Contra Michel Temer, artistas ocupam sede da Funarte em BH
Cerca de 60 pessoas estão acampadas na noite desta segunda-feira (16) na sede da Fundação Nacional de Artes (Funarte) em Belo Horizonte em protesto contra o afastamento de Dilma Roussef da Presidência da República e contra o governo do presidente interino Michel Temer. A ocupação começou na noite de ontem, quando cerca de 30 pessoas dormiram no local, após decisão tomada em assembleia.
Em outras cidades do Brasil, estruturas que pertenciam ao antigo Ministério da Cultura (MinC), hoje pertencente ao Ministério da Educação e Cultura (MEC), também estão sendo ocupadas. No Rio de Janeiro, o Palácio Gustavo Capanema, sede da extinta pasta e da Funarte, foi tomada por centenas de manifestantes nesta manhã.
Na última sexta-feira (13), cerca de 30 artistas ocuparam, em Curitiba, a sede do Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Manifestantes também se mobilizam para um ato na representação da Funarte em Recife.
Vinculado ao MEC
A Funarte está sem direção desde a última quinta-feira (12), quando o então presidente Francisco Bosco deixou o cargo. Ele apresentou sua carta de renúncia e justificou sua decisão dizendo não reconhecer o novo governo.
A Funarte é um órgão vinculado ao recém-extinto MinC e tem como objetivo o desenvolvimento de políticas públicas de fomento às artes visuais, à música, ao teatro, à dança e ao circo. Sua sede nacional fica no Rio de Janeiro e há representações em Belo Horizonte, Brasília, São Paulo e Recife.
A extinção do MinC foi uma das primeiras medidas anunciadas pelo governo de Michel Temer. A gestão da cultura voltará a ser feita pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC) após mais de 30 anos. O Ministério da Cultura havia se emancipado do Ministério da Educação em 1985, durante o governo de José Sarney.
O ministro da Educação e Cultura, Mendonça Filho, durante sua posse, disse que nenhum programa da nova pasta será “descontinuado”. “Todos serão fortalecidos e aprimorados” . Segundo o ministro, a fusão não significará enfraquecimento da cultura. “Você pode ter dois ministérios com pouca força e também pode ter duas áreas fundamentais como cultura e educação andando mais fortalecidas”, disse.
Revolta
A decisão de Michel Temer gerou revolta da classe artística e também de quem trabalha com o setor. Ao se apresentar aos servidores da pasta extinta, o novo ministro da Educação e Cultura, Mendonça Filho (DEM), foi vaiado.
Segundo o produtor cultural Pedro Martins, apesar das críticas à extinção do MinC, um eventual recuo de Temer sobre essa decisão não é suficiente para encerrar a ocupação. "Nós fazemos a leitura que já estamos em um estado de exceção. O que ocorreu foi um golpe branco. Nossa pauta nesse momento não é a volta do MinC e sim a volta da Dilma. Queremos o retorno do estado de direito", disse.
Martins explica que a ideia é transformar a Funarte em um espaço para debates diários, articulação política e formação sociocultural. Ele diz que se trata de uma trincheira pela manutenção das políticas culturais conquistadas nos últimos anos graças a mobilização dos artistas. "Nós acreditamos que o Ministério da Cultura não é do governo. Ele é um ministério construído pelos artistas. Ele é nosso e vamos lutar por ele, mas não de mãos dadas a esse governo".
Para o teatrólogo João das Neves, a ocupação deverá combinar entretenimento e uma ampla discussão sobre o país. "Aqui é um ponto de encontro de artistas. Não só artistas consagrados, mas também artistas de rua, artistas de periferia, haverá espaço para todos se apresentarem. E junto a essas apresentações, debateremos a conjuntura brasileira onde todos podem e devem opinar", disse.
Para Neves, o processo de impeachment traz muitas interrogações sobre o futuro do país. "Acabar com os órgãos voltados para a cultura, para os direitos humanos, para a defesa da mulher é um golpe na democracia. O golpe não é contra a Dilma, é contra o Brasil".
O Ministério da Cultura foi procurado pela Agência Brasil, mas ainda não se pronunciou.
Outros atos
A ocupação da Funarte é a segunda em um edifício pertencente ao poder público federal localizado na capital mineira. Desde quinta-feira, estudantes estão acampados na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Eles também criticam o processo que afastou Dilma Rousseff. Ontem pela tarde, os estudantes integraram um ato na Praça da Liberdade que reuniu milhares de pessoas contra o impeachment. Uma grande faixa com o slogan "Fora Temer" foi afixada no coreto.
Hoje, um outro ato reuniu moradores em situação de rua para um café popular em frente à Secretaria Municipal de Assistência Social. Segundo um dos organizadores, Tarcísio da Costa Morais, a manifestação já estava marcada há algum tempo e se voltava para criticar políticas públicas desenvolvidas pela prefeitura de Belo Horizonte, mas tomou outra dimensão com o afastamento de Dilma Rousseff.
"O prefeito Márcio Lacerda divulga que a prefeitura dá todas as condições para nós deixarmos as ruas. Mas não é verdade. Os albergues são precários e superlotados. Além disso, temos críticas aos restaurantes populares, que só funciona de segunda a sexta-feira. Somos muito mal atendidos, além da comida não ser agradável. E nosso estômago não tira férias sábado e domingo. Então estávamos nos mobilizando. Mas com o golpe, também precisamos dizer que não reconhecemos esse novo governo", diz Tarcísio.