que têm negócios no exterior ou ações negociadas na Bolsa de Nova Iorque, os chamados American Depositary Receipts (ADRs).

O escritório de advocacia norte-americano Rosen Law Firm entrou, na semana passada, com uma ação coletiva na Justiça dos Estados Unidos representando um grupo de investidores em ações do grupo JBS que se sentiram prejudicados pela omissão de informações e divulgação de comunicados que consideraram enganosos por parte da empresa. O escritório brasileiro Almeida Advogados faz parte da ação. Uma ação coletiva similar pode ser aberta contra a empresa BRF.

Em nota, a JBS esclareceu que "não foi formalmente citada na ação e, portanto, não irá comentar".

“Já era esperado”

Na opinião do advogado José Nantala Freire, especialista em direito internacional e compliance (agir em sintonia com as regras dos controles internos e externos), a entrada de ações na Justiça americana por investidores internacionais nesse caso da carne, “já era algo esperado”, como ocorreu com a Petrobras em 2014. “Até porque o resultado financeiro das empresas pode ser impactado pelos resultados das investigações”, disse Freire.

De acordo com o advogado, os indícios resultantes das investigações mostram que são reais as condutas irregulares identificadas pela Polícia Federal na Operação Carne Fraca. Segundo Freire, é necessário um maior desenvolvimento do caso para atestar que o impacto dessas condutas na produtividade e nas finanças das empresas foi suficiente para provocar prejuízos aos acionistas no exterior.

A conselheira do Instituto Compliance Brasil Carolina Fonti afirmou que os investidores aprenderam muito com o caso da Petrobras, entrando na Justiça com ações coletivas nos Estados Unidos para tentar recuperar ou requisitar um eventual prejuízo na desvalorização do capital investido. “O caso da Petrobras tem ensinado muito”, disse Carolina. Ela acrescentou que não é pré-requisito esperar que as investigações brasileiras tomem rumo mais definido para haver repercussão fora do país. “Não é obrigatório, mas é mais comum”.

Procurada pela Agência Brasil, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autarquia do Ministério da Fazenda que fiscaliza o mercado de capitais, informou que não pode intervir no caso das ações coletivas contra os frigoríficos brasileiros, tal como ocorreu no caso da Petrobras, porque é uma decisão de acionistas das companhias. A CVM deixou claro, entretanto, que, se for solicitada para prestar algum tipo de informação, está disposta a contribuir.

Corrupção

Como, de acordo com as investigações da Polícia Federal, parece haver corrupção de agentes do governo brasileiro no caso, Freire disse acreditar que essas empresas poderão ser também objeto de leis anticorrupção de outros países, como os Estados Unidos. Indagado sobre essa possibilidade, o Consulado dos Estados Unidos no Rio de Janeiro não respondeu à solicitação até o fechamento da matéria.

Atualmente, informou Freire, a maioria dos países que têm leis anticorrupção no seu ordenamento jurídico prevê algum tipo de punição pelo pagamento de propina e atos equiparados a corrupção que sejam praticados fora do país por companhias que fazem negócios em seu território.

“Imagina algumas dessas empresas que estão envolvidas [na Carne Fraca] e têm ações negociadas, por exemplo, na Bolsa de Nova York. Caso se evidencie que houve pagamento de propina, como parece ser o caso,  a lei norte-americana prevê a possibilidade de a empresa também ser penalizada nos Estados Unidos. Ela vai ter que negociar possíveis acordos no Brasil e nos Estados Unidos”, acrescentou.

Freire lembrou que casos semelhantes ocorreram com a Petrobras, em razão de processos de corrupção nos dois países e, recentemente, com a Odebrecht. Para ele, ações similares podem ocorrer também na Europa.

Carolina Fonti destacou que as agências internacionais, principalmente as americanas, têm pressionado no sentido do alargamento da aplicação das leis locais em empresas que atuam naquele país. “É muito provável que o Departamento de Justiça [dos EUA] esteja interessado em analisar a questão. Eles estão sempre muito atentos às coisas que acontecem pelo mundo e com os títulos do Brasil e nessas grandes investigações da Polícia Federal que têm repercussão na mídia.”

Lei Anticorrupção

O advogado Freire destacou, porém, que não basta a empresa exportar, porque muitas vezes essa operação não é direta, mas é feita para um distribuidor local que revende o produto. Para receber punição do Departamento de Justiça americano, a companhia estrangeira tem de ter uma representação no país ou títulos negociados em Bolsa de Valores.

De acordo com a lei norte-americana, se a empresa fizer negócios com os Estados Unidos já daria poder suficiente às autoridades para abrir investigações decorrentes de atos de corrupção e pagamento de propinas feitos a funcionários de outros países. “É possível, sim, pelo texto da Lei Anticorrupção dos Estados Unidos, a abertura de investigações em relação a essas empresas, em virtude do que está ocorrendo por aqui”, afirmou Feire.

Edição: Augusto Queiroz

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