Empresas de ônibus do RJ faziam “caixinha da propina” para pagar autoridades
Os empresários de transporte público do Rio de Janeiro investigados na Operação Ponto Final, deflagrada hoje (3) pela Polícia Federal, contribuíam para uma “caixinha da propina”, que era repassada a agentes públicos, entre eles o ex-governador Sérgio Cabral, a cada benefício recebido pelo setor do governo estadual, segundo o procurador da República no Rio de Janeiro José Augusto Vagos.
“O objetivo dos pagamentos era que eles obtivessem benefícios fiscais e tarifários no transporte. Precisamos descobrir que atos de ofício foram esses feitos pelo Sérgio Cabral que geraram esse pagamento de propina no período. Os pagamentos permaneceram mesmo após o término do segundo mandato do Cabral, até a prisão dele em novembro de 2016”, detalhou o procurador em entrevista para apresentar um balanço das ações de hoje.
A Operação Ponto Final é mais um desdobramento da Operação Lava Jato no Rio e rastreou o pagamento de propinas a políticos e agentes públicos que chegaram a R$260 milhões entre 2010 e 2016.
Até o começo da tarde, foram confirmadas sete prisões preventivas e três temporárias. Entre os presos estão o presidente da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor) e da Rio Ônibus (sindicato do município), Lélis Teixeira; e o ex-presidente do Departamento de Transportes Rodoviários do Rio (Detro), Rogério Onofre, preso em Florianópolis.
Segundo o Ministério Público Federal (MPF), os pagamentos seguiam o esquema de propina utilizado com as empreiteiras, revelado nas operações Calicute e Eficiência, e podem chegar a R$500 milhões, se incluídas outras pessoas que não são agentes públicos. Só para o ex-governador Sérgio Cabral, preso desde novembro, foram destinados R$122 milhões. Rogério Onofre, que tinha poder de decisão sobre o aumento da tarifa dos ônibus, teria recebido R$44 milhões.
O empresário Jacob Barata Filho foi preso ontem (2) na mesma operação, no Aeroporto Internacional Tom Jobim/Galeão, quando tentava embarcar para Portugal. Já o presidente do Sindicato das Empresas de Transportes Rodoviários do Estado do Rio de Janeiro (Seterj), Marcelo Traça Gonçalves, foi preso na Rodovia Presidente Dutra (BR-116), pela Polícia Rodoviária Federal.
De acordo com o delegado Antônio Beaubrun, há indícios de que Barata tentava fugir do país, pois seus familiares já estavam em Portugal e, quando foi preso, levava uma grande quantia de dinheiro em espécie. “Quando fizemos a prisão, ele estava com mais de R$50 mil reais em moeda estrangeira e tinha mandado a família para Portugal. Temos documentos de empresas dele em Portugal, mas não é oportuno divulgar quais são.”
Segundo o advogado de Barata Filho, o empresário faria uma viagem de rotina ao país europeu, onde tem negócios “há décadas e para onde faz viagens mensais”.
Ao todo, foram expedidos nove pedidos de prisão preventiva, três de prisão temporária e 30 mandados de busca e apreensão, autorizados pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro. São considerados foragidos Márcio Marques Pereira Miranda e José Carlos Reis Lavoura, conselheiro da Fetranspor e do Bilhete Único. Segundo o MPF, Lavoura é suspeito de receber R$ 40 milhões e está em Portugal, com volta prevista para o dia 8. A PF informou que vai acionar a Interpol para ajudar na busca pelos foragidos.
Delação premiada
A investigação decorre da colaboração premiada de Luiz Carlos Bezerra, operador financeiro de Sérgio Cabral, que confessou que recolhia propina na sede da empresa Flores em São João de Meriti, na Baixada Fluminense. A procuradora Marisa Ferrari explicou que o esquema utilizava empresas transportadoras de valores para repassar a propina em dinheiro vivo, das empresas de transporte diretamente para os envolvidos.
“Os pagamentos a Sérgio Cabral continuaram após a prisão de um desses operadoras financeiros e o Carlos Bezerra continuou a fazer a contabilidade nas empresas de transporte. Na empresa Flores teve registro de pagamento para Cabral até novembro de 2016. Agora foi descoberto outro agente público importante no esquema, que foi o Rogério Onofre, no Detro, que tinha uma atuação forte no transporte intermunicipal de passageiros, ele autorizava o aumento das tarifas de ônibus. Está em investigação um aumento de 7% dado acima da expectativa técnica, que indicava 2%”, destacou.
Para o procurador Eduardo El Hage, Cabral manteve influência política forte mesmo depois de ter concluído o mandato. “Quando tinha aumento na tarifa ou alguma isenção era aprovada, todos os envolvidos ganhavam seus prêmios. É um esquema muito antigo e muito maléfico para a população, porque prejudica os mais pobres, que precisam do transporte público.”
A Federação de Transporte de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor) informou que colabora com as autoridades policiais e está à disposição da Justiça para os esclarecimentos necessários.
RJ: Polícia Federal cumpre mandados da Operação Ponto Final