,O mundo esportivo foi impactado na última sexta-feira (19) com o grave acidente do campeão paralímpico de ciclismo Alessandro Zanardi durante uma pedalada festiva, organizada pelo atleta para simbolizar o renascimento da Itália após a pandemia do novo coronavírus (covid-19). O italiano, de 53 anos, perdeu o controle da handbike (bicicleta impulsionada pelos braços) e foi atingido por um caminhão. O atleta foi colocado em coma induzido e seu estado é considerado "grave, mas estável", de acordo com o boletim médico divulgado nesta segunda-feira (22), pela equipe médica do Hospital Santa Maria alle Scotte, de Siena (Itália). O evento organizado por Zanardi também arrecadaria fundos para uma instituição voltada à recuperação de dependentes químicos
Zanardi está novamente lutando pela sobrevivência, quase 20 anos depois de se acidentar pela primeira vez. Em setembro de 2001, o então bicampeão mundial de Fórmula Indy e ex-piloto de Fórmula 1 rodou ao sair dos boxes, no circuito alemão de Lauzitsring, sendo atingido em cheio pelo carro do canadense Alex Tagliani. O impacto violento obrigou o italiano a amputar as duas pernas, mas, não afetou o amor dele pelo esporte. Cerca de dois anos depois, lá estava Zanardi à bordo de um carro de corrida novamente - adaptado, é claro, com aceleração e breque comandados pela mão.
Das pistas, o italiano abraçou o paradesporto e mostrou ao mundo que não ter as pernas era um detalhe. A trajetória começou no atletismo paralímpico, em provas de maratona. O paraciclismo entrou na vida do ex-piloto depois, por influência de Mario Valentini, diretor técnico da modalidade na Itália e amigo "há mais ou menos 45 anos" do também italiano Romolo Lazzaretti, hoje coordenador técnico da seleção brasileira de ciclismo adaptado.
"Conheci o Alex durante provas da Copa do Mundo na Europa antes da Paralimpíada de 2012, em Londres (Reino Unido). É um cara de liderança incrível. Logo vi que ele transmitia uma felicidade, uma positividade a todos. Ele conta muitas piadas. Não éramos íntimos, mas quando nos encontrávamos, era sempre afetivo. Depois de Londres e até [os Jogos do] Rio de Janeiro, o Mario montou uma confraternização com atletas e italianos que comandavam equipes de outras nações. A gente se divertia para caramba, e os protagonistas eram Zanardi e seus contos maravilhosos", recorda Lazzaretti em entrevista à Agência Brasil.
O sucesso do ex-piloto no paraciclismo foi imediato. Foram dez medalhas de ouro em Mundiais e quatro em Paralimpíadas. Na Rio 2016, o italiano esteve duas vezes no topo do pódio, nas provas de revezamento misto e contrarrelógio. E uma curiosidade: a experiência no automobilismo pôde, de alguma forma, ser aplicada por Zanardi no esporte adaptado. "Ele é um grande mecânico, então, as modificações nas bicicletas vinham da cabeça dele. Um gênio", considera Lazzaretti, bicampeão europeu de ciclismo de pista e representante da Itália na Olimpíada de Munique (Alemanha), em 1972, antes de assumir a coordenação técnica da seleção de ciclismo adaptado.
O reconhecimento pela trajetória de Zanardi não se limita à terra natal. Um dos principais nomes do paraciclismo brasileiro, Lauro Chaman tem o italiano como um ídolo. "Não só no esporte, mas além dele. É uma referência. Sempre que chamam para conversar sobre a minha história, ele é um cara que eu cito, sempre dando a volta por cima. Com certeza, dará a volta por cima agora também", destaca o paulista de Araraquara ao conversar com a Agência Brasil.
Medalhista de prata e bronze na Rio 2016 e campeão mundial (2018), Lauro foi um dos vários atletas, olímpicos e paralímpicos, que se manifestaram pelas redes sociais após o acidente de Zanardi. "A gente não é tão íntimo, não compete nas mesmas provas. Ele é sempre gente boa com todos, está sempre brincando", descreve. "É a maior referência que temos no ciclismo paralímpico, não só pelas vitórias, mas, pela pessoa que é e o que ele agrega. Muitas pessoas que estão no mesmo hotel (que os atletas) não são muito ligadas (no esporte), mas, é legal quando elas reconhecem e pedem foto ao Zanardi. E ele tira foto com todos sempre sorridente, gosta de deixar os outros felizes", completa.
Romolo Lazzaretti vai além. "O que Alex representa ao paraciclismo mundial? Ele é um farol, um guia. Espero que dê tudo certo. Eu não quero mais pensar no Zanardi como atleta porque será difícil ele poder voltar a ser, mas como uma luz, um grande incentivador do esporte paralímpico, particularmente no ciclismo", conclui.