Especial Semana de Arte Moderna de 22: antropofagia crítica africana
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Especial 100 anos da Semana de Arte Moderna de 1922
PARTE 4: Antropofagia crítica africana
“De um modo geral, quando tradicionalmente se pensa a constituição do modernismo no Brasil, se pensa muito a partir do impacto que as vanguardas artísticas europeias tiveram na produção brasileira”. Essa é a Vima Lia de Rossi Martin, professora de estudos comparados de literaturas de língua portuguesa na USP. Ela pesquisa a literatura africana.
Vima explica que “tem outro aspecto, outra dimensão, desta produção modernista que, de um modo geral é menos estudada e menos conhecida, que tem a ver com o impacto da produção modernista brasileira nas culturas, nas artes, nas literaturas africanas de língua portuguesa”.
Algumas obras dos modernistas brasileiros atravessaram o Atlântico e influenciaram escritores e intelectuais de Moçambique, Angola e Cabo Verde.
Um movimento que começa a partir de 1940 e chega ao auge na década de 1960. Esse é um período bastante conflituoso no continente. Que antecede as guerras de independência.
A professora Vima Lia de Rossi Martin conta que no momento de afirmação nacionalista desses países, em que as lutas armadas estavam se constituindo e muitos intelectuais estavam travando uma batalha no campo da cultura, literatura, tentando instituir uma literatura nacionalista, o Brasil foi uma fonte de inspiração enorme para aqueles intelectuais.
Escritores como Manuel Bandeira, Mário de Andrade e, depois, os regionalistas como José Lins do Rego e Jorge Amado, autores que falam dos problemas brasileiros numa linguagem brasileiro influenciaram também a busca pela autonomia literária desses países que construíam a autonomia política.
O poema, “Anti-evasão”, é de Ovídio Martins. Foi escrito em 1974, às vésperas da Independência de Cabo Verde.
“Pedirei
Suplicarei
Chorarei
Não vou para Pasárgada
Atirar-me-ei ao chão
e prenderei nas mãos convulsas
ervas e pedras de sangue
Não vou para Pasárgada
Gritarei
Berrarei
Matarei
Não vou para Pasárgada”.
A referência é o poema “Vou-me embora pra Pasárgada”, de Manual Bandeira, publicado em 1930.
Mas, a poesia caboverdiana inverte o sentido. No contexto de guerra, não dá para sonhar com Pasárgada.
Para Vima, a paródia à Bandeira é um exemplo de como a influência não é uma cópia e que dá para traçar um paralelo com a antropofagia proposta pelos modernistas é válida.
A professora conta que “a apropriação que os africanos fazem da literatura brasileira não é uma apropriação pacífica, é um gesto criativo, tem a ver sim com a deglutição, com a antropofagia. Então é uma literatura angolana, moçambicana, cabo-verdiana, são-tomense que se dá em diálogo com a literatura brasileira, mas um diálogo crítico. Não tem nada a ver com assimilação passiva”.
* Sonorização de José Maria Pardal, a declamação é de José Eluzane, jornalista e locutor da Rádio Comunitária de Guro, em Moçambique. a reportagem contou com a colaboração de Elaine Cruz, da Agência Brasil.
Especial 100 anos da Semana de Arte Moderna de 1922
PARTE 1: Refazendo o cenário: São Paulo e a Semana de 22
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18/06/2019
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