Qual que é a ideia fundamental do pensamento de Abdias Nascimento, né? Ele traz consigo a ideia de que as conquistas negras não são resultado da benevolência branca ou a benevolência do Estado, tudo é resultado de uma luta coletiva que vem desde os primeiros quilombos que aqui se estabeleceram né? Então essa ideia, por exemplo, de que a Princesa Isabel assinou uma carta de alforria, né? A narrativa oficial traz todo esse protagonismo para a princesa Isabel, quando, na verdade, a abolição é resultado de diversas insurgências que houve no Brasil, ao longo dos séculos e que resultaram na assinatura da Lei Áurea, por exemplo, não como uma questão de benevolência, uma questão de grandeza do Estado, mas sim resultado da luta, a luta estabelecida e organizada dos diferentes movimentos negros que aqui se estabeleceram. Júlio Menezes Silva, pesquisador do Ipeafro, entidade que guarda a obra do intelectual e artista Abdias Nascimento.
Neste segundo episódio do Podcast Imprensa Negra no Brasil o tema é Abdias do Nascimento criador do jornal Quilombo, que teve 10 edições entre 1948 e julho de 1950, o periódico marcou época e é referência até hoje.
O trabalho que Abdias fazia no jornal Quilombo tinha uma agenda política marcante contra “a piedade e o filantropismo aviltantes” em relação à população negra, além de reforçar a importância de uma luta ativa contra o racismo no país.
Abdias Nascimento foi uma liderança contra o racismo. Político, artista, ativista, jornalista e criador do movimento cultural Teatro Experimental do Negro, o TEN, em 1944. O grupo rompeu a barreira racial no teatro brasileiro, lutando pelos direitos civis e humanos dos negros, junto com a recuperação e valorização da herança cultural africana.
Nascido em 1914, Abdias Nascimento, um dos principais intelectuais brasileiros do século 20, foi ativista pan-africanista, poeta, escritor, dramaturgo e artista visual.
Também foi professor da Universidade do Estado de Nova York, de Yale e da Universidade Obafemi Awolowo Ilé-Ifé, na Nigéria. Na política institucional, foi deputado federal, senador e secretário de governo do Rio de Janeiro.
Sua participação social foi sempre intensa. Ele organizou concurso de beleza e de artes plásticas negras e fundou o Museu de Arte Negra e o Movimento Negro Unificado, além de atuar para a criação da Fundação Palmares e do Dia Nacional da Consciência Negra, em 20 de novembro, aniversário da morte de Zumbi dos Palmares.
Atuou também politicamente, com a organização de congressos e conferências para propor leis antirracistas. Foi um dos primeiros e principais articuladores de dois avanços pela igualdade racial vistos apenas no século 21: a lei de cotas e a de ensino da história africana no currículo básico das escolas.
Júlio Menezes Silva, pesquisador do Ipeafro. A entidade que guarda a obra do intelectual e artista Abdias Nascimento destaca:
Qual que é a ideia fundamental do pensamento de Abdias Nascimento. Ele traz consigo a ideia de que as conquistas negras não são resultado da benevolência branca ou a benevolência do Estado, tudo é resultado de uma luta coletiva que vem desde os primeiros quilombos que aqui se estabeleceram. Então essa ideia, por exemplo, de que a Princesa Isabel assinou uma carta de alforria,né? A narrativa oficial traz todo esse protagonismo para a princesa Isabel, quando, na verdade, a abolição é resultado de diversas insurgências que houve no Brasil ao longo dos séculos e que resultaram na assinatura da Lei Áurea. Não como uma questão de benevolência, uma questão de grandeza do Estado, mas sim resultado da luta, a luta estabelecida e organizada dos diferentes movimentos negros que aqui se estabeleceram.
Abdias Nascimento tem uma história intensa e rica, com muitas vivências e lutas em uma vida só. Continue acompanhando esta viagem, seguindo pela Revista Tição ontem e hoje, a TV Quilombo que ajuda comunidade a preservar a memória de lutas e chega aos tempos atuais com jornalistas negros que desafiam abordagens racistas da mídia tradicional.
Agora clique no player e confira o segundo episódio, ou se preferir ouça nas plataformas de áudio e assista pelo YouTube com interpretação em Libras.
