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Saúde

Indígenas de aldeia em Angra dos Reis são diagnosticados com covid-19

Há mais de 40 registros do novo coronavírus na comunidade
Cristina Indio do Brasil - Repórter da Agência Brasil
Publicado em 26/06/2020 - 13:46
Rio de Janeiro

O estado de saúde do cacique Domingos da Aldeia Sapukai, no bairro do Bracuí, em Angra dos Reis, costa verde do Rio, continua grave, mas hoje (26) apresentou melhoras. Já o indígena Idalino está com o quadro estável. Os dois estão internados em UTIs do Centro de Referência Covid-19, que funciona no Hospital da Santa Casa, no centro do município.

O cacique começou a apresentar os sintomas da covid-19 no dia 14 deste mês e no 9º dia fez o teste que confirmou a contaminação. Domingos começou a sentir falta de ar na terça-feira (23) e foi até a unidade de saúde localizada dentro da aldeia. Em princípio, por causa da sua cultura, o cacique resistiu às orientações dos profissionais, porque aguardava o término do ritual de pajelança. Depois de conversar com os especialistas, o indígena aceitou ser tratado.

Ainda hoje mais um indígena será levado para a unidade hospitalar. A médica cedida pela prefeitura a pedido dos indígenas, responsável pelo posto de atendimento de saúde da Aldeia, Carmen Vieira de Moraes, pediu a transferência do vice cacique Aldo Fernandes, que é diabético e mesmo assintomático precisa ter o estado de saúde avaliado no Centro de Referência. “Os pacientes com comorbidades estamos dando a prioridade de descer [para o centro onde fica o hospital] estão sendo monitorados, todos com testes positivos e hoje estou descendo mais um porque ele é diabético e a saturação está caindo”, contou em entrevista à Agência Brasil, a médica que trabalha com indígenas desde 1996.

Esses casos não são os únicos na Aldeia Sapukai. A doutora Carmen disse que mais há mais de 40 registros do novo coronavírus na comunidade indígena, que foram identificados com uma ação constante de busca ativa. Todos eles estão sendo acompanhados e monitorados pelo Departamento de Saúde Coletiva, por meio do Programa Especial de Saúde Indígena e Vigilância Epidemiológica do município.

Para a médica, é preocupante a situação da aldeia. Ao todo são 300 indígenas que moram em japiguás, termo indígena dado às unidades familiares, que concentram muitas pessoas. A aglomeração dificulta o trabalho de contenção da doença no local. “As unidades familiares aqui são muito grandes, temos japiguás e em cada existem, pelo menos, de 15 a 25 pessoas morando no mesmo local. Isso torna o isolamento muito difícil e daí as estratégias criadas pela equipe de Saúde. Toda síndrome gripal é notificada, Nós entramos com medicação para tentar uma profilaxia e todos os pacientes são monitorados e o teste é agendado como se preconiza”, relatou.

“Uma pessoa infectada que entrar em uma unidade familiar com 25 pessoas, se um for contaminado, passa para os outros e vai ter uma contaminação em massa. Só nos resta pedir para os outros não visitarem aquele japiguá. Já tivemos japiguás aqui em que as pessoas foram contaminadas, foram tratadas e hoje estão bem”.

Segundo a médica, como ocorre nas cidades país a fora, nem sempre as várias orientações dos profissionais de saúde, são seguidas. Os indígenas recebem máscaras, álcool em gel, produtos de higiene e limpeza, mas é uma dificuldade respeitarem o isolamento. “A única coisa que não conseguimos, mas isso não conseguimos nem no branco, o juruá, é convencer a todos, o que é uma coisa impossível, de não sair. Temos pacientes que são etilistas, são psiquiátricos, temos os jovens que estão rebeldes e cansados de ficar em casa. Então, eles descem vão para bares para jogar sinuca ou para beberem, ou trazem familiares para cá. Isso a gente não tem como tomar conta, apesar de todas as orientações”.

O atendimento na comunidade respeita as características culturais dos indígenas, que consideram o pajé, como médico oficial. Ainda que seja dada uma medicação para o paciente, a equipe médica não tem certeza se ela está sendo seguida e se quando a pessoa vai ao pajé se ele também está usando máscara. “Não pode dizer para ele não ir ao pajé agora e ir para a unidade de saúde. Não pode. Isso é da cultura deles, se não respeitar, a gente perde o paciente. Às vezes tem que conversar com o pajé, que a medicação do juruá vai cuidar da parte física e a dele da parte espiritual para fazer as duas coisas juntas e poder tratar”, observou.

Segundo a médica, o pajé Márcio não foi diagnosticado com a doença e passa bem. Ele tem sido monitorado pela equipe médica. “O pajé é uma autoridade médica dentro da cultura indígena”, completou, destacando que tem recebido apoio da Secretaria de Saúde, inclusive na comunicação, porque o sinal de telefone no local nem sempre é bom.