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Saúde

Pacientes com doenças crônicas precisam de atenção especial

Com epidemia de coronavírus, muitos precisam sair para tratamentos
Alana Gandra - Repórter da Agência Brasil
Publicado em 27/03/2020 - 16:46
Rio de Janeiro

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Em meio ao isolamento social determinado para evitar a disseminação do novo coronavírus, como ficam os pacientes oncológicos, que são submetidos à radioterapia e quimioterapia fora de suas residências, e os pacientes renais crônicos, que também precisam sair de casa para fazer hemodiálise, geralmente três vezes na semana, com duração de três a quatro horas por sessão?

De acordo com o médico Gelcio Mendes, titular da Coordenação de Assistência (Coas) do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca), vinculado ao Ministério da Saúde, os primeiros cuidados que a instituição está tendo com os pacientes oncológicos são as medidas gerais para evitar a disseminação do vírus. Entre elas, isolamento social, lavagem frequente das mãos, etiqueta de espirro.

Gelcio Mendes esclareceu hoje (27), em entrevista à Agência Brasil, que seguindo as recomendações das agências internacionais e dos grandes centros de tratamento de câncer em todo o mundo, o grupo de médicos do Inca está evitando tratamentos que detenham uma maior depressão da imunidade, em especial nos pacientes mais frágeis. “A gente tem tentado ser cada vez mais criterioso no Inca, no sentido de poupar pacientes com menores chances frente à quimioterapia de receber esses tratamentos imunodepressores”.

Higienização

Por outro lado, o Inca está mantendo os tratamentos com proposta de cura e os tratamentos nos pacientes que apresentam melhor estado geral. “Nos pacientes que estão com bom estado geral, com as funções orgânicas excelentes, nós temos mantido os tratamentos, tanto de quimioterapia, como de radioterapia”. Gelcio Mendes explicou que, na radioterapia, o Inca adotou algumas medidas de higienização adicional do equipamento utilizado. 

O Inca está adiando consultas de acompanhamento e de controle, “na lógica de deixar os ambientes hospitalares mais vazios e diminuir o risco de contágio entre as pessoas”. Consultas que possam ser feitas daqui a dois ou três meses, o instituto está adiando.

Em relação às cirurgias, o Inca está tentando manter, até o momento, os procedimentos cirúrgicos programados, mas está evitando aqueles procedimentos muito agressivos que demandam UTI no pós-operatório, porque já está prevendo que, em algum momento, esses leitos de UTI possam ser requisitados para o tratamento de pacientes com a covid-19. “A gente está sendo bastante criterioso nesse sentido”.

Mendes explicou que, ao mesmo tempo, procedimentos que necessitam de reconstrução, como no caso de câncer de mama após uma mastectomia, e a reversão da colostomia, estão sendo remarcados porque, se não forem feitos agora, mas daqui a alguns meses, o paciente não tem nenhum prejuízo do ponto de vista do funcionamento do organismo.

Já os pacientes que estão sendo submetidos à quimioterapia e à radioterapia não devem suspender o tratamento. “Até porque o câncer não espera. Suspender o tratamento por três meses, por exemplo, significa estar retirando daquele paciente oportunidades de ter um bom resultado desse tratamento. Nós estamos trabalhando com essa lógica”. O coordenador de Assistência do Inca disse que as equipes da instituição, compostas de cirurgiões oncológicos, radioterapeutas, infectologistas, estão constantemente monitorando o que está acontecendo na sociedade, de modo a intervir o quanto antes se, em algum momento, a equipe perceber que não consegue manter a segurança do paciente, porque isso significa que é preciso mudar o rumo adotado.

Pacientes terminais

Para os pacientes cujo quadro não é positivo, o que se torna mais evidente em oncologia, Gelcio Mendes afirmou que os tratamentos têm uma taxa de sucesso, ou seja, um percentual das pessoas pode ter um bom resultado, e outro pode ter complicações. “Muitas vezes, esses percentuais são muito próximos. Ou seja, quem efetivamente se beneficia do tratamento e quem, efetivamente, pode ter efeitos colaterais mais graves, mais sérios”.