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EPISÓDIO 2
Som dos metais no início da vinheta 🎶
VINHETA: IMPRENSA NEGRA NO BRASIL
Sobe som 🎶
Dilson: Nós saímos - vigorosa e altivamente – ao encontro de todos aqueles que acreditam – com ingenuidade ou malícia –, que pretendemos criar um problema no país. A discriminação de côr e de raça no Brasil é uma questão de fato (Senador Hamilton Nogueira). Porém, a luta de QUILOMBO não é especificamente contra os que negam nossos direitos, sinão em especial para fazer lembrar ou conhecer ao próprio negro os seus direitos à vida e à cultura.
Rafael: A primeira edição do jornal Quilombo, de 1948, já disse a que veio, inclusive impresso como subtítulo do periódico.
Som de tilintar de sinos 🎶
Dilson: Vida, problemas e aspirações do negro.
Rafael: Eu sou Rafael Cardoso e este é o segundo episódio do podcast Imprensa Negra no Brasil.
Sobe som 🎶
Akemi: Episódio 2 - Abdias Nascimento e o jornal Quilombo
Sobe som 🎶
Rafael: O jornal Quilombo foi liderado por Abdias Nascimento: político, artista, ativista, jornalista e criador do movimento cultural Teatro Experimental do Negro, o TEN, em 1944. O grupo rompeu a barreira racial no teatro brasileiro, lutando pelos direitos civis e humanos dos negros, junto com a recuperação e valorização da herança cultural africana.
Abdias: Eu me lembro do número de pessoas que vinham me aconselhar pra que eu não fizesse isso, não pusesse o nome de negro aí, que aí eu ia fazer com que a iniciativa se malograsse antes dela se concretizar, antes dela ser lançada. Eu ouvia no ouvido e saia pro outro. Porque realmente, nesse ponto, eu fui muito firme, muito convicto. Tinha que ser teatro negro. Tinha que ser teatro do negro.
Sobe som 🎶
Rafael: Essa fala do Abdias está no Minidocumentário comemorativo pelos 70 anos do Teatro Experimental do Negro, no canal do Youtube do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros, o Ipeafro. A entidade foi fundada em 1981 pelo próprio Abdias.
Sobe som 🎶
Rafael: Voltando ao jornal Quilombo, a publicação teve apenas dez edições, entre dezembro de 1948 e julho de 1950, mas marcou época e é referência até hoje.
Som de agogô 🎶
Júlio: O Teatro Experimental do Negro identificou a necessidade de que houvesse um órgão de imprensa, para poder difundir notícias, né, que pudesse ser um canal direto com os seus leitores negros e tudo mais, e como uma ferramenta de informação para aquele público. Então, em dezembro de 1948 o jornal Quilombo sai com a sua primeira edição, né? É uma edição histórica e traz na capa um artigo do Nelson Rodrigues e um editorial de Abdias Nascimento. Então a partir desse momento, entre 1948 e 1950, são 10 edições que o jornal é publicado, para trazer diversas questões relacionadas à vida, né, né, questões relacionadas aos negros. O slogan é Quilombo: vida, problemas e aspirações do negro, né? Então eles estão pensando ali naquele momento quais são as necessidades do ponto de vista da política, do ponto de vista da afirmação, do ponto de vista da cultura, para poder estabelecer um contato direto com seus leitores, né? Então a ideia inicial do jornal Quilombo é essa, é ser um canal de comunicação direta com o povo negro.
Sobe som 🎶
Rafael: Júlio Menezes Silva é pesquisador do Ipeafro. A entidade guarda a obra do intelectual e artista, que retornou para o Orum em 2011
Som de tilintar de sinos 🎶
Akemi: Orum é a palavra em iorubá que define, de uma forma bem simplificada, o céu ou o mundo espiritual. O Orum existe em paralelo ao Àiyé, que é a terra ou mundo físico. Outra forma de se falar que uma pessoa morreu é “se encantou”.
Rafael: O trabalho do Ipeafro continua na defesa dos direitos dos afrodescendentes e na preservação e divulgação da memória, cultura, história e ativismo negro no país, como legado de Abdias Nascimento. Lembrando que Quilombo foi lançado na época em que se tentava implantar no Brasil o mito da democracia racial.
