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Economia

Covid-19: confecções de Nova Friburgo se reinventam para não demitir

Fábricas de lingerie passam a produzir e vender máscaras
Alana Gandra - Repórter da Agência Brasil
Publicada em 06/05/2020 - 19:36
Rio de Janeiro
Governos estaduais adotam o uso obrigatório de máscaras para conter covid-19.
© Reuters/Pilar Olivares/Direitos Reservados

As confecções especializadas em lingerie de Nova Friburgo, na região serrana do Rio de Janeiro, encontraram uma maneira de se adaptar à situação de pandemia causada pelo novo coronavírus, fabricando equipamentos de proteção individual (EPIs), para garantir a sobrevivência das empresas e a manutenção dos empregos. As indústrias do município estão proibidas de funcionar para confeccionar seus produtos tradicionais (peças íntimas femininas).

Nova Friburgo reúne mais de 1.300 fábricas de lingerie, que, juntas, colocam no mercado cerca de 125 milhões de peças por ano, ou o correspondente a 25% da produção nacional. Parte dos estabelecimentos (14%) trabalha com exportação, tendo como destinos principais os Estados Unidos, Portugal, a Argentina e o Uruguai. O município promove anualmente o maior evento brasileiro do setor, a Feira de Moda Íntima, Praia, Fitness e Matéria-prima (Fevest).

O diretor da CCM, marca de moda fitness (para ginástica) criada em 1995, Claudio Cariello, disse hoje (6) à Agência Brasil que o setor trabalha muito com planejamento, embora, no momento atual, não haja planejamento nenhum. Por isso, a confecção decidiu aproveitar a oportunidade que surgiu de produzir EPIs, como máscaras, aventais, capotes, jalecos, sapatilhas e toucas.

Demanda

Segundo Cariello, as máquinas foram adaptadas para a nova demanda obtida por meio de amigos e parceiros. “E estamos produzindo”. Inicialmente, a empresa fez uma doação a hospitais locais e, agora, a prefeitura comprou itens que serão entregues na semana que vem. “Estão surgindo demandas de hospitais em nível nacional, não só municipal”.

Cariello ressaltou que o forte da produção local está sendo para indústrias que precisam retomar as atividades, e as máscaras de tecido servem como uma barreira à covid-19. Por isso, Cariello disse que a maioria das empresas, incluindo a dele, está aproveitando a oportunidade e conquistando uma nova fatia do mercado, o que vai ser duradouro, pelo que se está percebendo.

Ele estima que, pelo menos até o fim do ano, será imprescindível o uso de máscaras tanto por adultos quanto por crianças e jovens. “A gente não pode ficar na dependência de 95% desse tipo de material serem produzidos só na China”. Para Cariello, toda empresa que tiver um pouco de visão vai ver isso como um mercado até promissor.

O empresário destacou que sua empresa não demitiu funcionários por causa da pandemia.Ele informou que, nesta quarta-feira, o contrato dos 170 colaboradores foi prorrogado por mais 30 dias, além dos 30 dias iniciais, e as equipes dedicadas ao comércio eletrônico (e-commerce), marketing e setor financeiro estão trabalhando sem parar. ”Não demitimos ninguém, aguardando os próximos capítulos dessa situação. A gente está muito receoso. Só com a retomada, poderemos fazer a demanda efetiva para dar continuidade ou não ao trabalho”, afirmou.

Cartilha

Para ajudar as pequenas empresas que precisam retomar suas linhas de produção, que estavam paradas até o momento, para se dedicar à fabricação de EPIs, a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) elaborou uma cartilha em que mostra as diferenças entre os diversos tipos de máscara e orienta as confecções para a fabricação de tais equipamentos.

A Firjan atuará também na parte de capacitação, voltando a atenção principalmente para as mulheres que são chefes de família, foram demitidas e estão agora em casa, sem trabalho para geração de renda, e não são costureiras.

“Elas vão aprender a costurar e desenvolver esse empreendedorismo. Para elas, estamos desenvolvendo um curso virtual que ensina a conhecer a máquina, a costurar e a desenvolver desde a escolha do molde até o custo total desse produto [máscara]”, disse à Agência Brasil Milena Rodrigues, coordenadora do Espaço da Moda do Senai/Firjan em Nova Friburgo. “A gente começa a reinserir essas pessoas que perderam o emprego no mercado de trabalho.”

O curso de confecção de máscaras, que poderá ser acessado virtualmente pelo celular, entrará no ar na próxima semana. Inicialmente, ele terá um custo, mas bem acessível, informou Milena, acrescentando que o valor não foi ainda disponibilizado. “E aparece no momento como uma grande solução para geração de renda”, completou.

A fábrica de pneus Michelin, localizada em Campo Grande, zona oeste da capital fluminense, contratou o Senai Espaço da Moda e vai liberar uma célula em sua fábrica para produção de máscaras para seus empregados. “O Senai vem atuando fortemente na capacitação para produção dessas máscaras”, disse Milena Rodrigues.

Existem outras propostas sendo negociadas com prefeituras, visando à realização de cursos similares gratuitos. A primeira negociação está sendo feita com a prefeitura de Cabo Frio, na Região dos Lagos. “É uma forma de o município se movimentar para capacitar pessoas para geração de renda na própria cidade.”

Empregos

Para a presidente da Firjan Centro Norte, Márcia Carestiato, a reinvenção do polo de moda íntima de Nova Friburgo para enfrentar a crise do novo coronavírus está se mostrando uma opção bem-sucedida e evitando demissões em massa. “Temos mais de 20 mil colaboradores diretos e indiretos na moda íntima. São 20 mil famílias”. Esse contingente representa 52% da mão de obra da região, informou Márcia à Agência Brasil.

A prefeitura de Nova Friburgo tomou a iniciativa há cerca de um mês, ao divulgar que pretendia comprar 1 milhão de máscaras, o que não atendeu a todo o polo, formado por mais de 2 mil confecções. “Foi o pontapé inicial para poder pegar demanda de outros lugares, de comércio, de indústrias, de empresas, entidades”, explicou Márcia.

De acordo com ela, o polo de Nova Friburgo tem capacidade para produzir entre 10 milhões e 11 milhões de máscaras por mês “para o Brasil inteiro”. Não é uma coisa que vai ficar para sempre, mas “vai dar uma aliviada no momento atual, ressaltou Márcia. Ela admitiu que está havendo "alguma demissão", mas ressaltou que não tem esse número fechado, porque um decreto da prefeitura estabeleceu que as confecções só poderiam produzir EPIs ou máscaras com 50% do pessoal.

Com os demais empregados, as empresas fazem revezamento, reduzem o horário e colocam para trabalhar em casa.