Auditores pedem agilidade no julgamento de acusados pela Chacina de Unaí
A Chacina de Unaí, em que três auditores fiscais do Trabalho e um motorista foram mortos em uma emboscada na região rural deste município mineiro, completa hoje (28) dez anos. O dia 28 de janeiro foi instituído o Dia do Auditor Fiscal do Trabalho e Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo em homenagem ao motorista Ailton Pereira de Oliveira e aos auditores Eratóstenes de Almeida, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva, mortos quando investigavam denúncias de trabalho escravo no município, localizado no noroeste de Minas Gerais Em ato público em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF), o Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho (Sinait) lembrou a chacina e voltou a pedir agilidade no julgamento dos culpados.
“No primeiro ato em que encontrei com os colegas, um ano após o crime, eu nunca imaginaria que, depois de dez anos, ainda estaríamos reunidos com o mesmo objetivo, reivindicando o julgamento”, lamentou Marinês Lina de Laia, viúva de Eratóstenes.
Nove pessoas foram acusadas pelo crime. Os três primeiros réus foram julgados e condenados, em agosto do ano passado, pela Justiça Federal, em Belo Horizonte. Os demais acusados seriam julgados em setembro, mas uma liminar do STF suspendeu os trabalhos até que fosse julgado, na mesma Corte, o pedido de transferência do júri para Unaí. Em outubro de 2013, os ministros do STF começaram a analisar o pedido, mas a sessão foi interrompida com o pedido de vista do ministro Dias Toffoli e não há data prevista para retomada do julgamento.
“No ano passado, após o julgamento dos executores, começou a acender uma esperança de que a Justiça iria ser feita, e o julgamento foi cancelado. Outro banho de água fria na nossa esperança em relação à Justiça foi quando chegou a vez dos mandantes: eles ficaram impunes e vão continuar em liberdade”, disse Marinês.
Para Helba Soares da Silva, viúva de Nelson, o sentimento é de revolta. “Eles não podem ser julgados em Unaí. Se isso acontecer, é a mesma coisa que dar a sentença. Porque Antério Mânica, que é o mandante, foi prefeito eleito e reeleito de Unaí, vai se candidatar a deputado. Lá é a casa dele, então a Justiça deve ser feita em Belo Horizonte”. Segundo o Sinait, Mânica é um grande produtor de feijão, tem propriedades no Paraná e em Minas Gerais e era alvo frequente de fiscalizações do Ministério do Trabalho e Emprego. É acusado de ser o mandante do crime e de, antes da chacina, ter ameaçado de morte o auditor Nelson José da Silva.
Também participaram do ato público de hoje o ministro do Trabalho, Manoel Dias, e representantes da Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, do Movimento Humanos Direitos (Mhud) e da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
O ministro Manoel Dias lembrou que o combate ao trabalho escravo e infantil é prioridade do ministério, com resultados que, segundo ele, são reconhecidos pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). “Já temos mais de 500 nomes de pessoas envolvidas com trabalho escravo”. Dias ressaltou que, desde que os auditores intensificaram a atuação na área, aumentou o número de casos e também de pessoas que foram resgatadas de condições ilegais de trabalho. “Mais de 45 mil trabalhadores já foram retirados de situação análoga ao trabalho escravo no Brasil, mas a morosidade da Justiça resulta em impunidade. Procedemos as ações de descoberta, resgate e enviamos as informações. Cabe à justiça e ao Ministério Público tomar as medidas legais necessárias”, disse o ministro.
Estão em atividade atualmente no Brasil 2.782 auditores-fiscais, mas, para Sinait, que citou pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sobre o assunto, o ideal seriam 8 mil.
Em dez anos, pouca coisa mudou, disse a presidente do Sinait, Rosa Maria Campos Jorge. “Os auditores continuam trabalhando de forma insegura. Prova disso é que, recentemente, no Rio Grande do Sul, um auditor foi espancado por empregadores de uma obra do Programa Minha Casa, Minha Vida e outro foi ameaçado de morte por uma grande empreiteira.” Para ela, o ambiente de impunidade contribui para que essas ocorrências. “Se um praticou [crime] e não foi punido, os outros se sentem no direito de continuar praticando crimes e ameaças contra os servidores públicos, A Chacina de Unaí não foi um crime só contra pessoas, mas contra o Estado do Direito, [cometido] por pessoas que se acham acima da lei.”