Som de agogô 🎶
Júlio: Ali havia um esforço da elite brasileira, da elite intelectual e o Brasil, enquanto Estado, vendia essa ideia da democracia racial, né? Onde negros e brancos teriam, aqui no Brasil, em tese, as mesmas oportunidades, né? Então é ali no Jornal Quilombo, você já pode identificar que há um esforço no sentido de tentar desconstruir essa narrativa, uma narrativa estabelecida e se você pega hoje, muitas pessoas acreditam até hoje que há isso, né? Que não existe esse tipo de coisa no Brasil, não existe racismo, né? Então você tem toda um esforço ali dos intelectuais ligados ao Teatro Experimental do Negro para refutar esses argumentos, né? Essa tese de que aqui negros e brancos têm as mesmas oportunidades que na verdade não era bem assim, né? Não é até hoje.
Rafael: Júlio também integra o Fórum Permanente Pela Igualdade Racial, o FOPIR, e foi um dos organizadores do Mapeamento da Mídia Negra no Brasil, lançado em 2020. Vamos tratar desse trabalho no último episódio desse podcast.
Som de tilintar de sinos 🎶
Akemi: O FOPIR foi lançado em novembro de 2016, durante uma audiência pública no Senado, e reúne organizações antirracistas com o objetivo de desenvolver estratégias e ações de diagnóstico, mobilização, comunicação e incidência política para defender um estado democrático e inclusivo, com combate ao racismo e promoção da igualdade racial e de gênero no país.
Rafael: Trabalho que Abdias já fazia no jornal Quilombo, com uma agenda política marcante contra “a piedade e o filantropismo aviltantes” em relação à população negra, além de reforçar a importância de uma luta ativa contra o racismo no país. PIEDADE E FILANTROPISMO AVILTANTES...
Som de agogô 🎶
Júlio: Qual que é a ideia fundamental do pensamento de Abdias Nascimento, né? Ele traz consigo a ideia de que as conquistas negras não são resultado da benevolência branca ou a benevolência do Estado, tudo é resultado de uma luta coletiva que vem desde os primeiros quilombos que aqui se estabeleceram né? Então essa ideia, por exemplo, de que a Princesa Isabel assinou uma carta de alforria, né? A narrativa oficial traz todo esse protagonismo pra princesa Isabel, quando, na verdade, a abolição é resultado de diversas insurgências que houve no Brasil, né, ao longo dos séculos e que resultaram na assinatura da Lei Áurea, por exemplo, não como uma questão de benevolência, uma questão de grandeza do Estado, mas sim resultado da luta, a luta estabelecida e organizada dos diferentes movimentos negros que aqui se estabeleceram.
Sobe som 🎶
Rafael: Nascido em 1914, Abdias Nascimento é um dos principais intelectuais brasileiros do século 20. Além de ativista pan-africanista, foi poeta, escritor, dramaturgo e artista visual. Também foi professor da Universidade do Estado de Nova York, de Yale e da Universidade Obafemi Awolowo Ilé-Ifé, na Nigéria. Na política institucional, foi deputado federal, senador e secretário de governo do Rio de Janeiro.
Som de tilintar de sinos 🎶
Akemi: De acordo com a Fundação Palmares, a expressão pan-africanismo foi utilizada pela primeira vez no ano de 1900, pelo advogado negro Sylvester Willians, da ilha de Trinidad. A ideia era ampliar o sentimento de solidariedade e consciência de uma origem em comum entre os negros do Caribe e dos Estados Unidos, na luta contra a segregação racial, propondo a união de todos os povos de África para potencializar a voz do continente no contexto internacional.
Sobe som 🎶
Rafael: Continuando, ele também organizou concurso de beleza e de artes plásticas negras e fundou o Museu de Arte Negra e o Movimento Negro Unificado, além de atuar para a criação da Fundação Palmares e do Dia Nacional da Consciência Negra, em 20 de novembro, aniversário da morte de Zumbi dos Palmares. Atuou também politicamente, com a organização de congressos e conferências para propor leis antirracistas. Foi um dos primeiros e principais articuladores de dois avanços pela igualdade racial vistos apenas no século 21: a lei de cotas e a de ensino da história africana no currículo básico das escolas.
