Em aldeia no Rio, índios guaranis mantêm sua própria língua

No local, a língua franca é a variedade mbyá do guarani

Publicado em 11/12/2014 - 11:01 Por Vitor Abdala - Repórter da Agência Brasil - Rio de Janeiro

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Maricá (RJ) - Na Aldeia Mata Verde Bonita, 20 famílias Guarani Mbyá se comunicam na língua materna, um idioma indígena do tronco tupi-guarani

Maricá (RJ) - Na Aldeia Mata Verde Bonita, 20 famílias Guarani Mbyá se comunicam na língua materna, um idioma indígena do tronco tupi-guaraniTânia Rêgo/Agência Brasil

Em uma área de proteção ambiental, localizada a pouco mais de 50 quilômetros da cidade do Rio de Janeiro, um grupo de cerca de 60 pessoas mantém uma tradição milenar. Nesse lugar, em meio a casas de barro com teto de sapê e construções simples de madeira, o português quase nunca é ouvido.

Maricá (RJ) - Na Aldeia Mata Verde Bonita, 20 famílias Guarani Mbyá se comunicam na língua materna, um idioma indígena do tronco tupi-guarani. Na foto, Darci Tupã, uma das lideranças do local

Maricá (RJ) - "Usar o guarani é uma maneira que a gente achou de reforçar nossa raiz”, afirma Darcy Tupã, uma das lideranças da Aldeia Mata Verde BonitaTânia Rêgo/Agência Brasil

A Aldeia Mata Verde Bonita, construída no início de 2013, no município de Maricá, abriga cerca de 20 famílias da etnia Guarani Mbyá, originárias de Paraty, no sul fluminense. No local, a língua franca é a variedade mbyá do guarani, um idioma indígena do tronco tupi-guarani, falado por milhares de indígenas (e até não indígenas) no Sul e no Centro-Oeste do Brasil e em países vizinhos, como a Bolívia e o Paraguai.

Das coisas mais simples, como pedir um objeto, às mais elaboradas, como a prática de rituais e festas, tudo é feito por meio do guarani. “A gente só usa o português para fazer contato com o que a gente chama, na linguagem indígena, de juruá ou homens brancos. Usar o guarani é uma maneira que a gente achou de reforçar nossa raiz”, afirma Darcy Tupã, uma das lideranças da aldeia.

Outra liderança da aldeia, Miguel Veramirim, diz que a primeira língua aprendida pelas crianças é o guarani. Apenas quando elas têm 5 anos ou 6 anos, elas começam a aprender o português, seja por causa da televisão seja pelo contato com visitantes.

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“A gente está muito perto da cidade. Se a gente estivesse na Amazônia, seria mais fácil [evitar o contato com o português]. Mas aqui perto da cidade, a gente tem que lidar com outra língua. Para quem mora perto da cidade, é importante saber falar a outra língua [o português] também. Mas ao mesmo tempo, é aí que mora o perigo de perder nossa língua”, diz Veramirim, que também aprendeu a língua portuguesa por meio da televisão e do convívio com os juruás.

Maricá (RJ) - Na Aldeia Mata Verde Bonita, o líder Miguel Veramirim diz que a primeira língua aprendida pelas crianças é o guarani

Maricá (RJ) - Na Aldeia Mata Verde Bonita, o líder Miguel Veramirim diz que a primeira língua aprendida pelas crianças é o guaraniTânia Rêgo/Agência Brasil

Além disso, segundo Veramirim, há palavras da língua portuguesa que tiveram que ser incorporadas ao léxico guarani porque não há correspondentes na língua indígena, como geladeira, papel, caneta e banheiro. “A gente tem que usar a língua portuguesa para se referir a palavras como 'banheiro'. Não adianta a gente inventar uma palavra, porque não existe. A gente não tinha essas coisas antigamente. Para artesanato, por exemplo, eu posso usar ajaka, na nossa própria língua, porque isso já existia [na nossa cultura]”, diz.

Por enquanto, as crianças não frequentam a escola. A ideia dos guaranis é trazer uma escola para dentro da aldeia, mas a unidade terá que ser diferente das demais unidades da rede pública, para se adequar às demandas da comunidade.

Para Tupã, a maior ameaça para a perda da língua e da identidade indígena como um todo é a perda da terra. “O grupo tem que estar estruturado em um lugar onde ele possa ter oportunidade e tranquilidade de preservar e praticar nossa cultura. Se a comunidade indígena não tiver uma área adequada, uma área saudável, acredito que ela não terá essa oportunidade de sempre usar sua língua materna, sua cultura e seus rituais”, diz.

Edição: Lílian Beraldo

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