No Ceará, plano de pacificação quer acabar com a violência entre torcidas

Publicado em 12/02/2017 - 15:04 Por Edwirges Nogueira - Correspondente da Agência Brasil - Fortaleza

A partir deste mês, a Arena Castelão, em Fortaleza, passa a ter setores exclusivos para as torcidas organizadas. A medida faz parte do Plano Estadual de Pacificação e Regulamentação das Torcidas Organizadas, apresentado no fim de janeiro pelo Governo do Estado e por representantes de entidades do futebol cearense.

Cenas de violência e depredação não são raras no mundo do futebol e, em muitas das vezes, as ocorrências são associadas a participantes de torcidas organizadas. Tanto torcidas como times já foram diversas vezes punidos devido a brigas em dias de partidas. No ano passado, um jovem morreu durante um confronto antes de um “clássico-rei”, como é conhecida a partida entre Ceará e Fortaleza.

A divisão das torcidas nos setores exclusivos vem ocorrendo, de forma experimental, nas partidas do Campeonato Cearense. Esses setores não poderão ser ocupados por torcedores comuns. Em dias de clássico-rei, as torcidas organizadas do Ceará e do Fortaleza ocuparão os setores Norte (Ceará) e Sul (Fortaleza) do anel superior do Castelão.

Para representantes da Torcida Organizada Cearamor e da Torcida Uniformizada do Fortaleza (Leões da TUF), a setorização das torcidas é uma demanda antiga das entidades. Regis Alves, diretor da Cearamor, cita visita que torcidas organizadas fizeram a estádios da Alemanha em 2014 para conhecer o espaço reservado para os ultras (as torcidas organizadas de lá).

“A setorização é um meio de se ter um local específico para as torcidas organizadas poderem fazer as festas nas arquibancadas, já que um dos objetivos de uma torcida é levar seu time para conquistar vitórias e títulos.”

Uma das punições aplicadas por conta de casos de violência, foi proibir a festa das torcidas nas arquibancadas.  Em junho do ano passado, por exemplo, os torcedores foram impedidos de entrar nos estádios com camisetas e bandeiras indicando o nome das torcidas organizadas e com instrumentos de percussão.

Outro ponto do Plano de Pacificação é o cadastro dos torcedores, que vai começar a vigorar em maio. Alves afirma que a Cearamor já cadastra seus associados desde a década de 1990.

O presidente da Leões da TUF, João Paulo Melo, também destaca a setorização como uma forma de identificar pessoas que criem distúrbios. Ele explica que cada torcedor terá uma carteirinha e uma camiseta com uma numeração que poderá identificá-lo por meio das câmeras do estádio.

“A torcida está abraçando a ideia da setorização. Com isso, vamos separar o joio do trigo e só vão entrar as pessoas cadastradas.” A segurança dos torcedores também deverá ser aumentada com a implementação dos chamados “bolsões” de transporte coletivo, para onde as torcidas serão encaminhadas antes e depois das partidas. A ideia foi implementada na Arena Castelão na Copa de 2014.

Apesar de considerar o Plano de Pacificação interessante e válido, o diretor de estádios da Federação Cearense de Futebol (FCF), Josimar de Carvalho, acredita que seja necessário mais diálogo entre os segmentos envolvidos, sobretudo internamente, nas torcidas. “A questão não é somente o espaço físico, mas o torcedor. O debate com as torcidas precisa ser mais aprimorado, mas isso não invalida a ideia.”

O cientista social Raoni Oliveira Marques também acredita que uma das principais chaves para o combate à violência entre torcidas está no trabalho interno com os torcedores. Para ele, os conflitos existentes atualmente são externos ao contexto da torcida, mas se internalizaram entre os torcedores.

“Em Fortaleza, existem conflitos de territórios. A juventude expressa seus conflitos em bairros e praças, por exemplo, e isso não se resolve quando há a proibição de ir àquela praça. Os conflitos se transportam para outro lugar e a torcida é um desses lugares. Há um apego ideológico à tradição de que podemos levar os componentes a construir outra forma de torcer, mas que se perde por uma leitura errada do que resolveria o problema da violência, ” disse.

Marques defende que as torcidas organizadas produzam ações sociais junto aos componentes como forma de gerar autonomia entre eles. O Plano de Pacificação prevê o estímulo a esse tipo de ação. 

Segundo a Coordenadoria Especial de Políticas Públicas de Juventude, será encaminhada à Assembleia Legislativa uma proposição para regulamentar ações de projetos sociais nas torcidas organizadas.

Edição: Valéria Aguiar

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