Som de agogô e um bumbo 🎶
Júlio: Puxando um pouco aí essa corda da história pros tempos mais recentes, a questão da lei de cotas que este ano, por exemplo, completa 20 anos, né? A lei de 2003 completa este ano 20 anos e 40 anos das primeiras proposições do deputado federal Abdias Nascimento. Elas não foram resultado simplesmente da chegada na presidência do governo de esquerda ao poder, ela é resultado de uma luta de vários entes negros ao longo dos séculos né? Aí você pode ver por exemplo no jornal Quilombo, você já tem ali uma luta das empregadas domésticas, das trabalhadoras domésticas, no sentido de reconhecimento da profissão. Então você já vê todo um esforço de muito tempo que resulta, que vem a resultar nessas políticas.
Sobe som 🎶
Rafael: Nossos passos vêm de longe, costuma dizer o movimento negro.
Sobe som 🎶
Thaís: E nossos passos vêm de longe mesmo. Inclusive no jornalismo, há muito tempo. A gente tem Abdias Nascimento, que faz comunicação antirracista, que fez há muito, muito tempo, deixou um legado muito grande para nós comunicadores, sabe nós comunicadores no geral, não só nós comunicadores negros. Então hoje que eu faço é uma continuidade do que os meus antepassados fizeram e eu espero de alguma forma, minimamente, honrar esse caminho que que eles traçaram pra gente poder estar aqui.
Sobe som 🎶
Rafael: A Thaís Bernardes é jornalista do portal Notícia Preta, vamos tratar dos veículos atuais em outro episódio desse podcast.
Rafael: Voltando a Abdias, ele passou 13 anos em exílio nos Estados Unidos e na Nigéria, por causa da perseguição sofrida na ditadura militar, participou de inúmeros eventos internacionais para discutir cultura negra e combate ao racismo e foi consultor da Unesco.
Sobe som 🎶
Rafael: Também editou as revistas, Afrodiáspora, de 1983 até 87, e Thoth, entre 1997 e 99. E escreveu dezenas de livros em português e em inglês, entre eles Quilombismo, O Genocídio do Negro Brasileiro e O Brasil na Mira do Pan-Africanismo. Olha, Abdias fez tanta coisa que é até difícil de resumir aqui em um podcast... se quiser conhecer mais a história dele, vai lá no site do Ipeafro: ipeafro.org.br.
Som de agogô e um bumbo 🎶
Júlio: Eu acho que assim o fato de não estar na academia não quer dizer que não se produzia conhecimento, né? Então acho que são duas coisas aí nesse caso uma coisa é o fato de pessoas negras, né? Não estarem dentro da academia, não quer dizer que elas não produziam seus saberes, né? Não produziam conhecimento, isso estava sendo produzido no dia a dia por exemplo da vida dos terreiros, né, no cotidiano das escolas de samba, por exemplo, puxando um pouco a sardinha aqui pro Rio de Janeiro, né, as vivências em família e isso sempre aconteceu. Dentro da Academia, por ser uma instituição historicamente liderada, né, organizada por pessoas brancas e muitas dessas pessoas brancas racistas, eugenistas, o conhecimento produzido por negro evidentemente passava ao largo. Dentro do contexto do Teatro Experimental do Negro você tinha o sociólogo Guerreiro Ramos, tinha o Ironildes Rodrigues, você tinha vários intelectuais, a própria Léa Garcia, que não produzia efetivamente um potencial, assim, de escrita naquele momento, mas que tava ali com o seu corpo, né, produzindo uma intelectualidade, né. Pessoas negras pensando, né, esse conhecimento, pensando essa tecnologia de saber a partir de epistemologias outras. Ou seja, a partir de um conhecimento vindo de África, né? Sustentado em África, mas principalmente constituído aqui no nosso território, com as nossas dificuldades, com as nossas particularidades, né dessa vivência aqui no Brasil.
Sobe som 🎶
Rafael: Se envolvendo em ações contra a discriminação racial desde a juventude, Abdias integrou a Frente Negra Brasileira da década de 1930. Protestos contra o Estado Novo renderam uma prisão em 1943.
