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Direitos Humanos

Para ex-PM, atuação da corporação é legítima

Helena Martins – Repórter da Agência Brasil
Publicado em 12/04/2014 - 09:55
Brasília

O fim do registro de homicídios como autos de resistência e a fixação de regras para a investigação de crimes que envolvem agentes do Estado encontram resistência. Ex-capitão das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) e vereador de São Paulo, Conte Lopes, discorda das críticas à atuação policial. “O policial que está fardado, de serviço, está agindo em legítima defesa, mas ninguém quer entender que, a priori, ele está agindo em legítima defesa. Você tem que proteger a pessoa de bem e se proteger, obviamente. Em um entrevero entre policiais e bandidos, tudo pode acontecer”, completa.

Questionado sobre o índice de jovens negros mortos pelas polícias, Conte diz que os policiais têm respondido a processos por anos e defende que todas as acusações devem ter prova, “sendo negro, branco ou japonês, tudo tem que ser julgado”. Lopes, que escreveu o livro Matar ou Morrer em resposta ao Rota 66, do jornalista Caco Barcellos, em que o atual vereador foi apontado como “um dos maiores matadores da Polícia Militar de São Paulo”, defende a fixação de leis mais duras contra pessoas que praticam crimes. Para ele, a falta desse tipo de regra geraria temor na população, além do fortalecimento do crime organizado. “No meu tempo, o povo tinha segurança. Hoje os bandidos tomaram conta, matam policiais e ninguém tem segurança. Nós estamos morrendo na frente da nossa família”, destaca.

A Agência Brasil também procurou entrevistar o comandante do Batalhão de Operações Especiais (Bope), do Rio de Janeiro, para comentar as propostas de alteração e os significados dessas mudanças na formação dos agentes da segurança pública. A assessoria de imprensa da Polícia Militar do Rio de Janeiro, contudo, informou que não havia porta-voz disponível para tratar do assunto. Temido pela atuação firme e, por vezes, truculenta, o Bope tem um grito de guerra em que diz: "O interrogatório é muito fácil de fazer; pega o favelado e dá porrada até doer. O interrogatório é muito fácil de acabar; pega o favelado e dá porrada até matar. Bandido favelado não se varre com vassoura; se varre com granada, com fuzil,  metralhadora”.

As mudanças no Código de Processo Penal são o objeto do Projeto de Lei (PL) 4.471/12, que fixa regras para a investigação de crimes que envolvem agentes do Estado, como policiais.

O procurador federal dos direitos do cidadão, Aurélio Rios, defende que o fim da violência policial é fundamental para garantir a segurança para toda a sociedade: “Nós vamos criando uma espiral de violência da qual não teremos mais de onde sair. Se queremos uma cultura de paz, temos que pacificar primeiramente a atuação da polícia e organizá-la dentro dos limites da lei, inclusive para protegermos os próprios policiais”. O procurador explica que, apesar de não ser estabelecido em lei, o auto de resistência começou como um procedimento informal e, aos poucos, foi introjetado em manuais das polícias, tornando-se prática comum. “Demostrou-se, com o passar do tempo, que essa prática escondia um modelo que privilegiava a impunidade de maus policiais que, sob a proteção do auto de resistência, praticavam assassinatos e, sobretudo, execução sumária”, destaca Rios.

Para reverter essa situação, em 2012 o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), ligado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, elaborou uma resolução que recomenda o fim do uso das expressões “auto de resistência” e “resistência seguida de morte”. “O registro do evento deve ser como de homicídio decorrente de intervenção policial e, no curso da investigação, deve-se verificar se houve ou não resistência que possa fundamentar excludente de antijuridicidade”, cita o texto, que diz que o corpo da vítima não poderá ser removido do local do episódio.

A resolução do CDDPH também pede a realização de perícias técnicas no local dos fatos e em todos os armamentos, veículos e maquinários, envolvidos em ação policial, além de outros mecanismos de investigação, como convocação de testemunhas, a realização de diligências e a instauração de processos administrativos. A norma fixa ainda que, até que os fatos sejam esclarecidos e apurados, os policiais envolvidos devem ser afastados e não participem de processo de promoção por merecimento ou por bravura, uma forma de desestimular práticas semelhantes.

Em janeiro do ano passado, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo seguiu os parâmetros da resolução do CDDPH e editou uma resolução determinando a mudança dos termos usados no registro da ocorrência, a fim de que os casos sejam realmente investigados. O texto também normatizou o atendimento às vítimas de confrontos com a polícia. De acordo com o documento, elas devem ser socorridas pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). Alguns dias após a edição do texto da resolução, a Polícia Civil do Rio de Janeiro também passou a adotar procedimentos semelhantes.

Para o procurador, outras medidas também podem ser tomadas para dar fim à sensação de impunidade, como valorizar o trabalho de investigação; garantir a independência dos peritos, para que tenham condições técnicas e políticas de fazer as análises; e não permitir que as investigações sejam submetidas ao mesmo comando dos policiais que atuam em ações de repressão nas ruas.

Aurélio Rios alerta, entretanto, que mudanças culturais devem ser combatidas a longo prazo. “Por mais violenta que seja a ação do chamado bandido, a polícia não está autorizada a agir como tal. Uma pessoa que foi pega roubando em flagrante tem que ser detida, investigada”, diz.

“Nós desejamos mais policiamento na rua, mais segurança, mas também mais respeito à lei e aos procedimentos policiais, sabendo que as pessoas, ainda que tenham cometido delitos, não estão desprovidas dos seus direitos, sobretudo do direito à vida”, completa.