Uma história de resistência, iniciada há mais de duzentos anos, foi reconhecida oficialmente pelo governo brasileiro, nesta quinta-feira, beneficiando diretamente 42 famílias remanescentes de quilombolas. Como tantas outras histórias semelhantes, esse reconhecimento não foi fácil.
O processo foi aberto há quase duas décadas, inicialmente na Fundação Cultural Palmares. Agora, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária reconheceu as terras da Comunidade do Timbó, no município de Garanhuns, Pernambuco, como remanescentes de Quilombo. A área tem quase mil hectares e fica a 240km de Recife.
A memória da população relata que um escravizado angolano, que havia fugido, foi acolhido por um padre no local e conquistou as terras em troca de anos de serviço. O angolano José Vitorino ainda juntou dinheiro para comprar a alforria dos filhos escravizados na Bahia. Ele teve outros nove filhos e, de lá para cá, seus descendentes continuam resistindo no "Timbó". A Igreja de Nossa Senhora de Nazaré do Timbó, tombada como patrimônio material de Pernambuco, teria sido construída por causa de uma promessa de José Vitorino pedindo proteção.
Janine Primo Carvalho de Meneses, doutora em História pela Universidade Federal de Pernambuco, encontrou documentos manuscritos que dialogaram com a memória da comunidade e comprovam a compra daquelas terras por José Vitorino. O que não foi efetivado pela justiça, ou mesmo pela jurisprudência, do século XIX.
A historiadora conta que José Vitorino lutou por mais de duas décadas e morreu sem ver a justiça feita.
José Vitorino perdeu judicialmente, mas sua resistência se tornou referência nas memórias de vários moradores descendentes da região. De acordo com a historiadora Janine Primo, uma instrução normativa do Incra, em 2009, passou a garantir a delimitação das terras quilombolas partir da memória de seus entes. Isso favoreceu não apenas o Timbó, mas o registro de referências quilombolas fundamentais para a consciência histórica do país.
Gabriel Correa, repórter da Rádio Nacional
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