Som de tilintar de sinos 🎶
Akemi: O motivo oficial da prisão foi insubordinação no quartel, por se negar a datilografar um balancete. Na ocasião, ele foi expulso do exército e condenado pela justiça militar dois anos depois. Mas antes da expulsão, ele tinha sido detido e espancado, junto com um amigo, depois de revidarem por serem impedidos de entrar em uma boate em São Paulo por serem negros. Brigaram com um delegado do Dops, o departamento de Ordem Política e Social, que deu razão ao ato racista.
Sobe som 🎶
Rafael: Em dois anos na Penitenciária de Carandiru, em São Paulo, Abdias fundou o Teatro do Sentenciado e um jornal dos prisioneiros. Temos uma fala dele sobre esse período, também do Minidocumentário sobre os 70 anos do Teatro Experimental do Negro:
Som de agogô e um bumbo 🎶
Abdias: Eu tirei da prisão essa gente toda que tava tempos naquelas solitárias, tudo para fazer teatro. Então eu botava aquela gente, aqueles criminosos perigosos, estavam lá cantando cançonetas. Nós fizemos três peças. Na quarta, que ia ser a minha peça, Zeba Coco, eu fui solto porque eu fiz o recurso, mas me lembro do juiz, mandou soltar na mesma hora, é um absurdo, eu era, nem era condenado pela justiça dos homens, era a justiça militar, como é que eu tava na penitenciária? Mandou soltar.
Sobe som 🎶
Rafael: O Júlio, do Ipeafro, conta um pouco da história do envolvimento de Abdias com o Teatro pra gente.
Júlio: Dali, quando ele vai para o presídio e ele fica em 1943 no Carandiru ali vira a chavinha da cabeça dele, porque ele produz a primeira experiência do teatro dele, que é o teatro do sentenciado, é uma experiência onde ele reúne e organiza os detentos para fazer um grupo de teatro, não porque ele resolveu do nada, é porque ele faz nos anos anteriores uma peregrinação junto ao grupo de poetas chamado Camper Mambaia Orquídea pela América do Sul. E quando ele tá passando pela Argentina, ele resolve, permanece um ano junto a uma companhia de teatro chamado Teatro Del Pueblo, e nessa companhia de teatro, ele aprende exercícios do teatro, né? Ele passa por ali, é como se fosse uma residência, né artística, então ele volta ao Brasil preso e ele fala pô, eu preso aqui eu vou colocar em prática isso aí.
Sobe som 🎶
Rafael: Também no cárcere, escreveu o livro Submundo, lançado apenas agora, em 2023, após o marco dos 30 anos do Massacre do Carandiru, completados em 2022. Nos "cadernos de um penitenciário”, subtítulo do livro, Abdias “realiza uma leitura minuciosa das técnicas prisionais de embrutecimento das pessoas encarceradas”, como descrito no prefácio de Denise Carrascosa. Isso em 1943.
Sobe som 🎶
Dilson: O banquinho era pra lá de incômodo. Inaguentável por mais de alguns minutos. Parecia feito não para o descanso, mas com a intenção preconcebida de supliciar.
Sobe som 🎶
Dilson: Quando menos se espera, o guichê abre-se bruscamente, estrepitosamente, provocando-me um choque violento.
Sobe som 🎶
Dilson: Dentro de alguns dias comecei a enfraquecer. A perder peso, a minguar. Alimentação intragável e, ainda por cima, nem o direito de descansar a hora que se quer.
Sobe som 🎶
Dilson: Dias atrás, por exemplo, morreu o 4395. Levou quinze dias morrendo. Que coisa dolorosa! Morrendo ali, devagarinho, solitário, abandonado!
Sobe som 🎶
Rafael: Abdias já relatava, 80 anos atrás, descaso com os direitos básicos, como a análise do processo para a liberdade condicional.
Dilson: Muitas e muitas gerações de delinquentes já gozaram do benefício e o estão usufruindo, ou melhor, o direito da liberdade vigiada. Mas que hei de fazer? Até parece que os pesos e as medidas da Justiça são claudicantes. Porque, talvez, se eu fosse um ladrão de “patola” ou assassino de truz (empreiteiro de Cristo), teria melhor sorte do que sendo o autor desse esquisito crime de recusar a escrever à máquina. Aqui entre nós, caro leitor: não acha maravilhoso que até agora não me tenham condenado à morte?