No momento, o Inca está tentando limitar ao máximo o tratamento naqueles indivíduos cuja probabilidade de benefícios é menor e a probabilidade de complicações, de efeitos colaterais, é maior. Nesses pacientes, Gelcio Mendes admitiu que há risco de a doença avançar.”Geralmente é uma minoria de pacientes para os quais o instituto vem tentando naturalmente diminuir a oferta de tratamento que tem pouca ou nenhuma eficácia. Os pacientes terminais, chamados pacientes com cuidados paliativos, merecem todo o tratamento que inclui remédio para dor, oxigênio, terapia, fisioterapia. Toda essa linha de cuidado é mantida, mas são pacientes que já não devem receber nem quimioterapia, nem radioterapia, nem cirurgia. “Mas são pacientes do Inca como todos os outros”, ressaltou o médico;

Indagado quanto ao risco de contrair a covid-19 pacientes que têm de sair de suas casas para se submeter a tratamentos de quimioterapia ou radioterapia, durante a quarentena imposta pelas autoridades em razão do novo coronavírus, o coordenador de Assistência afirmou que o risco de pegar o vírus existe, embora já esteja se observando nas cidades e nas ruas uma grande diminuição do trânsito de pessoas. Por isso, o instituto tem recomendado a estratégia da etiqueta do espirro, da lavagem das mãos e, em alguns pacientes, o uso de máscaras cirúrgicas que não protegem 100%, mas diminuem o risco de contrair doenças.

Gelcio Mendes informou que a população pode conhecer mais as ações que vêm sendo tomadas pelo Inca na página do instituto na internet (www.inca.gov.br), com orientações para os pacientes e com informações de qualidade e sempre atualizadas e acessíveis para a comunidade.

Renais crônicos

O presidente da Sociedade Brasileira de Nefrologia, Marcelo Mazza, disse à Agência Brasil que os pacientes que fazem diálise e hemodiálise não têm a possibilidade de se isolarem socialmente, como recomendam as autoridades sanitárias e de governo, porque têm de ir três vezes por semana a uma unidade de hemodiálise e fazer seu tratamento. “Esse deslocamento, essa saída, faz com que esses pacientes sejam mais expostos ao vírus”, comentou. Diálise é a técnica que visa suplementar as falhas da função renal de certos indivíduos que não conseguem eliminar água e produtos de excreção do sangue, Hemodiálise é um processo no qual uma máquina limpa e filtra o sangue do paciente renal, fazendo o trabalho que um rim doente não consegue fazer.

Mazza informou que quando se teve notícia do segundo óbito no país pelo novo coronavírus, a SBN se antecipou e divulgou um posicionamento sobre a ida desses pacientes aos centros de hemodiálise. “Pacientes com febre e sintomas respiratórios que lembrem infecção pelo coronavírus devem entrar em contato com a clínica. Lá, vai ser feita uma triagem com relação a isso e, se esse paciente é suspeito, medidas vão ser tomadas do ponto de vista clínico, sobre se ele vai continuar seu tratamento na clínica ou, se tiver sinais que impliquem em internamento, ele será internado”. Mazza destacou que existem medidas a serem tomadas também dentro da clínica, para evitar contaminação para a equipe e para outros pacientes.

Sobrevida

O presidente da SBN deixou claro que os pacientes renais crônicos têm que fazer o tratamento durante a quarentena, para garantir sobrevida. A disponibilização dos tubos capilares e dos equipamentos de proteção individual depende de auxílio das autoridades, entre as quais o Ministério da Saúde, no sentido de prover financiamento e os recursos para que as unidades de saúde possam se adaptar, principalmente nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, onde o número de casos tem aumentado, afirmou Marcelo Mazza.

Segundo ele, os pacientes necessitam fazer o tratamento, ou seja, “eles não sobrevivem se não forem à hemodiálise fazer esse tratamento pelo menos três vezes por semana. Essa é a preocupação da SBN, de alertar que eles não podem ficar em casa. Eles necessitam realizar esse tratamento”. Uma sessão de hemodiálise dura em torno de três a quatro horas.

Mazza informou que a maioria dos pacientes fazem hemodiálise pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Precisam pegar um transporte que, muitas vezes, é cedido pelas secretarias municipais de saúde, e vão em grupos para as unidades de diálise. Muitos, inclusive, gastam um dia inteiro entre ir para a clínica e retornar à sua casa, incluindo as horas do tratamento.

A SBN já endereçou documento ao Ministério da Saúde e aos parlamentares, no sentido de alertar que devem olhar para essa população com mais atenção porque essas pessoas não têm como ficar em casa. “Vão na contramão das orientações e estão sob um risco maior. São, na sua maioria, diabéticos, pacientes já idosos, mas têm que fazer seu tratamento”.

Atualmente, mais de 130 mil brasileiros fazem hemodiálise em todo o país. Marcelo Mazza informou ainda que houve elevação dos preços dos insumos relacionados à diálise “Esses pacientes que fazem diálise precisam de medicamentos que evitem a coagulação do sangue, luvas, gases. Isso também teve um aumento quase estratosférico. São mais despesas, na verdade, que estão relacionadas ao procedimento e a uma diálise que está subfinanciada”. Lembrou ainda que nessa situação de pandemia de coronavírus, há uma população altamente suscetível a desenvolver essa doença, que são os pacientes renais crônicos.