Argentina: debate sobre aborto na Câmara deve se prolongar até amanhã
A Câmara dos Deputados da Argentina debate, desde às 11h de hoje (13), o polêmico projeto de lei que descriminaliza o aborto no país. A expectativa é de que as discussões sigam ao longo da madrugada até a manhã de quinta-feira (14).
Trata-se da primeira vez que o assunto é debatido na Casa e, de acordo com sondagens feitas por jornalistas que cobrem a Câmara Baixa – equivalente à Câmara dos Deputados no Brasil, o resultado deve ser apertado. Estima-se que 122 parlamentares votem contra e 117 a favor da descriminalização do aborto. Quinze parlamentares têm dúvidas de como votarão e o resultado final depende deles. O presidente da Câmara, Emilio Monzó, que só votará em caso de empate, não antecipou seu posicionamento.
De acordo com o projeto, o aborto poderá ser feito até 14 semanas de gestação. Depois deste prazo, a interrupção da gravidez só poderá ser realizada em casos de estupro, se representar um risco para a vida e a saúde da mãe e também se o feto tiver alguma malformação “incompatível com a vida extrauterina”.
O projeto elaborado pelos deputados que respaldam a inciativa é baseado em um projeto da Campanha pelo Direito ao Aborto Seguro, Legal e Gratuito, apresentado em 2006 ao Congresso e que já recebeu pelo menos quatro modificações.
O texto em discussão estabelece que “em nenhuma hipótese será passível de punição o aborto praticado com o consentimento da mulher” e prevê penas que vão de três a dez anos de prisão para quem praticar o aborto sem esse consentimento. Em caso de morte da mulher, a pena sobe para 15 anos.
Os médicos terão o direito de se negar a praticar abortos, por questões de consciência, mas nesse caso os centros de saúde precisam providenciar médicos que possam realizar a operação e cumprir a lei.
Atualmente, a Argentina, país de maioria católica, permite interromper a gravidez apenas em casos de estupro e de risco para a vida ou a saúde da mãe. Estima-se que ocorram 500 mil abortos clandestinos por ano no país, dos quais 60 mil acabam resultando em complicações que exigem internação da mulher.
País dividido
Inicialmente, o projeto só tinha o apoio de 70 deputados, mas à medida que foi ganhando espaço, surgiram os protestos das organizações pró-vida.
Marina Lampeduza, estudante de medicina, participou de uma marcha contra o aborto, vestindo a bandeira argentina. “Estamos defendendo duas pessoas, a mãe e a criança, que está por nascer e não tem ninguém para falar por ela”, disse.
“Acho que o aborto não é a solução. O Estado deveria investir em educação e em políticas de apoio às mulheres que engravidaram sem querer ou porque foram estupradas, e financiar programas de adoção”, acrescentou. A campanha contra a aprovação do projeto conta com o apoio do Vaticano.
Já para a jornalista e ativista pró-legalização Mariana Carbajal, mesmo sendo proibido, o aborto no país ocorre e prejudica as classes sociais menos favorecidas. “Os números demonstram que, apesar da proibição, as mulheres continuam abortando. Quem é de classe média e vive na capital pode dar um jeito, sem correr risco de vida, mas para as pessoas com poucos recursos ou que vivem no interior, não ter acesso a uma clínica, onde possa abortar legalmente, representa um risco de vida. Ignorar isso é ignorar a realidade”.
Organizações de defesa dos direitos humanos, como a Anistia Internacional e as Mães da Praça de Maio (que buscam seus filhos desaparecidos no período da ditadura), também se somaram à campanha em favor do aborto.
*Com informações da agência pública de notícias argentina Télam