Sobe som 🎶
Rafael: A atualidade do relato assusta, visto que temos mais de 40% das pessoas presas no Brasil em situação provisória, ou seja, sem julgamento ou condenação, segundo dados de 2022 do Conselho Nacional de Justiça. Trazemos o Júlio de novo para falar sobre a publicação de Submundo.
Sobe som 🎶
Júlio: O que eu acho interessante de pensar que Submundo foi escrito em 1943 pelo no caso jovem Abdias Nascimento, ele tinha 29 anos de idade. Ele tava preso por insubordinação, ele foi pro exército, né, E aí ele se recusou a digitar um balancete. Aí foi preso e aí no Carandiru ele escreve esse relato, né? Então, assim, é de fato é uma narrativa, né, que é surpreendente, porque do ponto de vista político, do ativismo, ele faz uma revisão ali, uma narrativa, que se você pega e transporta, até a contemporaneidade, é extremamente atual, né? É extremamente atual. Então, eu acho que esse livro ele traz um aspecto histórico mais relevante, né? Foi um livro que foi escrito em 1943 naquele Carandiru, a época, construído o principal presídio de segurança máxima da América Latina, né? Foi colocado ali dentro os presidiários mais perigosos, digamos assim, né, do país. E quando a gente lê Abdias Nascimento, a gente lê Submundo, a gente entende esse Abdias que chegou ali em 2011 combativo, atuante, e que, apesar de sua, entre aspas, revolta social, é um cara que é indicado oficialmente ao Prêmio Nobel da Paz, né?
Sobe som 🎶
Dilson: Duvido seriamente que estes cadernos terão alguma utilidade. Caso eles nada valham, ao menos subsistirá o mérito de haverem enchido os longos e pesados ócios celulares do Sentenciado 7-3-4-9.
Sobe som 🎶
Rafael: Certamente o relato é valioso.
Sobe som 🎶
Akemi: Você acompanhou o segundo episódio do podcast Imprensa Negra no Brasil, produzido pela Radioagência Nacional. A produção, apuração e narração são de Rafael Cardoso, que também assina três reportagens especiais para a Agência Brasil, sobre os 190 anos da Imprensa Negra no Brasil.
Sobe som 🎶
Rafael: A adaptação, roteiro e montagem são de Akemi Nitahara. Ela também participou da locução das explicações e da reportagem desse episódio.
A coordenação de processos e edição são de Beatriz Arcoverde e Pollyane Marques
A locução dos textos históricos foi feita por Dilson Santa Fé
Gravação de Tony Godoy e Equipe da EBC
Identidade sonora e sonoplastia de Jailton Sodré.
Liliane Farias e Raíssa Saraiva são responsáveis pela estratégia de publicação e distribuição nas redes sociais
A identidade visual e design foram feitos por Caroline Ramos
Implementação na Web: Beatriz Arcoverde e Lincoln Araújo
Interpretação em Libras: Claudia Jacob
Montagem da versão em vídeo: Felipe Leite e Fernando Miranda
Sobe som 🎶
Rafael: No terceiro episódio, vamos falar sobre a Revista Tição. Ouça o podcast Imprensa Negra no Brasil aqui, na Radioagência Nacional ou pelas plataformas de áudio. Também está disponível com interpretação de Libras no Youtube.
Ideia original, produção e narração | Rafael Cardoso |
Adaptação, roteiro, montagem e locução | Akemi Nitahara |
Edição e pós-produção: | Pollyane Marques e Beatriz Arcoverde |
Identidade sonora e sonoplastia: | Jailton Sodré |
Operação de áudio: | Antony Godoy e equipe da EBC |
Coordenação de processos: | Pollyane Marques e Beatriz Arcoverde |
Estratégia de publicação e distribuição nas redes sociais: | Liliane Farias e Raíssa Saraiva |
Identidade visual e design: | Caroline Ramos |
Implementação na Web: | Beatriz Arcoverde e Lincoln Araújo |
Interpretação em Libras: | Claudia Jacob |
Montagem da versão em vídeo: | Felipe Leite e Fernando Miranda |