logo Agência Brasil
Geral

Ano de 2014 foi marcado por ataques a bases de UPPs no Rio

Vitor Abdala - Repórter da Agência Brasil
Publicado em 28/12/2014 - 17:06
Rio de Janeiro
retrospectiva_destaque
© ArteDJOR

retrospectiva_banner

O ano de 2014 foi marcado pelo grande número de ataques a bases e a policiais das unidades de Polícia Pacificadora (UPP) no Rio de Janeiro. Se, em todo o ano de 2013, três policiais militares foram mortos em áreas ocupadas por UPPs, entre janeiro e novembro deste ano, esse número subiu para oito.

Muitos policiais também foram feridos nessas áreas. Além disso, houve vários ataques a sedes de UPP. Em um dos episódios mais recentes, a base da unidade no Morro dos Macacos, na zona norte da cidade, foi atacada a tiros por criminosos. Um policial militar foi atingido nas pernas e nas costas.

Além do aumento no número de ataques contra as bases e carros da polícia, os tiroteios tornaram-se mais intensos nessas áreas. A consequência foi que houve mais pessoas atingidas acidentalmente pelos tiros.

A Coordenadoria de Polícia Pacificadora (CPP) não tem estatísticas sobre as chamadas balas perdidas e, por isso, não é possível comparar este ano com o anterior. No entanto, em um levantamento feito com base em notícias divulgadas ao longo de 2014, a Agência Brasil identificou mais de 40 casos em que a pessoa foi vítima de bala perdida ou em que a circunstância do ferimento a bala não foi determinada. Entre essas vítimas, pelo menos 14 morreram.

Para a coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec) da Universidade Candido Mendes, Silvia Ramos, os problemas que apareceram “de forma profunda” em 2014 demonstram uma perda do controle territorial pela polícia em muitas favelas “pacificadas”.

“O objetivo principal das UPPs sempre foi retomar territórios. E esse objetivo foi perdido em várias UPPs, principalmente nas grandes, como os complexos do Alemão e da Penha, da Rocinha, de Manguinhos, do Jacarezinho e do Caju. Se é que algum dia houve esse controle pela polícia, foi totalmente perdido. São áreas onde temos tiroteios diários”, disse a pesquisadora, que em 2010 chegou a coordenar, pelo governo do estado, um projeto de intervenções sociais nas áreas com UPPs.

Segundo Silvia, uma das deficiências do projeto é a falta de integração da UPP com a Polícia Civil, responsável pelas investigações no estado. “O que temos é o policial militar sozinho no campo, sem apoio de uma polícia investigativa. Portanto, esse policial voltou a reagir da forma como se reagiu durante 30 anos no Rio de Janeiro, que é bandido atira e polícia atira de volta. É a mesma resposta que fracassou durante 30 anos.”

A pesquisadora ressaltou que não há uma política de investigação capaz de desorganizar os grupos criminosos que mantêm o controle armado do território, apesar da ocupação policial. “Os grupos armados que atuam no varejo das drogas aprenderam rápido como atuar nas costas da polícia. Eles conhecem o território. O patrulhamento dos policiais é previsível, com hora, dia e local certo. É muito fácil estabelecer a venda de drogas em locais onde os policiais não passam ou depois que eles passam. Assistimos também ao fortalecimento da modalidade de vendas de drogas ao modo antigo, em bocas de fumo, com jovens armados de fuzil.”

Para a especialista, algumas UPPs conseguiram ser bem-sucedidas na retomada do território, como a Santa Marta, na zona sul da cidade, ou a do Borel, na zona norte. Apesar disso, mesmo nessas comunidades, ela ressalta que há dificuldade de relacionamento dos policiais com a população local.

“Há muita hostilidade e não se desenvolveu nenhum projeto envolvendo a juventude e a polícia, o que era de se esperar em um dos maiores programas de polícia de proximidade do mundo. Não há nenhum programa de aproximação ou pelo menos de redução dos estereótipos de parte a parte”, explica a pesquisadora.

Silvia também sente falta de um programa de reinserção de jovens que trabalham ou trabalhavam para as facções criminosas. “Nenhum programa sobre o que fazer com esses jovens desarmados foi desenvolvido. Se existe um programa para tirar as armas, o que será feito com aqueles que estavam segurando as armas? Quem está acolhendo essas pessoas são as ONGs [organizações não governamentais], os grupos religiosos, os grupos de cultura, de uma forma muito improvisada. Era preciso que se desenvolvesse um programa de Estado”, recomenda Silvia. Ela lembra, porém, que isso não impede que os jovens cumpram suas dívidas com a Justiça.

A Coordenadoria de Polícia Pacificadora (CPP) nega que tenha havido um aumento nos índices de violência nas UPPs neste ano, mas não apresentou nenhum dado comparativo com o ano de 2013. A CPP usou dados de 2008, ano anterior à implantação das UPPs no estado, para justificar uma queda na violência.

De acordo com a CPP, o trabalho investigativo da Polícia Civil é primordial para o êxito do programa de pacificação. "Por isso, são essenciais o diálogo e a ajuda mútua entre o comandante da UPP e a delegacia da área. Exemplo disso foi a Operação Elo de Paz [realizada no dia 18 de dezembro], no Complexo do Lins. Policiais da 26ª DP [Todos os Santos] e das UPPs Lins e Camarista Méier realizaram a ação com o objetivo de cumprir mandados de prisão e de busca e apreensão contra menores de idade remanescentes do tráfico de drogas e autores de disparos contra policiais militares das UPPs.”

Sobre o fato de haver problemas em várias UPPs, como o Alemão e a Rocinha, a CPP respondeu que o projeto tem etapas. “Em algumas comunidades, o processo já está consolidado, mas em outros ainda não. Vários fatores determinam isso, como o tempo de instalação, o histórico e o tamanho da comunidade, a movimentação e o lucro do tráfico local entre outros.”