Jogos Indígenas: etnias apresentam ao mundo sua cultura e reivindicações
A movimentação na vila dos Jogos Mundiais dos Povos Indígenas (JMPI) é intensa, com turistas e moradores da região circulando o tempo todo nos espaços erguidos para o evento. Tanto dentro quanto fora das feiras instaladas na área da vila, o comércio de produtos artesanais é intenso e a pintura corporal atrai curiosos e turistas.
Por preços que giram entre R$ 5 e R$10, é possível ter arte indígena estampada no corpo durante cerca de uma semana. E não faltam “homens brancos” ostentando suas pinturas nesse período dos jogos em Palmas. A cultura indígena faz a moda na capital tocantinense.
Jefferson Manoki caminhava pela vila com um colega – ambos usando os paramentos típicos de seu povo; cocar, pinturas e adereços nos braços e pernas – quando foi abordado por uma turista com uma máquina fotográfica nas mãos. Simpático, o jovem Manoki abraçou a moça e sorriu para o flash.
Para ele, este momento é positivo para que os índios possam se mostrar para o mundo. “Eu acho bom. Assim somos mais reconhecidos, mais valorizados. E também para podermos mostrar mais nossa cultura, a cultura do nosso povo. Mas o nosso orgulho é independente do pensamento do homem branco”, afirmou Jefferson.
Para o xavante Urias Tsumey'wa, a pintura corporal é mais do que uma moda: cada uma tem um significado, cada uma traz a bagagem cultural de um povo. “A pintura representa alguma coisa, fala alguma coisa. O meu povo se pinta totalmente para a guerra, a nossa pintura é em preto e vermelho. Eu procuraria a pessoa e perguntaria por que ela está se pintando. A pintura é uma manifestação e um meio de mostrar que aquele povo existe e vive.”
Legado pode ser pequeno
O jovem estudante xavante, no entanto, diz que o legado dos Jogos Mundiais dos Povos Indígenas será pouco significativo para os índios. “Essa pequena ação do governo federal não satisfaz a maioria. O Brasil deve muito para o povo indígena, porque somos os primeiros povos. Não podemos falar em satisfação, isso ainda é pouco. Isso não vai beneficiar nem o povo indígena. Vai beneficiar o governo”, afirmou Urias.
Mesmo assim, o estudante afirma que os povos que se reuniram em Palmas precisam aproveitar os jogos para interagir com os “parentes”, como chamam indígenas de outras etnias, e trocar experiências. “Este é o momento de celebrar, confraternizar, conhecer outras culturas. Antigamente não havia essa interlocução de culturas.”
Os JMPI têm tido momentos de descontração, com muita festa e esporte, mas também tem havido manifestações e protestos. Embora sem espaço reservado na programação, representantes das mais diversas etnias têm encontrado formas de criticar políticas consideradas opressoras, como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que transfere a decisão sobre demarcação de terras indígenas do Ministério da Justiça para o Congresso Nacional.
Ontem (26), na Arena Verde, quatro indígenas mostraram ao público uma faixa contra a PEC e contra a morte de índios no país. O tema é frequentemente abordado nos debates que ocorrem no Fórum Social Indígena, na Oca da Sabedoria. São pequenos espaços que os índios estão abrindo por conta própria para fazer suas reivindicações. “Politicamente, nosso objetivo é chamar a atenção para a questão indígena de forma geral. Tentaremos aproximar o governo das questões políticas e diminuir o preconceito que existe entre sociedade indígena e a não indígena”, disse Mainami Santana, da etnia Xukuru Kariri.
O líder dos Karajá Xambewá, Edmilson Moreira Karajá, também destaca que os povos originários do país devem buscar avançar em suas pautas junto ao governo. “Estamos em busca dessa resposta quando deparamos com um encontro deste [Jogos Mundiais dos Povos Indígenas]. A expectativa é que nos fortaleçamos e possamos ser ouvidos, respeitados”, afirmou.
A partir do dia 1º de novembro, todos os povos voltarão para suas aldeias, os turistas para suas casas e a mídia concentrada em Palmas se dispersará. Será o fim dos JMPI. Mas Edmilson pede para que a situação de muitos dos índios no Brasil não seja esquecida. “Peço para não haver mais essas obras de hidrelétricas, de barragens nas nossas terras. Que não se aprovem esses grandes projetos, que vêm destruindo nossa cultura viva, que é nosso povo. As barragens alagam, acabam com nossas reservas”, apelou Edmilson.
Ele citou também a etnia Guarani-Kaiowá, de Mato Grosso do Sul, cujos líderes têm sofrido ameaças e ataques. “É uma calamidade o que está acontecendo com os nossos parentes Guarani-Kaiowá. Eles estão pedindo socorro. Gostaria muito que o governo visse isso com carinho, que nossos parentes saíssem tranquilos daqui, tendo uma certeza de que seriam mais bem cuidados.”