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Direitos Humanos

Defensoria Pública reúne relatos de violações em comunidades do Rio

Akemi Nitahara – Repórter da Agência Brasil
Publicado em 30/08/2018 - 20:20
Rio de Janeiro

Em visitas às comunidades do Rio de Janeiro, representantes da Defensoria Pública da União (DPU) e da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPE-RJ) ouviram relatos de violações de direitos humanos, como invasão de domicílio, violência policial, devassa em celulares, revistas em mulheres feitas por homens e roubo de objetos pessoais por agentes públicos, chegando até a denúncias de suposta tortura em quartel.

As informações foram repassadas pelos defensores às representantes do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), que estão há dois dias na cidade para monitorar as ações relativas à intervenção federal e as investigações sobre as mortes da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e do motorista Anderson Gomes, em março.

Visitas

O defensor público federal Thales Arcoverde Treiger disse que houve 18 visitas apenas este ano para localizar vítimas que alegaram terem seus direitos fundamentais violados desde o início da intervenção federal. O foco da DPU e DPE-RJ é a atuação dos agentes públicos durante a intervenção federal e as operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).

“A gente tentar buscar as pautas referentes a eventuais ilegalidades cometidas na intervenção”, afirmou Treiger. Segundo ele, as equipes que observam "um padrão de violações" prestam assistência jurídica às pessoas e fazem recomendações.

A presidente do CNDH, Fabiana Severo, alertou que há queixas de excessos na abordagem, nas revistas e invasão de privacidade na verificação de mensagens de celular, sem mandado judicial. “Com uma prisão em flagrante, é possível a apreensão do celular, mas não [é possível se] verificar o conteúdo sem ordem judicial nem justificativa de que aquela pessoa seria suspeita.”

Segundo Fabiana Severo, foram recebidas denúncias de que teria ocorrido torturas em quartéis após a prisão de suspeitos.

Paradoxos

De acordo com o defensor público federal Thales Arcoverde Treiger, há uma sensação de medo nas comunidades. “Eu conversei com um garoto na Rocinha, que falou que, em um sábado, foi revistado cinco vezes. Então, às vezes, esse enorme aparato de segurança ostensiva acaba gerando uma insegurança nas pessoas.”

Fabiana Severo afirmou que há avaliações heterogêneas sobre os impactos da intervenção no Rio. “Se, por um lado, a visão apresentada pelo Ministério Público do estado e pela polícia foram posições, em linhas gerais, até de defesa da intervenção, de outro lado, com uma narrativa de casos concretos recebidos com as defensorias, acabam sendo relatados casos de abusos.”

Balanço da intervenção

Em apresentação ao presidente Michel Temer, o gabinete da intervenção informou que, desde fevereiro, 35 pessoas morreram em confrontos nas operações com participação das Forças Armadas, dos quais três militares do Exército. Foram apreendidas 152 armas, sendo 86 pistolas, 37 granadas e 29 fuzis e detidas 518 pessoas, dos quais 56 crianças e adolescentes. Cerca de 92 mil militares participaram das operações.

Já o Observatório da Intervenção Federal contabilizou 372 operações, que mobilizaram 172 mil agentes, para apreender 373 armas.

Segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP), foram registrados, de fevereiro a julho no estado do Rio de Janeiro, 2.617 homicídios, 736 pessoas mortas pela polícia e 99.571 roubos.

O Comando Conjunto da Intervenção informou que "todas as denúncias estão sendo apuradas pelos órgãos competentes" e que "se forem constatados desvios,  os envolvidos serão rigorosamente punidos".

Inquérito sobre Marielle

Nos dois últimos dias, os representantes do CNDH também acompanharam as investigações sobre as mortes da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e do motorista Anderson Gomes. A expectativa do grupo é que os resultados do inquérito sejam conhecidos ainda este ano. Há temor pela demora - que já dura cinco meses.

A presidente do CNDH, Fabiana Severo, disse que há preocupação com a falta de respostas. “Com as eleições, pode haver mudança de gestão, mudança na polícia e a resposta precisa ser dada. O ideal é que, [a resposta seja dada] antes das eleições, mas necessariamente antes do fim da gestão, porque, se muda a gestão, pode ir por água abaixo todo o trabalho já feito.”

Marielle Franco e Anderson Gomes foram assassinados a tiros, em 14 de março deste ano, após um evento político-cultural no centro do Rio. A vereadora, símbolo da militância em defesa dos direitos humanos e dos excluídos, era alvo, segundo investigações, de ameaças por sua atuação política.

Matéria alterada às 12h36 de hoje (31) para acréscimo de informação (resposta do Comando Conjunto da Intervenção)