Estado pede desculpas por negligência com ossadas da Vala de Perus

No Dia Internacional pelo Direito à Verdade sobre as Violações dos Direitos Humanos e pela Dignidade das Vítimas, o Estado brasileiro pediu desculpas formais à sociedade e aos familiares de mortos e desaparecidos políticos durante a ditadura, na Vala Clandestina de Perus, na cidade de São Paulo.
A cerimônia, que contou com a presença da ministra de Direitos Humanos, Macaé Evaristo, e de representantes da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos, foi realizada nesta segunda-feira (24), no Cemitério Dom Bosco, em Perus, região noroeste da capital paulista.
O pedido oficial de desculpas do Estado brasileiro se refere à negligência da União entre 1990 e 2014 na condução dos trabalhos de identificação dos restos mortais da Vala Clandestina de Perus.
Símbolo das graves violações aos direitos humanos perpetradas pelo Estado, a vala foi encontrada há quase 35 anos, em 4 de setembro de 1990, com 1.049 sacos com ossadas, todos sem identificações. No local, foram enterrados ilegalmente corpos de pessoas indigentes, de desconhecidos e daqueles considerados opositores ao regime de opressão iniciado em 1964. A área somente pôde ser aberta após o restabelecimento do regime democrático.
Ao ler o pedido de desculpas do Estado brasileiro, a ministra Macaé Evaristo destacou a importância de ações que honrem a memória, a verdade, a justiça e a reparação:
“É um momento muito triste, ao mesmo tempo, muito importante, porque a verdade é uma verdade que precisa ser revelada como justiça a todos os familiares, mas também para que a sociedade brasileira compreenda toda a violência que se cometeu em nome do Estado e para que a gente reafirme a democracia, nunca mais esqueça e para que nunca mais aconteça”.
Somente cinco ossadas já foram identificadas na Vala de Perus. Entre elas, a de Flávio Carvalho Molina, identificado em 2005. Ele foi preso, torturado e morto, em novembro de 1971, por agentes de Estado do DOI-CODI, órgão de repressão da polícia, em São Paulo. O irmão dele, Gilberto Molina, velou o irmão por mais de 40 anos, até poder enterrá-lo.
Gilberto dimensiona a dor e a luta dos familiares dos desaparecidos políticos no país:
“Se eu passei por esse velório, digamos assim, por mais de 40 anos, quase 50 anos, os familiares de hoje que ainda procuram, estão com esse velório mais extenso ainda. Eu faço votos que todos tenham perseverança, principalmente com essas ações que estão sendo tomadas agora. Que tenham perseverança na busca pela justiça”.
O ato desta segunda foi realizado a partir de acordo judicial entre a União e o Ministério Público Federal, em dezembro de 2024. O acordo estabeleceu a realização da cerimônia pública para ser lido o pedido de desculpas.
Os remanescentes ósseos foram descobertos no Cemitério Dom Bosco, em Perus — Zona Noroeste de São Paulo —, e inicialmente levados à Universidade Estadual de Campinas, a Unicamp, para, posteriormente, serem encaminhados para a Universidade Federal de Minas Gerais.
Após diversas denúncias relacionadas às condições precárias de armazenamento das ossadas, elas foram removidas e realocadas para o Instituto Médico Legal do Estado de São Paulo. Atualmente, os restos mortais estão no Centro de Antropologia e Arqueologia Forense da Universidade Federal de São Paulo, onde os trabalhos de identificação continuam.





