Estudo aponta falta de diversidade no mundo da tecnologia e inovação
Levantamento que ouviu 570 mulheres negras e indígenas nas cinco regiões do Brasil apontou baixa diversidade no mundo da tecnologia e da inovação. A pesquisa identificou relações de opressão, como machismo e racismo, em ambientes de trabalho relacionados à área e ausência de espaços de formação e incentivo à entrada em carreiras e atividades relacionadas a diferentes segmentos focados em tecnologias.
A pesquisa foi realizada no âmbito do projeto Pretalab, uma iniciativa da organização Olabi. Além da produção de informações sobre a ausência de diversidade nas carreiras e segmentos vinculados à tecnologia, a entidade promove iniciativas para aproximar mulheres negras e indígenas dessas áreas. Ela pode ser acessada em https://www.pretalab.com.
Do total de entrevistadas, 22% relataram ter entrado na área depois de cursos formais (em escolas técnicas e universidades). Segundo levantamento do Grupo de Gênero da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo citado no relatório, a célebre escola da maior instituição federal de ensino do país formou apenas 10 mulheres negras em 120 anos.
“A falta de estímulo tem um componente cultural importante e se reflete na pouca expressividade dos dois grupos nas engenharias e ciências exatas. Na tecnologia, esse distanciamento se agrava, já que a área é imaginada como ‘coisa de homem’ e um lugar de branco”, analisa o documento.
Em razão dos obstáculos nos ambientes escolares formais, para muitas entrevistadas, o contato ocorreu a partir do aprendizado informal, como grupos de apoio, busca de informações na internet, cursos livres e amigos. Contudo, o estudo também revelou que apenas 20% das entrevistadas disseram conhecer projetos envolvendo mulheres negras e indígenas com tecnologia.
Outra porta de entrada para atividades relacionadas à inovação é a aposta no “empreendedorismo digital”. Isso se reflete na principal prática relatada pelas mulheres ouvidas: a produção e difusão de conteúdos online.
O hábito de busca por conhecimento e por formação, com disposição para continuar com iniciativas de aprendizagem, foi manifestado por 99% das ouvidas no estudo. O desenvolvimento de software e hardware foi indicado como funções que parte das entrevistadas deseja conhecer mais e desenvolver habilidades.
Preconceito
A dificuldade de acesso às carreiras e ao mercado de tecnologia é relacionada no estudo a práticas de discriminação tanto de gênero quanto de raça. Experiências deste tipo foram relatadas pelas entrevistadas pela pesquisa.
“'Mas mulher sabe programar?’, ‘Você trabalha na faxina?’ e tantos outros que eu e muitas mulheres negras, pobres ou não, já ouvimos nessa área tão hostil, mas que continuo tentando por vocação e amar o que faço", disse Fabiana Rodrigues, em uma das histórias registradas pelo levantamento.
“Eu já seria minoria no curso que escolhi [Ciência da Computação] só por ser mulher. Aí sou também negra. É um desafio muito grande de entrar, de ocupar os lugares, porque você vê os olhares no elevador, na biblioteca, no corredor. Você vê. Eles te acompanham todo o tempo”, relatou Ana Carolina da Hora.
Iniciativas
O Pretalab inclui também ações para promover a aproximação de mulheres negras e indígenas com o mundo da tecnologia. Entre elas, estão a formação de mulheres com vistas ao aprimoramento de conhecimentos, a assessoria para que empresas e órgãos possam incorporar de maneira mais efetiva a diversidade em suas equipes e o fomento à formação de redes que potencializem a atuação de mulheres negras e indígenas em atividades vinculadas à inovação.
“As tecnologias estão carregadas com as visões políticas, econômicas e culturais de quem as cria – e esse poder hoje está centrado nas mãos de homens, brancos, heterossexuais, classe média/ricos. Isso já potencializa uma grande desigualdade, em um mundo cada vez mais digital”, diz Silvana Bahia, diretora de projetos do Olabi e coordenadora do PretaLab.
Além do Pretalab, a Olabi também desenvolveu outras iniciativas para estimular a curiosidade e pela tecnologia. Uma delas foi o projeto Minas de Dados, promovido pela Olabi e pela Transparência Brasil, que socializou conhecimento e ferramentas para coletar e cruzar informações públicas.